Na Terra Santa, por onde você anda vê flores. Desde 1908 foram plantadas mais de 230 milhões de mudas, o que fez de Israel um dos países que mais aumentou seu número de árvores na virada do século XX. As bougainvilleas surgem do chão, em touceiras, na beira da estrada, na subida do monte onde Cristo proclamou as bem-aventuranças, no parque onde se pega o bondinho para o Monte Tabor, perto do Mar Morto. Bougainvilleas que assombram turistas, pela intensidade das flores, o tamanho dos arbustos, o inesperado de onde brotam da terra.
Tudo em um país onde as características geológicas e climáticas da região tornavam impossível o cultivo da flora e da fauna. Os israelenses venceram os obstáculos criando a dessalinização e o gotejamento, descobrindo novas e exclusivas técnicas de recuperação do solo, fazendo com que a água do mar e das fontes naturais cheguem até onde ninguém imagina. E transformando sua localização geográfica na junção de três continentes em outra fonte de ajuda ao ambiente por causa dos 500 milhões de aves que cruzam seus céus duas vezes por ano, polinizando a flora.
O turista se encanta com os jardins e a exuberância das plantações e antes de seguir os passos de Cristo na terra santa de Israel, se extasia diante de um deserto florido e a fecundidade de seus trigais. Mas se falta água e a terra é muito árida, como explicar que irrigação é esta que permite à planta se nutrir oferecendo ao viajante um espetáculo de tamanha beleza?
Na viagem, quem chega cansado por tantas horas de voo, pensa em descansar, mas se dormir perderá algumas coisas que só podem acontecer ali, no outro lado do mundo, com todas as cores, os cheiros e os sabores nas frutas, verduras e legumes que parecem um segredo da natureza não fossem mais um milagre desta terra onde os milagres aconteceram.
O sistema é tão simples! Dos mananciais de água partem as mangueiras plásticas cheias de microfuros por onde a água goteja, dia e noite, irrigando toda a terra até onde a terra chegar. O viajante admira os jardins e vê ali escondidas as mangueiras, cada uma com determinada cor. Cidades construídas perto de mananciais, onde uma única gota faz a diferença. O importante é a constância, a persistência, a garra de cada gota de não desistir de gotejar.
É nesta terra do tamanho do estado de Sergipe que peregrinos do mundo inteiro passam dias e noites vendo e ouvindo as histórias sagradas narradas em Belém, Cafarnaum, Nazaré, Tiberíades, o mar da Galiléia, Jericó, Jerusalém. Embaixo, construções antigas que foram soterradas ou que o tempo apagou, enquanto as mangueiras mantêm vivas as cidades, florestas, vales e montanhas. O gotejamento torna o deserto florido.
Madre Tereza de Calcutá dizia que seu trabalho a favor dos pobres “era uma gota no oceano, mas se eu não tivesse colocado essa gota, o oceano estaria com uma gota a menos”. Nelson Freire começou a tocar piano aos seis anos e viveu até os 76 encantando plateias do mundo e ensaiando diariamente. Ou se lembrar do antigo ditado “Quem planta tâmaras, não colhe tâmaras”, diante dos 80, cem anos que demoravam a tamareira para produzir frutos, pois não importava colher, mas o que ia deixar.
Ainda bem que existem pessoas fora do grupo do que o sociólogo polonês Zygmunt Bauman chamava de “vida líquida” dos tempos modernos, que valoriza o efêmero e o descartável, sem bens permanentes, pois num piscar de olhos tudo é consumido no aqui e no agora: pizzas, remédios, livros de auto-ajuda.
E esquecemos de gotejar. De saber que 70 anos foram vividos tocando piano para se tornar o melhor pianista brasileiro do mundo. E que precisamos, quem sabe, de muitos anos para conseguir nossa cura interior, sarar as feridas que magoam, perdoar e ser perdoado, não deixar o mato tomar conta do nosso jardim, ligar e desligar, a alma finalmente vivendo na paz de Deus.
Assim como a mangueira de furinhos, precisamos só de uma gota para fazer florir o coração. Seja constante, confie na perseverança, acredite no seu empenho e desempenho. No aqui e agora, comece a cura interior. Estamos sendo convidados a gotejar.