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Medo de mudar

Mesmo quando sabemos que a mudança vai melhorar nossa existência, uma trava interna nos paralisa


25/03/2022 04:00


Sou casada há 8 anos e meu marido recebeu uma proposta para trabalhar fora de Minas Gerais. Entrei em grande sofrimento. Estamos em dúvida. Estou com muito medo. Ajude-nos."

Rosa, de Belo Horizonte

A maioria de nós vive numa espécie de sonambulismo. Aparentemente acordados, mas dormindo. Dormindo para a realidade, para as verdades da vida. Somos guiados por vozes exteriores que nos fazem acreditar em ilusões, em realidades falsas, em situações que não existem.
 
As sociedades nos hipnotizam para acreditarmos em segurança, estabilidade e permanência. Por mais que a experiência nos mostre o contrário, continuamos a nos apegar em coisas e pessoas, em lutar para manter tudo como está. Essa é a principal raiz do sofrimento humano. Querer permanência num mundo que se caracteriza pela mudança. Nada é definitivo. Nada está acabado. Toda a nossa vida, a começar pelo nosso corpo, nossas relações, nossos desejos, nosso trabalho, tudo está em constante transformação. Nós não temos alternativa. Ou cooperamos com o fluir natural das mudanças, ou sofremos por desejar um mundo que não existe.
 
Um americano, chamado Alvin Tofler, escreveu há 40 anos atrás um livro: “O choque do futuro”. Ele dizia que no futuro haveria uma onda de mudanças tão grandes, tão globais, tão rápidas que as pessoas ficariam chocadas. A leitora acima está chocada com a possibilidade de uma mudança, relativamente pequena se comparada com a convulsão transformadora pela qual passa o mundo. Além de a mudança fazer parte da natureza humana, ou seja, sempre existiu e sempre existirá.
 

Nossa época se caracteriza por fortes inovações em todas as áreas e em todos os lugares. A ansiedade com que vivemos as tensões e os sobressaltos que experimentamos, a insegurança generalizada mostram nossa incompetência adaptativa ao ritmo da vida atual. O apego ao passado e a visão medrosa do futuro são tentativas infrutíferas de controlar o fluxo natural dos acontecimentos. Estamos tão obcecados com obter segurança que nosso coração tem pouco espaço para o inesperado, ainda que esse imprevisto seja para melhorar nossa vida, como é o caso da leitora acima. É na imprevisibilidade e na mudança que estão nossas oportunidades de crescimento. A acomodação, que é o medo de avançar a depressão, o apego são movimentos contrários à dinâmica da vida. Por medo de correr um risco, corremos um maior: morrer por estagnação, seja no campo emocional ou social. Um navio ancorado no cais por muito tempo corre mais risco de enferrujar o casco e apodrecer do que um em alto-mar. De várias formas, porém, resistimos aos convites de mudança. A principal delas é a angústia quando diante de alguma oportunidade.
Vivemos com a ilusão de que nossas relações, nosso trabalho, nossa moradia fossem externos. Daí nossa dificuldade para o crescimento, para decisões transformadoras. Mesmo quando sabemos que a mudança vai melhorar nossa existência, uma trava interna, o medo, nos paralisa. É o medo do desconhecido. E sempre encontramos desculpas para nossa paralisia:
 
– “E se não der certo?" Nossa experiência, se levada em conta, e a experiência de outras pessoas podem nos orientar em nossas escolhas. No fundo, sabemos muito bem quando a oportunidade é boa ou quando estamos sendo aventureiros. E, ainda, para fazer uma mudança na vida, queremos ter 100% de certeza; na verdade, não queremos mudar, queremos ter certeza, o que nunca ocorrerá. 
– "E se não der certo?” Mude outra vez.
– “E se eu me arrepender?” Perdoe-se.
As mudanças são inevitáveis, independentemente de as querermos ou não. Haverá alguém que não vai envelhecer, adoecer ou morrer? É óbvio que quando estamos abertos a mudanças podemos escolher as que nos interessam, quais mudanças são boas ou não. Ao contrário, se optarmos pelo apego e conservação, todo convite para sairmos de nossas “áreas de conforto” será visto como ameaçador. 
Certa vez, uma pessoa me perguntou se eu achava que ela estava no caminho certo. Devolvi-lhe a pergunta: 
– “Você está dando algum passo adiante?” E ao me responder que sim, eu disse:
– “Então, está no caminho certo.”

 
O caminho certo é andar. Se estiver errado, andando você acerta. Parado, nunca chegará. Parado, você está errado. A mesmice vital é causa das depressões. A vida está para o movimento assim como a morte está para a inércia. Quando não respondemos mais às solicitações das mudanças, estamos morrendo emocionalmente. Durante muito tempo, fiquei intrigado com uma frase no Novo Testamento dita por S. Paulo: “Time Iesum transeuntem”. Traduzido do latim: “Temei a Jesus que passa”. Eu me perguntava: por que temer a Jesus que está passando?. Mais tarde, descobri. Não é ter medo de Jesus, mas ter medo do fato de ele estar passando. Se não aproveitamos sua passagem, ele pode não voltar. 
O jovem que queira seguir Jesus largou a oportunidade de sua passagem e pediu um tempo para enterrar o seu pai. Outra frase enigmática foi a resposta do mestre: “Os mortos que cuidem dos seus próprios mortos”. A graça acontece agora, na beleza, nos relacionamentos, nas coisas, na profissão, no amor. Mas tudo em constante movimento. A vida é um jato passando.

* Última coluna de Antônio Roberto, que seria publicada no domingo (27/3), no caderno Bem Viver

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