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Estado de Minas BRASIL S/A

Brasil sofre impacto da falta de foco institucional

País precisa reaver fatia do PIB global que tinha em 2010, último ano do Lula 2. O gap é de US$ 1,4 tri


23/04/2023 04:00
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Gilmar Mendes, ministro do STF
Gilmar Mendes mudou o voto e agora concorda com a tese de que a queda do Imposto Sindical é inconstitucional (foto: Minervino Junior/CB/D.A Press - 27/2/20)

O governo, o Congresso, o Judiciário, à frente o STF, todos querem se mostrar aplicados em melhorar a economia, o bem-estar das pessoas, a qualidade das decisões, mas não passa semana nos últimos anos sem que Brasília nos mergulhe em confusões e polêmicas. Como diz um amigo, as instituições estão funcionando, só que funcionam mal, encadeando instabilidade política, insegurança jurídica e raquitismo econômico.

As últimas notícias são de amargar. Uma confirma a máxima segundo a qual até o passado no Brasil é incerto. Deu-se com a reviravolta do voto do ministro Gilmar Mendes, do STF, sobre o imposto sindical, que caiu com a reforma trabalhista em 2017. Em 2018, o STF declarou como constitucional o fim do imposto obrigatório no curso de 20 ações que tinham Gilmar como relator. Um sindicato recorreu com embargos de declaração. Nesta ação, o ministro Luís Roberto Barroso pediu vista e apresentou no último dia 14 seu voto concordando com a tese. E... E o ministro Gilmar o acompanhou, mudando sua decisão de 2018.

Barroso diz em seu voto que o cenário mudou e a reforma trabalhista “promoveu uma importante alteração na forma de custeio das atividades dos sindicatos”. O julgamento continua, ameaçando a jurisprudência trabalhista consolidada. Não cabe alegar inconstitucionalidade, até onde se entende, porque o cenário mudou. Seria esquisito o STF formar maioria para engrossar a já caudalosa insegurança jurídica.

Noutro evento, este político, o governo se viu obrigado a aceitar a abertura de CPMI no Congresso proposta pela oposição para averiguar as responsabilidades pelo vandalismo da extrema-direita nas invasões de prédios oficiais em 8 de janeiro. Com as provas abundantes feitas pelos próprios delinquentes com seus celulares, certo é que, se tiver competência, o governo poderá complicar a situação dos parlamentares que incentivaram os golpistas e de parte da oficialidade do Exército.

O ônus para todos é que a CPMI vai embaçar a tramitação de medidas essenciais para revigorar a economia e reduzir a dependência dos mais pobres das políticas sociais, como a já tardia reforma tributária. O que fazer: esperar passivamente ou oferecer ao Congresso e ao governo ajuda para desatar os nós? Um grupo de líderes empresariais de vários setores entende que o caminho é ajudar a política, numa dinâmica com potencial para superar a polarização ideológica e ideias de antanho.


Resistência à inovação

Para alguns, falta compreensão sobre as transformações que acontecem em ritmo intenso no mundo, e que se arrastam no Brasil como carro com motor 1.0 subindo uma ladeira íngreme – ou híbrido, que é a forma de ganhar tempo de indústria sem bala ou sem know-how para abraçar o que suas matrizes já adotaram, a propulsão com bateria elétrica. De algum jeito, nossa história é marcada por uma tenaz resistência à inovação.

Acumulamos décadas de política macroeconômica destinada a pôr canga nas contas fiscais, visando a uma inflação moderada e a uma taxa de juro decente, que entronizariam expectativas promissoras, confiança e progresso.

O resultado tem sido o contrário, levando não à revisão do método, mas aos governantes a dobrar a aposta, pauperizando o setor privado, sobretudo a manufatura. Até os anos 1970, ela era mais sofisticada e maior que a da China. E assim seguimos, encolhendo, pois as pessoas passam e as ideias ficam, perseguindo ajustes ficais por pressão de ideologia em desuso no mundo para cercear a autonomia da política.

Nesse embate entre a tecnocracia que se vê infalível e a democracia eleitoral, em que o voto demite o político e o fracasso não sanciona o tecnocrata com emprego estável, além da porta giratória aberta à elite deles, o espancado é a sociedade, seja por tomar partido desconhecendo o que está por trás, seja por ser prejudicada na veia.

Vamos aos fatos. Na lista dos BRICS, Brasil tem economia estagnada desde 2000, quando representava 1,9% do PIB global, contra 3,5% da China, 1,4% da Índia, 0,8% da Rússia e 0,4% da África do Sul, segundo dados do World Economic Outlook de abril do FMI. Em 2023, voltamos ao ponto em que partimos, com 1,97% do PIB mundial, a China voou para 18,4%, Índia foi a 3,5%, Rússia a 2% (graças ao petróleo e gás) e a África do Sul continuou com os mesmos 0,4%. O que inferir?


Mais emprego que Bolsa?

A dedução é que o acrônimo BRICS deve sua fama de grupo dinâmico no mundo só à China, com Índia atrás. Ambos explicam a fatia do PIB do bloco em relação ao PIB mundial ter saltado de 11% em 2006, quando a ideia do clube de emergentes promissores foi criada, para 26,3%.

Hoje, forte candidata a potência econômica é a Indonésia, democracia que fracassou duas vezes com política industrial e voltou a adotá-la, fazendo uso de tecnologia da informação e de suas reservas de níquel, insumo estratégico às novas energias, barganhando facilidades tarifárias por fábricas de baterias e veículos elétricos. Indústrias da China, EUA, Coreia do Sul e Japão toparam ou estão negociando.

Em 2010, último ano do Lula 2, nosso Produto Interno Bruto representava 3,3% do PIB do mundo. Se os erros de estratégia do governo Dilma fossem corrigidos e não repudiados, é possível que este ano voltássemos à fração perdida. O gap é de US$ 1,4 trilhão. Convertidos em obras, tecnologia aplicada e manufatura moderna, e adicionados à competitividade dos minérios e do agro, é provável que hoje o Bolsa Família fosse menos demandado. E a vigilância fiscal seria limitada ao bom uso do dinheiro público.

Sem escolhas binárias

Fundamental para a economia superar os impasses políticos e Lula ter sua redenção é se livrar da escolha binária entre o laissez-faire e o planejamento, como defende a singapuriana radicada nos EUA Yuen Yuen Ang, chefa do departamento de Economia Política da Universidade Johns Hopkins e autora de “Como a China escapou da armadilha da Pobreza”.

Ela sugere aos EUA o que começou timidamente com Trump e segue mais desinibido com Joe Biden: um “jogo de soma positiva” entre os setores público e privado, com o que chama de “descentralização coordenada” e “improvisação dirigida”. A China se transformou com tais conceitos, e não bem com direção central férrea, como supõe a crítica neoliberal.

O fato é que ou enfrentamos a realidade de que estamos tempo demais insistindo com políticas de estabilização econômica indiferentes às suas sequelas para o emprego e a manufatura avançada ou as crises vão ampliar-se em frequência e intensidade, já que não será só o agro que vai criar empregos e renda capazes de atender as demandas sociais.

Falta ao país um projeto de longo prazo sintonizado com as mudanças globais sem volta, como as energias renováveis, os veículos elétricos puros, processos, produtos e serviços conectados por semicondutores e operados por softwares inteligentes. Mas não faltam gente preparada e iniciativas embrionárias, como o sistema de pagamentos instantâneos do Banco Central, o Pix, que é mais que uma facilidade financeira. É, se devidamente considerado, a plataforma para a economia conectada e inteligente, estendida aos bancos de dados interativos de CPF e CNPJ, o que viabiliza até um sistema tributário sem margem para sonegação.

A formulação da economia digital é o que nos concilia com o futuro no presente e nos dá o ingresso na geopolítica em geral para além da justa prioridade ambiental. Sem uma PPP da política com a sociedade, visando parcerias de criatividade e inovação, isso não vai acontecer.

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