
Marcadores do tempo em Belo Horizonte precisam acertar os ponteiros. Parados, atrasados ou até quebrados, os equipamentos que deveriam mostrar a hora certa nas torres de importantes prédios no Centro da capital deixam a população sem sintonia com o passar de segundos, minutos e horas. O edifício-sede da prefeitura, na Avenida Afonso Pena, é um dos exemplos clássicos do problema. Um dos quatro relógios do prédio marca, em qualquer momento do dia, 1h15. Na Catedral Nossa Senhora da Boa Viagem, na Igreja de São José e no Centro Cultural de Belo Horizonte também falta a informação preciosa para todos aqueles que circulam apressados no habitual corre-corre do Centro.
“A hora errada nos confunde. Olhar para o relógio é quase um vício quando estamos indo para a faculdade, aguardando um ônibus ou à espera de uma pessoa. Se o marcador está parado ou atrasado, ficamos um pouco perdidos”, queixa-se a estudante de enfermagem Camila Moreira, de 22 anos. Diante do aparelho estragado da torre da prefeitura, ela e a amiga Juliet Rocha, de 22, recorrem ao relógio do telefone celular ou ao de pulso para não atrasar os compromissos. “Não dá para confiar nos equipamentos de rua. Sempre confiro a hora certa num dos meus relógios”, diz Juliet.

No Centro Cultural de Belo Horizonte, na esquina da Avenida Augusto de Lima com a Rua da Bahia, os dois relógios do alto da torre também têm problemas. Um deles ainda está no horário de verão. O segundo, completamente parado, marcando 12h55. O defeito nos equipamentos chama a atenção de quem contempla o prédio neogótico, construído em 1914. “O brasileiro já tem o péssimo hábito de se atrasar nos compromissos e os relógios das ruas da cidade atrapalham ainda mais. Eu mesma tenho dificuldade em ser pontual, mas sempre coloco a culpa nesse trânsito caótico de BH”, diz a relações-públicas Amanda Dalsecco, de 28.

A Fundação Municipal de Cultura, responsável pelo Centro Cultural de Belo Horizonte, foi procurada pelo Estado de Minas por duas vezes para comentar a situação, mas não retornou as ligações.
"Não tenho paciência para atrasos"
Glória Tupinambás e Tiago Padilha
O tique-taque dos 300 relógios pendurados na parede ou expostos na vitrine dita o ritmo de vida do comerciante Adélcio Andrade, de 58 anos. Pontual por mania e convicção, o dono de uma das mais tradicionais relojoarias de Belo Horizonte, na Galeria Ouvidor, no Centro, diz-se “metódico com o tempo”. “Não tenho paciência para atrasos. Se tiver que esperar um cliente, um amigo ou um funcionário, eu fico bravo. Dez minutos de tolerância é o máximo que eu admito, senão vou embora”, conta, bem-humorado.
Acostumado a andar em sintonia com os ponteiros, Adélcio coleciona histórias de raivas e frustrações com os típicos atrasos dos brasileiros. “Serviço público é o verdadeiro calvário. Acho que foi criado para matar as pessoas de raiva, pois nada está pronto dentro do prazo combinado ou no horário prometido”, diz. Até com os amigos, ele é rígido. “Sempre que combino um encontro com os colegas, exijo pontualidade. Muitas vezes as pessoas relaxam com o tempo só porque o compromisso é com a diversão, mas eu não gosto de demoras e desculpas.”
Pontualidade também é uma lei na vida da aposentada Tereza Medeiros Reis, de 62 anos. Habituada a se adiantar para os compromissos, ela se diz cansada com os “chás de cadeira” que costuma tomar. Um dos mais demorados ela tomou na última sexta-feira, na fila para tirar passaporte na sede da Polícia Federal, no Centro de BH. Com horário marcado para as 13h30, ela chegou ao local com mais de duas horas de antecedência, ainda antes das 11h30.
O economista percebeu que não adiantava reclamar: os amigos continuavam aparecendo depois do horário combinado. Então, aceitou a sorte de ser sempre o primeiro a chegar. Mas continua achando desrespeitoso até a tradicional demora da noiva em cerimônia de casamento. “As pessoas se atrasam porque sabem que ela vai se atrasar, é engraçado isso.”
