
O estudo mostra que mais de 53 mil pessoas são assassinadas por ano no Brasil e as vítimas preferenciais são jovens em sua maioria homens, pardos, com 4 a 7 anos de estudo. Os números deixam claro: além das tragédias pessoais e familiares que as mortes precoces representam, a vitimização dos jovens constitui um grave problema econômico. Os cálculos levam em conta a expectativa do ciclo de vida, a probabilidade de sobrevivência, além do potencial de renda e de consumo.
Se fosse possível dizimar a violência existente no Brasil, a atual geração de jovens (todos os que estão vivos, independentemente da idade) iria pagar nada menos do que R$ 2,21 trilhões por isso. Levando em conta as gerações futuras, o custo do bem-estar seria de R$ 2,63 trilhões para a sociedade brasileira, o que representa 51,5% do PIB. “Esse é o valor que a geração corrente e as futuras estariam dispostas a pagar pelo fim da violência. O montante leva em conta as pessoas que estão vivas e as que se apropriariam desse ganho no futuro, com base em previsões do IBGE”, diz Daniel Cerqueira, diretor de Estado e instituições do Ipea.
Alexandre Oliveira é instrutor de panificação em projeto de inclusão produtiva do Fica Vivo, programa de redução de homicídios, em Nova Contagem, na Grande BH. Na região marcada pela violência, ele ensina jovens de 16 a 24 anos a arte de transformar a farinha em pães, bolos, biscoitos e doces. Há seis anos na função ele diz que a ocupação dos jovens em atividades que vão do esporte a oficinas de formação profissional tem reduzido o estigma da região entre os empregadores: “Antes os jovens daqui tinham dificuldades de conseguir trabalho, porque as empresas tinham receio de contratá-los, o que não ocorre agora. Sem emprego, eles acabavam envolvidos pelo tráfico, ciclo que está sendo rompido”.
Educação Por trás da estatística fúnebre que revela a repercussão da violência na economia está a baixa qualidade da educação no país e o envolvimento com drogas, que impedem que essa parcela da população aproveite as boas oportunidades de trabalho, dando um passo para mudar de vida. “A educação de boa qualidade, desde a primeira infância, é muito importante, não só para criar capacidade, como sociabilidade”, aponta Cerqueira. Sem isso, segundo ele, com escolaridade deficiente os jovens têm dificuldades de encontrar um lugar ao sol no mercado de trabalho, o que os empurra para a violência.
Danielle Ferreira, 16 anos, mora em Nova Contagem. No segundo ano do ensino médio ela gosta de estudar, diz que convive com a violência em sua vizinhança, mas nunca se deixou envolver. A fórmula para o seu sucesso está na combinação escola e trabalho. De manhã ela cursa o segundo ano do ensino médio e à tarde frequenta o projeto de inclusão produtiva, onde já aprendeu a fazer com rapidez receitas variadas, do pão francês a massas recheadas. “Quero conseguir um trabalho, fazer o Enem e entrar para o curso de medicina”, planeja.
Assim como ela, Willian Braga, 17, fugiu das estatísticas ruins. Ele, que já perdeu um amigo vítima do tráfico, diz que o trabalho protege os jovens porque a ocupação evita que o adolescente fique “à toa na rua podendo até mesmo receber propostas ruins”. “Meu plano é conseguir um emprego, mas logo, logo pretendo trabalhar em minha própria padaria, junto com meu pai. Queremos abrir um negócio aqui no bairro, onde vamos fabricar pão com muita qualidade”, planeja.
Prioridade Segundo Marcelo Neri, ministro-chefe interino da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) e presidente do Ipea, numa lista de 16 prioridades elencadas pelos jovens brasileiros num trabalho de campo realizado pelo instituto em maio, o principal desejo é acesso a educação de qualidade (85,2%). A proteção contra o crime e a violência aparece em quinto lugar da agenda, com 49% das preferências.
Escola e trabalho são a saída
A baixa escolaridade funciona como uma barreira para o mercado de trabalho e faz parte do intricado ciclo que reduz as oportunidades empurrando os jovens muitas vezes para situações de risco e violência. Mário Rodarte, economista e professor do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar), vinculado à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), explica que no ano passado a taxa de desocupação na faixa da população entre 18 e 24 anos que já devia ter concluído o ensino fundamental, mas ainda não conseguiu, foi de 14,7%. Enquanto isso, entre aqueles que completaram o ensino fundamental ou fizeram pelo menos parte do ensino médio, ela foi de 13,7% e, entre os com ensino médio completo e superior incompleto, caiu para 9,9%. Os números são da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED).
Escola e trabalho, na opinião de Wallison dos Santos, é o caminho para melhorar a qualidade de vida das famílias brasileiras e reduzir a violência. “Eu sou prova disso”, garante. Segundo o jovem que aos 22 anos já tem quatro anos de carteira assinada no Shopping Uai, no Centro de Belo Horizonte, onde trabalha em uma loja esportiva, o emprego ocupa a cabeça, ajuda os mais novos a ganhar experiência e traz novas oportunidades, desviando-os da criminalidade.
“Comecei a trabalhar aos 12 anos, fazendo pequenos bicos em um sacolão. Sempre trabalhei e isso só me fez bem, nunca me envolvi com a violência. Acho que a partir dos 15 anos todos deveriam estar livres para trabalhar em um emprego compatível com a idade, da mesma forma que podem ir a festas e ter filhos”, opina. Bem articulado, Wallison diz que pretende terminar o ensino médio no ano que vem, mas não tem planos para a faculdade: “Tenho visto muita gente investir no ensino superior e depois não conseguir trabalho na área”, avalia.
Desemprego “Existe uma faixa da população que sempre permanece num patamar menor de escolaridade. Essa é uma característica estrutural do desemprego no país, mesmo levando em conta o aumento da escolaridade no Brasil”, explica Rodarte.
De acordo com ele, a taxa de desemprego entre os jovens é muito alta por falta de qualificação e porque a experiência dos mais velhos facilita encontrar e disputar um lugar no mercado de trabalho. “É esse contingente que pressiona o mercado de trabalho. Em 2012, segundo a PED, a desocupação entre os jovens de 18 a 24 anos foi de 11,2%, ante 4,4% na população de 25 a 39 anos e 2,4% entre os de 40 anos ou mais.” (ZF e MC)
