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Estado de Minas

Consumo mudou e supermercados avançaram nos 18 anos de Real


postado em 06/07/2012 06:00 / atualizado em 06/07/2012 07:32

Era uma loucura… Antes do Plano Real, os brasileiros tinham que receber o salário e correr para o supermercado. Muitas vezes não era possível esperar um dia sequer. O parco recurso era queimado pelas fortes chamas da inflação, que faziam o dinheiro derreter e valer menos da noite para o dia. “As máquinas remarcadoras eram um pesadelo”, lembra a professora aposentada Maria das Graças de Castro, de 68 anos, moradora de Belo Horizonte. “Era um período muito difícil. Muitas vezes a gente ia comprando e tinha que acelerar porque a maquininha já estava pregando novas etiquetas, aumentando os preços”, reforça. Na quinta reportagem da série Maioridade do real, que o Estado de Minas publica desde domingo, Maria das Graças lembra que em alguns momentos, no início dos anos 1990, o valor de uma lata de tomate podia dobrar em 24 horas. “Era um absurdo. Não dava nem para pensar. Tinha que comprar rápido.”

Professora aposentada, Maria das Graças de Castro diz que era difícil conviver com reajustes de preços e comemora criação do real(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A/Press)
Professora aposentada, Maria das Graças de Castro diz que era difícil conviver com reajustes de preços e comemora criação do real (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A/Press)

Esse era o modelo de supermercado existente na véspera de 1º de julho de 1994, quando o Plano Real deixou sua fase de transição para trás – que envolveu a criação da Unidade Real de Valor (URV) em fevereiro de 1994 – e se transformou em realidade. A partir daí surgiu uma nova era para o varejo de autosserviço, bem diferente do praticado nos anos anteriores. As lojas de antes do real eram como a toca do dragão que ditava os aumentos de preços: menos arejadas, mais escuras, simples e com um quinto dos produtos existentes nos supermercados atuais. Importados eram raridades. E a palavra conveniência não fazia parte do vocabulário das redes.

Foram muitas as mudanças nesses 18 anos, garante o presidente da Associação Mineira de Supermercados (Amis), José Nogueira Soares Nunes, de 75. Como um dos fundadores do EPA em Belo Horizonte, junto com os irmãos e sócios ele viveu a montanha-russa dos planos econômicos anteriores, primeiro atrás do balcão, quando ainda tinham apenas pequenas mercearias de bairro, batizadas de Armazém Popular, e depois entre as gôndolas dos supermercados da Empresa Popular de Abastecimento (EPA), que teve sua primeira loja bem-sucedida aberta na Rua Curitiba, no Centro da capital mineira, em 1967.

“No governo Sarney, na década de 1980, foi uma lástima. Tinha tabelamento, sumia produto. Havia o câmbio negro. Era difícil encontrar de carne a feijão. Não dava para vender”, lembra José Nogueira. Naquela época “triste”, o supermercado ficou como o vilão. “O governo transferiu para os empresários o ônus do tabelamento e todo mundo achava que a culpa dos problemas era do supermercado”, recorda. Depois veio a escalada da inflação cada vez mais forte: “E éramos os remarcadores, os ladrões”. Nogueira diz que a situação era complicada e que as redes tinham que se contorcer para também comprar adequadamente e vender rapidamente, sem perdas. “Se não tomasse cuidado, o dinheiro que ganhava em um dia não dava para fazer o estoque de novo no outro. Por isso, o profissional do departamento financeiro era mais importante até que o comprador. Era preciso ficar de olho no overnight.”

Vez do cliente O consumidor, como o bancário aposentado Manoel de Souza Pinto, de 73, de Varginha, era um dos que sofriam com a loucura da hiperinflação. “Recebia o salário, saía daqui e percorria 300 quilômetros com Caravan e carretinha para comprar em Belo Horizonte. Tinha que fazer o maior estoque que desse porque os preços das mercadorias subiam, e muito, todo dia. Se não comprasse hoje, amanhã não dava para levar o mesmo produto”, conta. “A inflação era exorbitante”, reforça. Nessa época, hipermercados, como o Carrefour, e atacados, como o Makro, eram alguns dos locais preferidos para as compras mensais dos consumidores da capital e do interior.

“O real veio para corrigir tudo isso. Hoje os supermercados são outros, tanto que alguns que não acreditaram nas mudanças não trabalharam adequadamente e acabaram fechando”, observa José Nogueira. Agora, o consumidor tem estabilidade de preços, consegue comparar, optar pelo menor preço e exigir: quer mix amplo, conforto, proximidade e tecnologia a seu favor.

O consultor especializado em supermercados e indústria de alimentos Gustavo Vanucci, de 41, garante que o real alterou toda uma cadeia de valor. A fumaça, que levava o foco do negócio para a área financeira, foi extinta. O lema agora é atender o cliente da melhor forma possível para que ele não ceda aos encantos dos concorrentes. “Hoje eu faço minhas compras semanalmente, vou aos supermercados perto de casa, tenho muitas opções e sei das ofertas. Posso até boicotar e trocar a carne de boi pelo frango, se o preço estiver muito alto”, afirma Graça de Castro. Para ela, o real foi “um avanço enorme, bom para o consumidor brasileiro”.

Tem de tudo um pouco


Os supermercados brasileiros dos dias atuais não deixam nada a dever para os concorrentes do exterior. Contam com um mix de produtos dos mais variados, que buscam atender todas as necessidades da clientela, são bem iluminados, têm os leitores de códigos de barras, oferecem conforto e conveniência. A trajetória do grupo Verdemar, com sete lojas na Grande BH, pode servir como exemplo da evolução das redes supermercadistas do país. Em 1993, nascia a primeira unidade, com 180 metros quadrados e três funcionários, no Bairro São Pedro. Segundo o fundador, Alexandre Poni, a transformação dos últimos 18 anos “foi geral”. Além da estabilidade econômica, ele aponta a globalização e abertura do mercado aos importados como outras grandes alavancas desse tipo de negócio. “Depois disso, tudo mudou: o consumo, as preferências por produtos, o poder aquisitivo, o conhecimento de gastronomia, as exigências”, observa. “E o supermercado teve de se adaptar”, reforça.

O Verdemar se especializou em um nicho voltado para as classes A e B, e depois do Plano Real passou a oferecer novidades nas áreas que os mineiros queriam explorar. “Fiz uma oferta de filé de salmão congelado em 1994 e as pessoas não conheciam. Acharam lindo, mas não sabiam como preparar. Busquei receitas e coloquei ao lado do freezer. Hoje o peixe já faz parte do cardápio do cotidiano das pessoas”, diz Poni. Com essa evolução, ele diz que aumentou a complexidade do negócio supermercado. O nível de serviços é maior, assim como as dificuldades. “Tudo foi aprimorado, do setor de compras ao RH. O formato é outro.”

E Poni lembra que não é mais possível parar no tempo. A clientela é exigente, quer novidades a todo momento, que devem ser bem escolhidas porque, afinal, “gôndolas não têm elástico”. Nas lojas ainda deve ter opções para divertir o consumidor, como pizzarias ou restaurantes. E a comodidade não deve nunca ser deixada de lado. “As pessoas querem levar a comida pronta, a fruta picada… Hoje o supermercado produz, beneficia, tem um trabalho muito maior.” O resultado de uma gestão eficiente e com o novo foco no que o cliente quer reflete na expansão dos negócios. Hoje, o Verdemar tem 2,8 mil funcionários e seu faturamento é de R$ 332,8 milhões, segundo o ranking da Associação Brasileira de Supermercados (Abras).

José Nogueira, da Amis, reforça que hoje o que vale é a mercadoria bem comprada, adequada à necessidade dos consumidores das lojas. Isso serve tanto para as lojas voltadas para as classes A e B quanto para as que atendem aos clientes das classes D e E. “Tem que ter pesquisa, pessoal treinado para atender bem, tecnologia, como a da etiqueta eletrônica.” E para o consultor Gustavo Vanucci, o que está por vir é o aumento da parceria com a indústria, com as empresas locando e administrando os espaços destinados aos seus produtos dentro das lojas. (GR)

Moeda para os políticos
Fernando Henrique Cardoso se elegeu presidente e sucedeu Itamar Franco na esteira do sucesso do plano de estabilização da economia(foto: ANDRE BRANT/CB/D.A PRESS %u2013 13/10/94)
Fernando Henrique Cardoso se elegeu presidente e sucedeu Itamar Franco na esteira do sucesso do plano de estabilização da economia (foto: ANDRE BRANT/CB/D.A PRESS %u2013 13/10/94)

Brasília –
Recém-saído do trauma de um impeachment presidencial –  Fernando Collor de Melo foi afastado do poder definitivamente em dezembro de 1992 –  e mergulhado em uma hiperinflação que beirava os 90% ao mês, o Barsil, com a criação do Plano Real, em 1994, conquistou a estabilidade para planejar a longo prazo. “O país passou a ter algo que não tinha antes, uma moeda”, resumiu o deputado federal Roberto Freire (PPS-PE). Freire era líder do governo Itamar Franco na Câmara dos Deputados, no período em que o real foi gestado. “Antes, quando uma moeda caía no chão, ninguém corria atrás dela para pegar, porque ela não valia nada. A corrida era para chegar ao supermercado antes das maquininhas de reajuste. Hoje é diferente”, recorda ele.


O impacto foi tão grande, na opinião de Freire, que a maioria esmagadora dos governadores eleitos em 1994 evitaram demonizar o plano. O único que não o defendeu abertamente foi Miguel Arraes (PSB), eleito governador de Pernambuco. “Até mesmos os petistas nos apoiaram, como Jorge Viana (Acre), Cristovam Buarque (Distrito Federal) e Victor Buaiz (Espírito Santo). No plano nacional, o PT de Lula fez oposição o tempo inteiro. Na outra ponta, o ex-ministro Fernando Henrique Cardoso (PSDB) era o principal nome associado à defesa do real.

“Mas, em 1993, FHC tinha dúvidas se conseguiria ser reeleito senador. O plano era sair para deputado federal. O Plano Real tornou-o presidente eleito em 1994 e reeleito em 1998”, lembrou o hoje presidente nacional do PPS, Roberto Freire. O secretário-geral do PSB, Carlos Siqueira, defende Arraes, afirmando que ele não fez oposição por oposição ao Plano Real. E sim apontava os pontos que considerava falhos no plano e que foram sendo aperfeiçoados com o passar dos anos, sobretudo durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Ele disse que a própria oposição inicial do PT derivava de algumas discordâncias pontuais.

Mesmo reconhecendo a importância de FHC no processo, o secretário-geral do PSB defendeu que o grande mentor do processo de estabilização foi, de fato, o ex-presidente Itamar Franco. “Qualquer um que Itamar escolhesse como candidato seria eleito em 1994. O grande cabo eleitoral de Fernando Henrique foi o Plano Real”, completou. Fernando Henrique Cardoso era ministro de Relações Exteriores quando o então ministro da Fazenda, Eliseu Rezende, caiu do cargo.
Em uma reunião de emergência no Palácio do Planalto, Itamar ouviu de Freire a sugestão para convidar FHC para o cargo. “Mas ele está em Nova York, ele adora essas coisas de relações exteriores. Será que ele aceita?”, indagou o então presidente. Aceitou. 

 


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