Studio Ghibli: entenda os riscos da 'trend' do ChatGPT
A febre resultou em um milhão de novos usuários em apenas uma hora e tem levantado questionamentos sérios sobre a privacidade e o uso de dados pessoais
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Siga noNos últimos dias, uma "trend" que viralizou nas redes sociais tem causado um grande alvoroço: as pessoas estão transformando suas fotos em ilustrações no estilo do Studio Ghibli - conhecido por obras como "A viagem de Chihiro" e "O menino e a garça" -, por meio de ferramentas de Inteligência Artificial, como o ChatGPT, que recentemente integrou a capacidade de gerar imagens em seu sistema.
A febre resultou em um milhão de novos usuários em apenas uma hora e tem levantado questionamentos sérios sobre a privacidade e o uso de dados pessoais.
Preocupações com a privacidade
Segundo Vanderlei Garcia Jr., sócio do VGJr Advogados e especialista em Propriedade Intelectual e Inteligência Artificial, o uso desses serviços de IA pode envolver sérios riscos em termos de privacidade. "Ao enviar fotos pessoais, o usuário pode estar cedendo, muitas vezes sem perceber, direitos sobre o uso da imagem e compartilhando dados íntimos, seus ou de terceiros, sem qualquer autorização", explica.
Apesar de algumas plataformas afirmarem que não armazenam ou utilizam as imagens geradas, os termos de uso frequentemente permitem que elas atuem em fins amplos, incluindo o treinamento de algoritmos e a inclusão em bancos de dados de reconhecimento facial.

Para Alexander Coelho, sócio do Godke Advogados e especialista em Direito Digital e Proteção de Dados, a assimetria de informações é alarmante. "Quantos usuários realmente leem os termos de uso e entendem o que estão entregando? Estão cedendo algo único, seus traços e expressões, para uma máquina", diz.
O advogado também lembra que, ao colocar dados sensíveis - como fotos, por exemplo - nessas plataformas, existe um risco de vazamento ou utilização indevida, especialmente em sistemas situados em países com legislações mais permissivas. "Na internet, se você não está pagando, é porque o produto é você", reforça.
“Com relação ao possível vazamento de dados, o que ocorre é que você troca a sua imagem (que é um dado sensível) por uma coisa fugaz, que é uma "trend", apenas para fazer parte de algo momentâneo: a partir do momento que você cede gratuitamente a sua imagem, você não sabe para o que ela será usada e se será guardada de forma segura”, continua. "Além disso, há hackers que criam novas forma de ataques e vírus e esses bancos de dados se tornam alvos fáceis".
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Em um cenário onde as tecnologias estão se desenvolvendo rapidamente, mas a legislação ainda engatinha para lidar com os novos desafios que surgem, especialistas defendem a necessidade urgente de um equilíbrio entre a proteção dos dados pessoais e a promoção da inovação tecnológica.
Como se prevenir?
Os especialistas alertam que é importante não se expor na internet de forma excessiva, mantendo a cautela e utilizando o bom senso. "As pessoas não podem ceder suas imagens gratuitamente por conta de uma 'trend', que é uma moda passageira", comenta Coelho.
De acordo com o advogado, para se proteger é importante estar atento aos termos de uso, manter uma postura cautelosa nas redes sociais e reforçar a segurança de suas contas pessoais, com práticas como autenticação de dois fatores.
"Uma maneira de se prevenir no caso de um vazamento de dados é manter uma dupla verificação nas redes sociais e nas contas bancárias, atualizando também os sistemas operacionais e além disso, ter o bom senso com relação à mensagens, porque após a violação, podem chegar mensagens a vítimas com links suspeitos", explica.
"Não clique em links ou baixe qualquer tipo de arquivo suspeito, principalmente se vier de contatos desconhecidos", completa.
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O Dilema Ético: Inovação vs. Tradição
Além das preocupações com a violação de informações, a crescente utilização da IA para imitar o estilo de artistas renomados, como Hayao Miyazaki, fundador do Studio Ghibli, traz à tona uma questão ética complexa.
Miyazaki, um dos maiores nomes da animação mundial, já expressou seu repúdio pela utilização da IA em processos criativos, o que levanta o debate sobre até que ponto a replicação de sua arte é aceitável, mesmo quando "legal".
Coelho aponta que, mesmo que não haja ilegalidade, imitar o estilo de um artista pode ser visto como uma violação do espírito da criação artística. "O debate sobre IA não é apenas jurídico, mas também cultural", afirma.
A possibilidade de replicar a arte de um artista com um clique coloca em xeque a originalidade e a individualidade dos criadores. A grande questão é: "O que nos torna únicos, se algo pode ser reproduzido de forma algorítmica com tamanha perfeição?".
“Hoje em dia o artista precisa blindar a sua arte para que ela não seja pulverizada nas plataformas de Inteligência Artificial generativa. Nesse sentido, a necessidade principal é refletir como poderemos cuidar e proteger a individualidade e originalidade humana”, alerta.
"Estamos celebrando sua arte ou sendo profanos com um clique? A IA está criando uma guerra silenciosa entre inovação e tradição, com os artistas resistindo à utilização das máquinas como ferramenta de reprodução", afirma Coelho. Ele alerta para o risco de se perder a autenticidade da criação humana diante da perfeição algorítmica da IA.
*Estagiária sob supervisão do subeditor Gabriel Felice