
Clozapina é mais eficaz que outros antipsicóticos para tratar esquizofrenia
Com base em análise de dados de 16 anos, pesquisa revelou que medicamento reduz o risco de morte entre pacientes refratários atendidos pelo SUS
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Siga noO envelhecimento traz desafios para a saúde pública, uma vez que afeta a população de maneiras distintas. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 14% dos idosos têm algum diagnóstico de doença mental. Para entender a relação entre o risco de morte e os antipsicóticos atípicos nas pessoas adultas e idosas com esquizofrenia, o médico geriatra e psiquiatra Júlio César Menezes Vieira se debruçou sobre o assunto durante seu doutorado no Programa de Pós-graduação em Medicamentos e Assistência Farmacêutica da Faculdade de Farmácia da UFMG.
A pesquisa, que culminou na tese Efetividade da clozapina nas diferentes fases da vida: análise de sobrevida de adultos idosos com esquizofrenia assistidos pelos Sistema Único de Saúde, em um corte de 16 anos, mostrou que a clozapina é um medicamento com menor risco de morte no tratamento de pacientes refratários se comparado a outros antipsicóticos atípicos distribuídos pelo SUS, como a risperidona, a olanzapina, quetiapina e ziprasidona. A descoberta feita pelo pesquisador é importante para a prática clínica, especialmente quando se considera o envelhecimento das pessoas com esquizofrenia.
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A clozapina
O tratamento da esquizofrenia é feito por meio de antipsicóticos. Há dois grupos de medicamentos usados contra a doença: os típicos, ou de primeira geração, e os atípicos, também conhecidos como de segunda geração. Os de primeira geração estão disponíveis na atenção primária do SUS, porém apresentam maior risco de sintomas colaterais motores. Já os de segunda geração tendem a causar menos efeitos colaterais motores e são mais caros. Mas eles também estão disponíveis pelo SUS, no Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF), que é o departamento de alto custo do sistema.
A clozapina é um antipsicótico de segunda geração e primeira indicação na esquizofrenia refratária, ou seja, aquela que acomete os pacientes que não responderam bem a outros antipsicóticos previamente prescritos. Os principais efeitos colaterais da clozapina são sedação excessiva, hipotensão ortostática – queda excessiva da pressão arterial –, constipação intestinal e síndrome metabólica. A agranulocitose é o efeito colateral mais temido e ocorre quando os neutrófilos – células de defesa do sangue – caem de forma drástica. Entretanto, o acompanhamento e a monitorização hematológica em todos os pacientes em uso de clozapina diminuem esse risco.
Assim, é obrigatório o acompanhamento hematológico rígido, com hemogramas e acompanhamento médico regular para quem utiliza o medicamento, o que torna o tratamento mais difícil e caro para o sistema de saúde.
Em sua análise, Júlio César reuniu dados do período de 2000 a 2016 agregados em bancos de dados dos sistemas ambulatorial, hospitalar e de mortalidade do SUS. Inicialmente, o pesquisador analisou adultos com o diagnóstico de esquizofrenia acima de 18 anos, contabilizando 350 mil pessoas diagnosticadas no país. Em seguida, observou 83 mil pessoas idosas com esquizofrenia e que recebem os antipsicóticos atípicos pelo SUS.
“Para avaliar a efetividade da clozapina, usei o critério de desfecho dependente, que é a mortalidade. Eu quis entender, ao longo dos 16 anos considerados, se havia alguma diferença entre a mortalidade em pessoas que usam clozapina e as que usam outros medicamentos. A nossa análise dos bancos de dados mostrou que houve diferença de mortalidade. Quem usou clozapina teve menos risco de morte em relação a quem usou outros antipsicóticos, tanto nos adultos mais jovens quanto nos idosos”, explica.
A pesquisa levou em conta a sobrevida dos pacientes, ou seja, quantos pacientes com esquizofrenia sobreviveram durante 16 anos. O estudo constatou que os idosos com esquizofrenia que fizeram uso de antipsicóticos atípicos diferentes da clozapina apresentaram um risco de morte 54% maior quando comparados aos que usaram o medicamento. Já nos pacientes adultos não idosos, o risco de morte foi de 21%.
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“Uma vez que 30% dos pacientes com esquizofrenia são refratários, o estudo incentiva os médicos a prescreverem a clozapina como uma boa alternativa para esses pacientes, já que ela é mais efetiva nesses casos. No nosso estudo, apenas 4,5% dos adultos com esquizofrenia usaram a clozapina. No caso dos idosos, o uso foi de 2,5% em pacientes de 60 a 69 anos, de 1,2% entre doentes de 70 a 79 e de apenas 0,4% para pacientes acima dos 80 anos”, diz o pesquisador.
Doença de jovens
Júlio César explica que a esquizofrenia é uma doença de jovens, pois quase 70% das pessoas com esquizofrenia recebem o diagnóstico no fim da adolescência e início da vida adulta. Entre 30% e 40% dos pacientes são diagnosticados após os 40 anos.
Ela é de base poligênica, cujo desenvolvimento é influenciado por fatores externos que interagem com predisposições cerebrais. O uso de substâncias psicoativas, como a cannabis, infecções durante o pré-natal e até mesmo a urbanização são alguns dos fatores externos e ambientais que podem desencadear a esquizofrenia.
“Trata-se de uma psicose, a pessoa tem delírios e alucinações. A esquizofrenia é uma doença que faz a pessoa viver à parte, ela tem a sua própria vivência, uma realidade própria que não consegue compartilhar com os outros”, explica.
A cada surto, o cérebro do indivíduo sofre um processo neurodegenerativo que gera ensimesmamento e isolamento do paciente ao longo prazo. “O paciente com esquizofrenia acredita em algo incontestável e têm alucinações, escuta pessoas e vozes que validam o que ele acredita. Ele pode acreditar que está sendo perseguido ou que é especial. É uma doença que, se não tratada corretamente, compromete a qualidade de vida. Logo, é importante a realização de mais estudos para entendermos melhor as alternativas medicamentosas para os casos de esquizofrenia no país”, reforça o pesquisador.
A pesquisa teve financiamento e apoio do Centro Colaborador do SUS - Avaliação de Tecnologias & Excelência em Saúde da UFMG (CCATES/UFMG).
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