Quase 20% dos municípios de Minas não conseguirão fechar as contas
Pesquisa da CNM revela que, embora maioria dos prefeitos preveja equilíbrio financeiro em 2025, cenário é de aperto nas contas
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Quase 20% dos municípios mineiros ouvidos pela Confederação Nacional de Municípios (CNM) não conseguirão fechar as contas de 2025. O dado faz parte da pesquisa “O 13º salário e o encerramento de exercício nos municípios”, que ouviu 701 dos 853 gestores de cidades de Minas Gerais. O levantamento da CNM revela que, apesar de a maioria dos prefeitos prever o encerramento do ano no azul, a percepção geral é de crise financeira, escassez de recursos e pressão sobre o caixa municipal.
Segundo a pesquisa, realizada entre 14 de outubro e 5 de dezembro, 17,4% dos municípios mineiros, o equivalente a 122 cidades, afirmaram que não conseguirão equilibrar as contas no fim deste ano. Outros 36 gestores não responderam à pergunta. Por outro lado, 77% dos entrevistados, ou 543 municípios, estimam fechar o ano sem déficit.
Mesmo com essa maioria otimista, o percentual de cidades em dificuldade em Minas Gerais supera ligeiramente a média nacional, que é de 16,7%, o que corresponde a 696 municípios brasileiros. No país, das 4.172 prefeituras pesquisadas, 78,9% afirmaram ter capacidade de encerrar o ano com as contas equilibradas, enquanto 4,4% não responderam.
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O primeiro ano da gestão é tradicionalmente marcado como um período de ajuste de contas. É quando os novos gestores assumem as administrações municipais e precisam lidar com heranças fiscais do mandato anterior. Um dos pontos mais significativos do levantamento diz respeito aos chamados restos a pagar a descoberto. Em Minas Gerais, 64% dos municípios (446) afirmaram que não deixarão esse tipo de passivo, que corresponde a despesas empenhadas, mas não quitadas até o encerramento do exercício financeiro.
A gestão fiscal de final de exercício no estado, no entanto, revela sinais de pressão sobre as contas municipais que se estenderão ao próximo ano. Isso porque 30,3% dos municípios mineiros (213) declararam que deixarão restos a pagar sem cobertura de caixa, ou seja, despesas empenhadas sem fonte de recurso garantida para 2026. A prática compromete o fluxo financeiro do próximo ano e limita a capacidade de execução do orçamento já aprovado.
O cenário preocupa a Confederação Nacional de Municípios. Para o presidente da entidade, Paulo Ziulkoski, a tendência é de agravamento nos próximos exercícios, diante do avanço de propostas com elevado impacto fiscal sobre os municípios. “Projetos em fase final de tramitação podem gerar prejuízos superiores a R$ 100 bilhões”, alertou em entrevista ao Estado de Minas.
Ele atribui parte do desequilíbrio fiscal às decisões tomadas em Brasília, sem a “devida consideração sobre a sustentabilidade financeira dos entes locais”. “As chamadas pautas-bomba do Congresso Nacional são o exemplo mais evidente. Medidas como o enfraquecimento de regras previdenciárias para determinadas carreiras, a criação de novos pisos salariais e a redução da jornada de trabalho ampliam significativamente a pressão sobre a folha de pagamento municipal”, afirmou.
Ziulkoski também destacou que a prática de deixar restos a pagar sem cobertura de caixa pode resultar em alertas ou ressalvas por parte do Tribunal de Contas do Estado (TCE), além de obrigar o município a elaborar um Plano de Recomposição da Situação Fiscal no exercício seguinte. O presidente da CNM lembrou ainda que, em 2022, foi aprovada a Emenda Constitucional 128, que veda a criação de novas atribuições para estados e municípios sem a indicação da respectiva fonte de custeio.
Outro indicador relevante do aperto nas finanças municipais é o atraso no pagamento de fornecedores. Em Minas Gerais, 28% das prefeituras relataram atraso, percentual ligeiramente inferior à média nacional, que é de 28,8%. O dado revela dificuldades na gestão de caixa e na liquidação de obrigações de curto prazo em cerca de um terço dos municípios brasileiros, afetando diretamente a cadeia de prestadores de serviços e fornecedores locais.
Os resultados mostram ainda que, mesmo entre os gestores que projetam fechar o ano no positivo, a sensação predominante é de aperto fiscal. Em Minas Gerais, 561 municípios, o equivalente a 80% dos respondentes, afirmaram ter enfrentado crise financeira e falta de recursos, apontadas como o principal desafio deste primeiro ano de gestão.
Cenário que espelha a realidade nacional. Entre os gestores municipais de todo o país, 80,2% identificaram a crise financeira como o maior obstáculo do exercício, enquanto 67,5% mencionaram a instabilidade política e econômica. Outros desafios incluem a gestão da saúde, citada por 63,4% dos prefeitos, e os reajustes salariais concedidos após a pandemia, apontados por 62,2% dos respondentes.
Apesar das dificuldades, a pesquisa também traz sinais de algum alívio para as prefeituras, especialmente no que diz respeito ao pagamento do 13º salário dos servidores. A vasta maioria dos gestores municipais mineiros (96%) afirmou que o recurso extra proveniente do adicional de 1% do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) ajudará no pagamento da gratificação natalina.
Esse repasse adicional, celebrado como uma conquista da CNM, chegou ao seu 19º ano de vigência e foi criado justamente para reforçar o caixa das prefeituras em dezembro, mês tradicionalmente marcado por queda nos repasses regulares e aumento das despesas.
A pontualidade no pagamento dos salários também aparece como um ponto positivo. Em Minas Gerais, 99% dos municípios (691 cidades) informaram que o salário do funcionalismo está em dia. Para o mês de dezembro, 93% dos gestores disseram que a folha será paga dentro do prazo, embora 5% prevejam algum atraso.
O pagamento do 13º salário representa um impacto financeiro expressivo nas contas públicas. Em todo o país, o custo estimado é de R$ 33,59 bilhões, beneficiando mais de 8,3 milhões de servidores municipais. Em Minas Gerais, a pesquisa aponta que 52% dos municípios optaram pelo pagamento parcelado do 13º salário, enquanto 46% escolheram a parcela única. Entre aqueles que optaram pela parcela única ou pela primeira parcela, 48% já haviam efetuado o pagamento até a conclusão da pesquisa, e outros 48% planejavam pagar dentro do prazo legal. Apenas 2% admitiram a possibilidade de atraso.
Questionado sobre os desafios à frente, o presidente da CNM afirmou que os municípios enfrentarão importantes obstáculos em 2026. Segundo ele, a Confederação tem atuado para criar condições mais favoráveis à gestão fiscal local. Um dos principais avanços citados é a Emenda Constitucional 136/2025, encabeçada pela própria CNM, que altera regras de pagamento de precatórios e de parcelamento de dívidas previdenciárias de estados e municípios.
A norma institui limites baseados na Receita Corrente Líquida (RCL) e cria um parcelamento especial de até 300 meses para débitos previdenciários, com o objetivo de dar maior previsibilidade orçamentária aos entes federativos. “Espera-se que, com os novos parcelamentos previdenciários e o modelo aprimorado de pagamento de precatórios, a EC 136/2025 reduza significativamente as despesas públicas aplicadas no serviço da dívida municipal”, afirmou Ziulkoski em entrevista ao EM.
No cenário nacional, a pesquisa evidencia grandes disparidades regionais na capacidade de gestão fiscal. O Nordeste enfrenta a situação mais delicada, com 26% dos municípios declarando incapacidade de equilibrar as contas. No Norte, o índice é de 23%. O Centro-Oeste apresenta 13% de prefeituras em dificuldade, enquanto o Sul se destaca com o melhor desempenho do país, onde apenas 8% dos municípios não conseguirão fechar o ano no azul.
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No Sudeste, 16% das cidades enfrentam problemas financeiros. Dentro da região, Minas Gerais apresenta situação semelhante à do Rio de Janeiro, ambos com cerca de 17% de municípios em dificuldade. São Paulo registra índice um pouco menor, de 16%, enquanto o Espírito Santo se destaca positivamente, com apenas 8% das cidades incapazes de equilibrar as contas.