AMM propõe permitir que municípios rompam contratos com a Copasa
Associação defende "segurança jurídica" para prefeitos e alerta para riscos aos municípios pequenos. Proposta foi apresentada às vésperas da votação definitiva
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A Associação Mineira de Municípios (AMM) apresentou uma emenda ao Projeto de Lei 4.380/2025, que autoriza a privatização da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), com o objetivo de garantir aos municípios o direito de interromper seus contratos com a empresa caso a venda seja confirmada. A proposta foi debatida na manhã desta segunda-feira (15/12), durante audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
O projeto de lei que trata da privatização da Copasa está previsto para ser votado em definitivo na próximo quarta. Diante da proximidade da decisão, a AMM intensificou sua atuação no debate e levou formalmente a emenda ao presidente da ALMG, Tadeu Martins Leite (MDB).
Segundo o consultor jurídico da associação, Wederson Advincula Siqueira, a iniciativa busca oferecer “segurança jurídica” aos prefeitos, especialmente diante das incertezas sobre a continuidade dos contratos de programa firmados com a estatal.
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Durante a audiência, Siqueira explicou que a proposta parte do entendimento de que a privatização altera a natureza dos contratos atualmente em vigor. “Feita a privatização, tem que sentar com cada município para negociar a continuidade do contrato”, afirmou. Ele ressaltou que essa previsão já consta do artigo 14 da Lei do Marco Legal do Saneamento Básico.
Na avaliação da AMM, caso a Copasa deixe de ser uma empresa pública, os municípios deveriam ter o direito de encerrar, sem ônus, os contratos de programa firmados por dispensa de licitação. “O objetivo é permitir que as cidades interrompam seus contratos com a companhia em caso de aprovação da venda, garantindo a liberdade para assumir o serviço ou realizar nova licitação”, disse Siqueira.
Além da questão jurídica, a audiência foi marcada por preocupações sobre como se dará, na prática, a relação entre municípios e a empresa após a privatização, especialmente no que diz respeito aos recursos aplicados no saneamento básico e ao cumprimento das metas de universalização previstas no Marco Legal. Um dos pontos levantados pela AMM diz respeito ao chamado subsídio cruzado, princípio historicamente adotado pela Copasa, no qual os contratos mais lucrativos ajudam a compensar os deficitários.
De acordo com Siqueira, municípios de grande porte, como Belo Horizonte e Contagem, geram lucros elevados com as tarifas de água e esgoto, o que permite à companhia manter operações em cidades pequenas, distantes ou com baixa atratividade econômica. “O problema central é como ficará essa relação”, questionou o consultor jurídico da AMM em entrevista ao Estado de Minas.
Ele ponderou se um administrador privado teria a mesma preocupação em manter esse equilíbrio. Segundo ele, muitos municípios pequenos estão localizados em regiões desprivilegiadas, longe dos grandes centros, com redes de esgoto ultrapassadas ou até inexistentes.
“E nada se diz sobre isso”, alertou. Na avaliação da associação, há o risco de que a empresa compradora opte por elevar tarifas para tornar os contratos viáveis economicamente ou, em outra hipótese, simplesmente não demonstre interesse em assumir serviços considerados pouco lucrativos.
Nas últimas semanas, a AMM passou a atuar de forma mais incisiva no debate público sobre a privatização da Copasa. O presidente da associação e prefeito de Patos de Minas, no Triângulo Mineiro, Luís Eduardo Falcão Ferreira (sem partido), tem afirmado reiteradamente que os municípios não foram convidados a participar das discussões sobre a venda da companhia.
Durante evento realizado na última quinta-feira (11/12), ele criticou a condução do processo pelo governo estadual. “Nós não podemos aceitar que os municípios não sejam ouvidos”, disse.
Na ocasião, Falcão voltou a se posicionar contra a renovação antecipada dos contratos com a Copasa antes da conclusão da votação do projeto de lei. “Recomendo a todos os prefeitos que estão recebendo cartilha da Copasa para renovar contrato: não assinem”, afirmou.
Ele enfatizou que o saneamento básico é uma atribuição dos municípios, e não do Estado, e que o governo estadual estaria atropelando essa competência ao avançar com a privatização sem diálogo com as administrações locais.
“Os municípios não estão sendo ouvidos. E quem assina o contrato de saneamento é o prefeito ou a prefeita”, declarou. Para o presidente da AMM, nenhuma mudança estrutural no modelo de gestão da água pode ser imposta por uma lei estadual aprovada de forma acelerada. “Nenhum projeto pode avançar sem estar próximo das cidades mineiras e de quem as representa: prefeitos e vereadores. E o nosso dever é construir isso juntos”, disse, reiterando que qualquer alteração precisa passar pelo crivo das prefeituras.
Paralelamente ao debate legislativo, a AMM protocolou uma consulta formal ao Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG) em busca de orientação oficial sobre os efeitos da privatização da Copasa nos contratos atualmente vigentes. A consulta aborda temas como a autonomia municipal e os procedimentos necessários para eventual encerramento dos contratos após a mudança de controle da companhia.
Desde o fim de novembro, a própria Copasa vem notificando os municípios de que, em caso de privatização, os contratos poderão ser revisados e transformados em novos acordos de concessão, alinhados ao Marco Legal do Saneamento. A empresa sugere a unificação dos prazos contratuais e a celebração de novos contratos com vigência até 2073, sob o argumento de garantir o equilíbrio econômico-financeiro das operações.
O Projeto de Lei 4.380/2025 também define o destino dos recursos obtidos com a negociação de títulos da Copasa. A maior parte será direcionada ao financiamento de políticas públicas previstas no Programa de Pleno Pagamento das Dívidas dos Estados (Propag), que obriga a aplicação de um percentual entre 0,5% e 2% dos débitos estaduais em áreas como infraestrutura e ensino profissionalizante. O restante dos recursos deverá alimentar o Fundo Estadual de Saneamento, a ser criado com a aprovação do projeto.
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Além disso, o texto do PL estabelece cláusulas de tarifa social, a obrigatoriedade do cumprimento das metas de universalização do saneamento previstas no Marco Legal, estabilidade de 18 meses para os servidores da Copasa e a possibilidade de, após esse período, realocação dos trabalhadores em outras empresas públicas ou sociedades de economia mista controladas pelo Estado.