Entre o fanatismo e o vazio
Historiadores analisam Hitler como símbolo de seu tempo:sem profundidade, mas capaz de manipular massas
compartilhe
Siga no
Por Júlio Moreira
Por trás da figura autoritária de Adolf Hitler, existia um personagem mais complexo, marcado por vazio pessoal, culto à imagem e uma habilidade única de manipular massas. Dois dos maiores historiadores do século 20 — o britânico Ian Kershaw e o marxista Eric Hobsbawm — dedicaram parte de suas obras a entender quem foi, de fato, o homem que levou o mundo à beira do colapso.
Ian Kershaw, autor da biografia definitiva em dois volumes (Hitler: 1889–1936 e Hitler: 1936–1945), descreve Hitler como um líder “sem qualidades” no sentido tradicional. Segundo ele, o ditador não possuía grande profundidade intelectual, nem uma vida pessoal rica — era desprovido de amizades verdadeiras, cultivava hábitos rotineiros e era completamente absorvido por sua própria visão de mundo. “A única coisa que lhe interessava era o poder — e a missão de redimir a Alemanha”, escreve Kershaw.
Hobsbawm, em ‘A Era dos Extremos’, descreve Hitler como um produto do caos do século 20. Para ele, o ditador não teria chegado ao poder sem as condições históricas que o favoreceram: o colapso do Império Alemão, a humilhação do Tratado de Versalhes, a crise econômica e a ascensão do medo do comunismo. “Hitler não foi um monstro isolado, mas parte de uma época em que tudo estava em aberto, inclusive a barbárie”, afirma.
Kershaw também aponta que Hitler foi mais símbolo do que estrategista. Introduziu o conceito de que o Terceiro Reich funcionava baseado no princípio de que seus subordinados agiam “trabalhando em direção ao Führer” — ou seja, antecipavam o que acreditavam ser a sua vontade, sem ordens diretas. Essa lógica, segundo o historiador, permitiu que a máquina nazista operasse com brutal eficiência, mesmo sem um plano detalhado em papel para o Holocausto.
Para Hobsbawm, o impacto de Hitler não está apenas nos crimes que cometeu, mas no modo como sua figura moldou a política do século 20. “O nome de Hitler se tornou sinônimo do mal absoluto. Ele foi um divisor de águas moral, e seu legado é um alerta permanente”, escreveu.
Ambos os autores concordam que o culto à personalidade foi essencial para a permanência de Hitler no poder. Kershaw dedica parte de sua obra O Mito de Hitler a explicar como a imagem de um líder infalível e salvador foi construída — e como muitos alemães continuaram fiéis ao Führer mesmo diante de derrotas militares. Já Hobsbawm observa que o nazismo só se tornou possível porque Hitler soube canalizar os sentimentos mais profundos de ressentimento, medo e vingança de uma sociedade em ruínas.
Leia Mais
Mais do que um ditador, Hitler se transformou em símbolo de um tempo em que a razão foi esmagada pela ideologia e o poder se blindou no fanatismo. Seu biógrafo e o historiador alertam: não entender quem ele foi é correr o risco de repetir a história — sob novas formas, novos nomes, mas com os mesmos resultados trágicos.
Curiosidades sobre o ditador
Quase se chamou Schicklgruber: O pai de Hitler, Alois, nasceu com o sobrenome Schicklgruber e só adotou “Hitler” aos 40 anos – por pouco Adolf não teve um nome bem diferente .
Ficou sem pátria por 7 anos: De 1925 a 1932, Hitler foi oficialmente um apátrida. Ele renunciou à cidadania austríaca e só conseguiu a alemã em 1932, para poder disputar eleições na Alemanha .
Artista frustrado: Antes de entrar para a política, Hitler sonhava ser pintor. Tentou entrar na Academia de Belas Artes de Viena, mas foi reprovado duas vezes e passou anos vendendo aquarelas baratas para sobreviver .
“Pai” do Fusca: O Volkswagen Fusca tem dedo de Hitler. Em 1934 ele encomendou a Ferdinand Porsche o projeto do “carro do povo” e, segundo a lenda, chegou a esboçar o design arredondado clássico do Fusca .
Vegetariano e defensor dos animais: Hitler adotou uma dieta vegetariana rigorosa – planejava até proibir matadouros após a guerra – e adorava cães. Ele chocava convidados descrevendo abates de animais para desencorajá-los de comer carne.
Antifumo radical: Muito antes de campanhas modernas, a Alemanha Nazista lançou uma cruzada antitabagismo pioneira. Hitler detestava cigarro, e cientistas do seu regime nos anos 1930 ligaram o fumo ao câncer de pulmão, levando a medidas duras contra o tabaco .
Indicado ao Nobel da Paz: Acredite se quiser, em 1939 Hitler foi indicado ao Prêmio Nobel da Paz. A indicação (feita por um sueco de forma irônica) causou escândalo e foi rapidamente retirada . O constrangimento levou Hitler a banir qualquer alemão de aceitar Nobel no país.
Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia
O sobrinho inimigo: William Hitler, sobrinho de Adolf, serviu na Marinha dos EUA durante a Segunda Guerra, lutando contra o tio . Ele até escreveu um artigo intitulado “Por que Odeio Meu Tio” detalhando seu desprezo pelo Führer .
Um só testículo: Registros médicos de 1923 sugerem que Hitler tinha apenas um testículo. Ele sofria de criptorquidia, condição em que um dos testículos não desce para a bolsa escrotal – dando certo crédito à velha canção satírica britânica.
Assobiava Disney: Por incrível que pareça, Hitler era fã de desenhos animados. Frequentemente assobiava canções da Disney – como “Who’s Afraid of the Big Bad Wolf” e “When You Wish Upon a Star” – quando estava de bom humor, diante de amigos