TRANSFOBIA

Caso Alice: funcionários de pastelaria são indiciados por feminicídio

Apesar do indiciamento, nenhum dos suspeitos do espancamento da mulher trans foi preso até o momento. A motivação por transfobia foi confirmada por delegada

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A Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) concluiu o inquérito que apurou as circunstâncias da morte de Alice Martins Alves, de 32 anos. Os dois suspeitos de espancarem a mulher trans em 23 de outubro foram indiciados por feminicídio, pela discriminação de gênero. Apesar da conclusão do inquérito os homens, identificados como funcionários do Rei do Pastel, não foram presos.

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Alice foi perseguida e atacada por dois homens na madrugada de 23 de outubro. Durante o registro de ocorrência, em 5 de novembro, ela relatou que não conhecia os suspeitos e identificou um deles apenas como homem, branco, cabelos escuros, usando calça jeans e camisa preta. No entanto, em áudios divulgados à imprensa, uma pessoa afirma que os envolvidos trabalham no estabelecimento que a vítima estava horas antes.

Em um primeiro momento, a delegada Iara França, do Núcleo Especializado de Investigação de Feminicídios, da PCMG, afirmou que a vítima estava no local consumindo bebida alcoólica quando foi embora sem pagar. De acordo com a responsável pelo inquérito, o bar já tinha o costume de caso um cliente recorrente, por algum motivo, não quitasse a conta poderia fazê-lo em outro momento.

No entanto, a vítima teria sido perseguida e ameaçada pelos suspeitos. Uma câmera de segurança flagrou o momento que os homens a abordaram e questionaram sobre a quitação da suposta dívida. No áudio é possível confirmar que a mulher afirmou que havia efetuado o pagamento. Apesar disso, a resposta não foi bem vista pela dupla, que começou a agredi-la. O equipamento de segurança também captou gritos de socorro da vítima e insultos transfóbicos, por parte dos homens.

Espancamento por gorjeta de R$ 2,20

Além disso, ao longo do inquérito, a que o Estado de Minas teve acesso, um gerente do local informou que valores de contas não pagas por clientes não são debitados dos salários dos garçons. No entanto, o valor da gorjeta, cobrada automaticamente, de 10% da fatura não seria repassado ao profissional que atendeu à mesa. Por isso, a delegada indica que Alice foi espancada por R$ 2,20.

Apesar de ter acontecido em uma região movimentada de Belo Horizonte, nenhuma câmera de segurança flagrou o crime. O equipamento de uma empresa, no entanto, gravou o áudio do ataque. Na gravação é possível ouvir que a mulher afirmou ter efetuado o pagamento. Apesar disso, a resposta não foi bem vista pela dupla, que começou a agredi-la. O equipamento de segurança também captou gritos de socorro da vítima e insultos transfóbicos por parte dos homens.

Prisão preventiva

Na manhã desta quinta-feira a juíza Ana Carolina Rauen, do 1º Tribunal Sumariante do Tribunal de Júri de Belo Horizonte, indeferiu um recurso do Ministério Público estadual, enviado na última quarta-feira, que pedia a prisão preventiva. 

Em 13 de novembro, quatro dias depois da morte de Alice, a Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) enviou um pedido ao mesmo tribunal pela prisão preventiva dos suspeitos. No dia seguinte, o MPMG reforçou a importância da detenção e se manifestou favorável à medida liminar. O documento foi indeferido pela Justiça no último dia 26, mas o MPMG enviou um recurso sobre a decisão.

No documento que o Estado de Minas teve acesso, o Ministério Público destaca que as investigações comprovaram que a motivação do crime foi torpe e fútil. “Trata-se de crime hediondo (Feminicídio), praticado por motivo fútil, torpe e utilizando-se de recurso que dificultou a defesa da vítima (que estava embriagada), ação violenta, covarde e desproporcional”, afirmou o MPMG.

Além disso, a promotoria destacou que a materialidade e os indícios de autoria são suficientes para o pedido ser expedido. De acordo com o pedido, os garçons foram identificados por outro funcionário do estabelecimento, que foi categórico em seu reconhecimento. O MPMG também argumentou que um dos suspeitos possui registros criminais por tentativa de roubo e uso de drogas.

“A frieza dos investigados, que segundo o gerente, retornaram ao trabalho ‘calmamente’ após o crime, e a própria natureza bárbara do delito indicam que quaisquer medidas cautelares diversas da prisão são inadequadas e insuficientes”, informou.

O que decidiu a Justiça?

Apesar dos pedidos de prisão preventiva, até o momento a Justiça ainda não determinou a medida cautelar. Em sua primeira decisão, a juíza Ana Carolina Rauen argumentou que não há elementos suficientes que comprovem que a causa da morte de Alice tenha relação direta às agressões sofridas.

Além disso, a magistrada afirmou que, até o momento, a investigação não mostrou qual foi a participação de cada investigado, estando a informação “nebulosa” e por isso demanda “melhor aprofundamento na individualização de suas ações”.

No recurso, enviado ao Tribunal Sumariante, o Ministério Público afirmou que a magistrada não considerou a gravidade do crime. Em relação ao argumento da juíza de que não há indícios que comprovem que o óbito teve relação com os ferimentos provocados pelo ataque, o promotor Guilherme de Sá Meneghin afirmou que registros médicos comprovaram que as fraturas de três costelas de Alice causaram a perfuração do intestino.

“Embora o laudo pericial inicial não tenha atestado perigo de vida ou incapacidade superior a 30 dias, ele é datado de 05/11/2025, antes do óbito ocorrido em 09/11/2025 por sepse resultante da perfuração intestinal causada por fragmento de costela fraturada, conforme consta da própria narrativa judicial e do requerimento do Ministério Público (MP) para obtenção de laudo complementar”, argumentou.

O que se sabe sobre o crime?

  • Alice esteve na Savassi, Região Centro-Sul de Belo Horizonte, na noite de 22 de outubro
  • A mulher trans esteve em uma unidade do Bar Rei do Pastel e, por volta de 23 horas foi para outra unidade, a poucos metros de distância
  • No segundo bar, ela consumiu bebidas alcoólicas e foi embora, depois de 00h, sem pagar a conta de R$ 22
  • Assim que saiu, em direção a Avenida Getúlio Vargas, Alice foi perseguida por dois funcionários do bar
  • Eles a encurralaram na mesma avenida, próximo a esquina com a Rua Sergipe, e a cobraram a conta
  • Uma câmera de segurança gravou o momento que a mulher afirma que quitou o débito, mas é desacreditada pelos garçons
  • O equipamento de segurança flagrou o momento que a vítima começou a gritar por socorro, enquanto é ameaçada e agredida pelos homens
  • Alice pediu socorro 12 vezes
  • As agressões continuam por mais de 10 minutos e só param depois que um motoboy interveio ao crime
  • A Polícia Militar e o Samu chegam ao local e levam Alice até a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Centro-Sul
  • Na unidade de saúde ela é medicada e liberada
  • Em 2 de novembro, Alice é novamente levada a um pronto atendimento onde constatam fraturas nas costelas, cortes no nariz e desvio de septo
  • Em 8 de novembro, em nova internação, Alice é diagnosticada com perfuração no intestino
  • Em 9 de novembro, ela é submetida a uma cirurgia de emergência e morre por infecção generalizada

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