Intoxicação por falsa couve: idoso recebe alta e três seguem internados
Planta tóxica foi confundida com hortaliça durante almoço em família em Patrocínio (MG), no Alto Paranaíba
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Três pessoas da mesma família permanecem internadas em estado gravíssimo após ingerirem uma planta tóxica conhecida como Nicotiana glauca, apelidada de “falsa couve”, durante um almoço, em Patrocínio (MG), no Alto Paranaíba. As vítimas são uma mulher de 37 anos e dois homens, de 60 e 67 anos, que estão intubadas e em coma induzido na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) da Santa Casa da cidade.
Uma quarta vítima, um idoso de 67 anos, apresentou melhora clínica e recebeu alta médica nessa quinta-feira (9). “Um idoso de 67 anos recebeu alta hoje. Ele não precisou ser intubado e passa bem. A mulher de 37 anos e os homens, de 67 e 60 anos, estão em estado gravíssimo, mas estáveis”, afirmou a secretária de Saúde de Patrocínio, Luciana Rocha.
Como o almoço em família terminou em intoxicação?
De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde, o caso aconteceu na quarta-feira (8/10), durante um almoço de confraternização em uma chácara na zona rural do município. O dono do local colheu folhas acreditando se tratar de couve e preparou um refogado, por volta das 11h.
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Por volta de 40 minutos após a refeição, os quatro começaram a passar mal. O homem de 60 anos foi o primeiro a relatar sintomas de fraqueza muscular. A mulher de 37 anos foi encontrada com dificuldade respiratória. O idoso de 67 anos, em melhores condições, conseguiu acionar vizinhos, que chamaram o Samu.
Segundo os bombeiros, a mulher teve uma parada cardiorrespiratória ainda na chácara. Os dois homens também sofreram parada cardíaca em seguida. Todos foram reanimados e intubados ainda no local, antes de serem levados para o hospital.
A Vigilância Sanitária recolheu amostras da planta na residência e enviou para análise. A Fundação Ezequiel Dias (Funed) participa da investigação. “Nossa equipe está monitorando de perto a situação dos pacientes e tomando todas as medidas sanitárias e epidemiológicas para confirmar a causa da intoxicação e evitar novos casos”, disse Luciana Rocha.
O idoso que recebeu alta está sendo monitorado pela equipe da Secretaria de Saúde. A investigação sanitária continua.
O que é a Nicotiana glauca?
A Nicotiana glauca é uma planta da mesma família do tabaco, originária do norte e nordeste da Argentina e da Bolívia. Atualmente, está naturalizada em várias regiões do sul da América Tropical, Estados Unidos, México, Austrália, Caribe e em áreas secas do Velho Mundo. No Brasil, ocorre de forma cultivada ou ruderal, em ambientes secos ou úmidos, principalmente em quintais, beiras de estrada e áreas rurais.
A planta é considerada invasora, por se dispersar rapidamente e alterar ecossistemas naturais, ameaçando a biodiversidade nativa. É conhecida por diferentes nomes populares: “falsa couve”, “charuteira”, “couve-do-mato” e “erva-de-charuto”. A confusão com a couve comum aumenta o risco de intoxicação.
Por que a planta é tóxica?
A Nicotiana glauca contém alcaloides piridínicos, como anabasina, nicotina, anatabina e nornicotina, que agem sobre o sistema nervoso e afetam funções vitais como batimentos cardíacos, respiração e controle muscular. Alguns desses metabólitos podem levar à paralisia respiratória e até à morte.
Segundo o professor de química farmacêutica da PUC Minas Guilherme Rocha, a planta produz metabólitos primários, necessários para fotossíntese e sustentação, e metabólitos secundários, que atuam na defesa contra predadores ou atração de polinizadores. Esses metabólitos secundários, como os alcaloides, podem ser extremamente tóxicos e interferir diretamente no metabolismo do corpo humano.
Ele também ressalta que, dependendo da quantidade ingerida, da concentração do alcaloide e do peso da pessoa, mesmo pequenas doses podem ser letais. Ao contrário de alguns alimentos, o cozimento ou refogado não destrói os alcaloides, mantendo a planta perigosa mesmo após o preparo.
A intoxicação pela Nicotiana glauca ocorre em duas fases: inicialmente, os alcaloides causam uma superestimulação dos músculos e órgãos, levando a taquicardia, hipertensão, náusea, tontura e sudorese intensa. Em seguida, os receptores nervosos entram em fadiga, provocando queda brusca da frequência cardíaca, paralisia muscular e respiratória e, em casos graves, parada cardíaca.
Sintomas de intoxicação
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Náuseas e vômitos logo após a ingestão
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Tontura e sudorese intensa
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Taquicardia seguida de queda brusca da frequência cardíaca
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Fraqueza muscular e dificuldade para respirar
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Perda de consciência e parada cardíaca
Como diferenciar a couve verdadeira da "falsa"?
A Nicotiana glauca é muito comum em áreas rurais no Brasil e já causou confusões graves com a couve, incluindo mortes documentadas. A falsa couve pode ser facilmente confundida com a couve comum, mas algumas características ajudam a diferenciá-la.
Ao contrário da couve, que cresce de forma mais rasteira, a Nicotiana glauca desenvolve-se como um pequeno arbusto. Além disso, apresenta flores amarelas e partes com fluorescência, características ausentes na couve tradicional. Para garantir a identificação correta, é recomendado que a planta seja examinada por um biólogo ou especialista em farmacognosia.
Casos de intoxicação por Nicotiana glauca já ocorreram no Brasil. Em 2012, em Santa Luzia (MG), um homem morreu e quatro familiares ficaram internados após comerem a planta refogada, confundindo-a com couve. Em 2018, em Pio IX (PI), seis pessoas, incluindo duas crianças, foram hospitalizadas depois de ingerirem suco com folhas da planta; todas receberam alta.
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O que fazer em caso de intoxicação?
Ao perceber sintomas após a ingestão de plantas desconhecidas, é fundamental procurar atendimento médico imediato, levando, se possível, uma amostra da planta para facilitar a identificação.