Marcos Arruda levou bolhas, espadinhas e estilingues para vender -  (crédito: Marcos Vieira/EM/D.A Press)

Marcos Arruda levou bolhas, espadinhas e estilingues para vender

crédito: Marcos Vieira/EM/D.A Press

A iluminação e os enfeites de Natal na Praça da Liberdade atraem uma multidão de moradores e turistas todas as noites. Mas não só eles. De olho no vaivém de crianças e adultos, vendedores ambulantes transformaram o cartão-postal da Região Centro-Sul de Belo Horizonte em um grande mercado a céu aberto. Lá tem algodão-doce, balões luminosos, brinquedos que fazem tudo quanto é tipo de barulho e soltam bolhas de sabão e, claro, artistas de rua. Muitos conseguem mais de R$ 200 em uma noite. Ao fim do mês, há quem calcule faturar R$ 25 mil.

A presença das crianças é um prato cheio para os ambulantes, que partem para o último fôlego de vendas do ano. “Comprei meu carro com o dinheiro de brinquedo que eu vendi aqui na praça. Este ano, quando acabar, pretendo dar entrada na minha casa”, contou o vendedor Mateus Lucas, de 31 anos, em entrevista à reportagem do Estado de Minas. Mas o esforço de venda tem que ser contínuo. Depois da euforia pós-pandemia, quando, na avaliação do ambulante, as famílias se permitiram gastar um pouco mais nos passeios natalinos, o cenário deste ano é de cautela. A clientela “chora” pelo desconto, e o preço de venda caiu pela metade. “Está difícil. Brinquedo que a gente vendia por R$ 20 no ano passado, hoje está saindo a R$ 10. Estão chorando até o último instante”, conta Mateus.

Alípio Maia aposta no brilho para faturar em ponto 'mais afastado' da praça

Alípio Maia aposta no brilho para faturar em ponto 'mais afastado' da praça

Marcos Vieira/EM/D.A Press

Ainda assim, ele está otimista. Ano passado, o lucro chegou a quase R$ 25 mil. Para 2023, a expectativa era de um aumento de 10%, porém, com o cliente segurando a mão no bolso, Mateus espera, pelo menos, ter o mesmo rendimento do ano anterior. O percentual compensa o tanto que ele anda de um lado para outro. Um dos motivos é a forte concorrência: há vários vendedores com os mesmos brinquedos no local. “Por mais que ano passado tenha tido menos pessoas, o lucro foi maior. E a praça está assim, tem muito vendedor, aí é muita competição. Acaba que um vende por R$ 10 lá, outro por R$ 5. Aí o cliente fica rodando a praça pra ver onde o preço está melhor”, completa.

Mas se engana quem pensa que o dinheiro vem fácil. A rotina é cansativa, e a renda extra é conquistada depois de muito suor e longas horas de trabalho em pé. Mateus chega à Praça da Liberdade às 18h, sem hora para ir embora. “Tem que insistir bastante, porque o cliente fala que não quer, mas dá dois passos e compra na mão de outro”, conta. Com a alta competição, o ambulante Marcos Arruda, de 41 anos, apostou na variedade. “Tenho bolha, espadinha luminosa. O que mais sai é o estilingue luminoso”, diz o ambulante que, há quatro anos, aproveita a aglomeração de pessoas na praça para fazer um extra Natal. Marcos pretende ficar na praça até 6 de janeiro, quando a iluminação será desmontada pela Cemig – a data é uma alusão ao Dia de Reis.

 

Com o lucro, o ambulante planeja quitar as tradicionais contas do início de ano, como o Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA). O trabalho começa logo cedo. “Chego aqui por volta das 18h, mas, durante o dia, eu estou trabalhando, porque tenho que organizar os brinquedos, testar, colocar pilha”, completa. Boa parte dos ambulantes na praça não é formalizada. Por isso, é comum vê-los com um olho no cliente e outro nos fiscais da prefeitura. “É proibido colocar mercadoria no chão. Agora, eles liberaram pra gente não ficar carregando mercadoria no ombro, só não pode colocar em cima da grama nem na rua, atrapalhando o trânsito das pessoas”, explica o ambulante Mateus.

Encantamento

O olhar dos pequenos brilha ao passar pelos balões, pisca-pisca e brinquedos neon que o ambulante Alípio Maia, de 50, exibe na praça. O sucesso de vendas deste ano é, sem dúvida, o balão de LED. Atento à concorrência, Alípio prefere ficar longe da muvuca e tenta chamar atenção pelas luzes dos brinquedos. Os preços variam entre R$ 30 e R$ 25. “Fico mais afastado, bem na ponta onde as pessoas estão chegando. Aqui não tem essa de estar vendendo e chegar outro falando que faz mais barato”, contou à reportagem. Mais tímido, ele não chuta um valor de faturamento, mas diz que o dinheiro “ajuda bastante na renda da família”. “Está mantendo o mesmo ritmo do ano passado, vendendo bem, um movimento bom. Essa semana (a praça) já está mais cheia”, disse. Para conquistar as crianças, ele também costuma vender algodão-doce.

Mateus Lucas batalha pela clientela e espera faturar R$ 25 mil até 6 de janeiro

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Marcos Vieira/EM/D.A Press

Não é só a criançada que fica encantada. Gerações de famílias, como a de dona Ivone Dias, de 69, que compareceu acompanhada dos filhos e netos, se deixam levar pelos brinquedos coloridos. Poucos minutos depois de chegarem a Praça, a avó desembolsou R$ 30 para comprar dois balões de LED, que fazem sucesso entre a garotada. “É só o início, porque as crianças são assim mesmo. Pedem para comprar tudo”, conclui dona Ivone, que planejou gastar R$ 50 no passeio e já sabia, naquele momento, que não conseguiria cumprir o orçamento. Entre uma olhada e outra na iluminação do espaço, a família comeu pipocas e aumentaram a coleção de brinquedos. Ao passar pela reportagem, depois de quase meia hora circulando pela praça, as pequenas Kely, de 1 ano, e Ana Vitória, de 5, brincavam com um dos estilingues luminosos que fazem sucesso neste Natal.

Papai Noel

Presente nos shoppings e centros comerciais, o Papai Noel também arrumou um banquinho na Praça da Liberdade. Todos os anos, Francisco José de Assis, de 67, morador de Carmópolis de Minas, no Centro-Oeste do estado, tira do armário as vestes vermelhas e vem a BH para fazer um bico no Natal.

Dono de uma pequena lavoura, em 2009 ele trocou a labuta no campo pela roupa de Papai Noel. O que começou como algo despretensioso, hoje virou tradição e a brincadeira já segue por 14 anos. O agricultor pede uma contribuição de R$ 10 para que as pessoas tirem uma fotografia ao seu lado. Neste ano, ele também levou chocolates para incrementar o momento. Enquanto conversava com a reportagem do Estado de Minas, o Bom Velhinho atendia as crianças e seus familiares com sorriso no rosto. A fila de espera para as fotos era grande. “É um serviço muito prazeroso, gostoso, apesar de cansativo”, disse.

O Papai Noel Francisco de Assis pede R$ 10 por foto tirada em um banco do cartão-postal

O Papai Noel Francisco de Assis pede R$ 10 por foto tirada em um banco do cartão-postal

Marcos Vieira/EM/D.A Press

Ao fim de cada noite, calcula, as moedas e as notas de pequeno valor lhe rendem de R$ 200 a R$ 300. Na ponta do lápis, descontando hospedagem e alimentação para vir à capital mineira, Francisco estima faturar em torno de R$ 3 mil. Ele garante que a parte mais marcante do trabalho, no entanto, é o olhar das crianças, brilhando por acreditarem no Bom Velhinho.

“O que faz valer a pena é a satisfação deles, é poder dar uma alegria para as crianças”, disse. Ele ressalta que muito do que conquistou foi graças ao trabalho como Papai Noel. Mas, nem tudo são “flores” no trabalho, conta Francisco. Segundo ele, muitas pessoas são mal-educadas e reclamam da contribuição, acham o valor alto. “É um trabalho, e muita gente não entende isso. Tem pessoas grosseiras, tiram foto e depois não querem dar nenhuma contribuição, reclamam”, comenta.