Pinturas em movimento

A arte de fazer com que figuras desenhadas em utensílios de vidro não fiquem estáticas

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As mulheres esticam o corpo para nadar. Os homens seguram firme no cavalo para cavalgar. Os casais se dão as mãos e balançam o corpo para dançar. Por que não levar movimento para a pintura? As figuras que Rocío Castro – costa-riquenha que vive há mais de 40 anos em Belo Horizonte – desenha em utensílios de vidro nunca parecem estar estáticas. Ainda mais quando os recipientes, todos transparentes, se enchem de algum líquido.


Rocío mora em BH desde os 20 anos. Aqui se casou, teve três filhos e mais tarde virou professora de espanhol. Desde pequena, ela ama costurar, tanto que a máquina de costura é uma companhia da vida toda. Era aquela criança que fazia roupas para as bonecas. Já adulta, sempre gostou de visitar lojas de tecidos para ver cores, linhas, rendas e já imaginar os botões. Em uma época, chegou a se arriscar no tricô e nos bordados.


E a pintura? É bem curiosa a história de como Rocío se aproximou das tintas e pincéis. Foi quando sua irmã, professora universitária, que mora na Costa Rica, ficou viúva. Para ajudá-la a passar pelo luto, deu a ela a ideia de fazer um curso on-line de pintura. “A minha irmã falou que não podia naquele momento, aí resolvi fazer o curso e ensinar para ela. Foi assim que tudo começou. Comecei a me arriscar e pintar para mim.”


Sem imaginar, o aprendizado acabou sendo uma “terapia” para ela mesma. “Na pandemia, não saí mais para dar aula presencial e fiquei ‘órfã’ de netos. Uns já moravam na Islândia e os outros se mudaram para Luxemburgo. Aí a minha filha falou: enquanto eles não estão aqui, por que você não pinta? Queria que a minha irmã aprendesse para se ocupar e eu que estou ocupada. Tem vezes que fico sábado e domingo pintando.” Não por acaso, Amma Tita, o nome da marca, é como se diz vovó em duas línguas: islandês e espanhol.


No curso, ela aprendeu o básico, que era fazer listras e flores, mas quis buscar algo diferente. Até porque toda a família tem alguma ligação com artes, estética e criatividade. O marido, um dos filhos e uma das noras são arquitetos. A outra nora é artista plástica. Para completar, Rocío é mãe da designer e fotógrafa Amanda de Mendonça, do Studio Tertúlia, de BH, que desenvolve todo tipo de trabalho criativo.


Nas pesquisas por referências, surgiram inicialmente as nadadoras. Que em cada desenho aparecem com um cabelo, uma roupa, um shape e uma posição diferentes. O que não muda é o traço, sem os detalhes do rosto. Depois foram aparecendo outras figuras, nunca estáticas.


“O vidro e a tinta brilhante, que tem certa transparência, dão a sensação de que elas se mexem, de acordo com o movimento no líquido, principalmente se ele for mais claro. Algumas estão pulando, outras nadando, dançando, caminhando de costas com o guarda-chuva na mão, andando de bicicleta, tocando jazz, sempre em movimento.” Os animais também enfeitam as peças, entre eles peixes, pássaros, galinhas, patos e lagostas.


Cores que alegram


O colorido se destaca. Rocío gosta de misturar tintas com cores brilhantes e vibrantes, propondo uma composição que alegra qualquer um. “Na hora de escolher as cores, coloco a minha alma. Isso me dá muito prazer. Como a maioria dos desenhos tem muita cor, tenho a sensação de que passam alegria”, pontua a artista, revelando que faz cada peça como se fosse para ser usada na sua casa.


Rocío pinta à mão as figuras, uma a uma. Espera secar, analisa se precisa de algum retoque e, depois de 24h, leva para o forno (o de casa mesmo). Ela avisa que é preciso ter muita atenção com a pintura: lavar com o lado macio da bucha e detergente neutro. Nem pensar em lava-louças e água quente. Com esses cuidados, os desenhos podem durar muitos anos.


Não são só as pinturas que emergem do comum. As peças de vidro também passam longe do banal. Rocío está sempre em busca de um design diferente, uma forma surpreendente ou um detalhe inesperado. Já comprou utensílios em antiquários, nas viagens pela Europa que faz para visitar os filhos e netos, até em supermercado garimpa, desde que seja algo que salte aos olhos. Por isso, muitas peças são únicas. Entre as opções, estão copos, taças, xícaras, jarras, chaleiras, cumbucas e moringas.


No fim da conversa, veio a pergunta: como é para você se encontrar uma atividade nova depois dos 60 anos (ela tem 66)? “Não me sinto velha”, responde, na lata, emendando com uma risada. “Às vezes, quando falo a minha idade, nem eu acredito que tenho tanto. Já não tenho tanta agilidade, mas admiro o tanto que consigo fazer. Gosto de ter alguma coisa para fazer e vou continuar dando aula até quando a memória me deixar e vou pintar enquanto minha mão estiver firme.” 

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