Céu e chão belo-horizontinos tornaram-se coloridos neste domingo (20/7) quando a 26ª Parada do Orgulho LGBTQIA+ desfilou pela Avenida Afonso Pena, no Centro, levando consigo uma onda de diversidade.
Milhares de pessoas promoveram a festa, numa pluralidade de gêneros e sexualidades, ao passo em que reivindicavam a máxima da edição deste ano, pela promoção de políticas públicas voltadas para o envelhecimento das pessoas LGBTQIA+.
Antes dos trios desfilarem, a ministra dos Direitos Humanos e Cidadania, Macaé Evaristo, usou o microfone para destacar o apoio da pasta do projeto de lei protocolado recentemente pela deputada federal Duda Salabert (PDT-MG) que objetiva instituir a Política Nacional de Promoção dos Direitos e Atenção Integral às Pessoas Idosas LGBTI.
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A referida parlamentar também discursou na parada e destacou que esta foi a edição “mais difícil da história” da capital. Dias antes do evento, vereadores conseguiram na Justiça a suspensão do financiamento da Prefeitura de Belo Horizonte. “Nós somos, sobretudo, pessoas que resistem. Pessoas que amam, que constroem e que revolucionam. Eles queriam matar essa parada, mas fracassaram”, declarou a deputada.
Outras autoridades políticas e vereadores da capital discursaram no trio. Mais cedo, o prefeito Álvaro Damião (União) marcou presença e enfatizou que a prefeitura deve e vai continuar se fazendo presente na parada. “Temos que pensar no envelhecimento da cidade, se todas as pessoas estão trabalhando, conseguindo o emprego que procuram”, disse.
Assistência
As carências no campo das políticas públicas para pessoas LGBTQIA+ começam desde a base, na formação escolar dos jovens, e perpassa por toda a vida adulta e velhice, na educação, saúde e trabalho. Uma pesquisa feita pela Aliança Nacional LGBTI+ no ano passado revelou que 90% dos estudantes LGBTI+ afirmam ter sido vítimas de algum tipo de agressão verbal nas escolas. A parcela mais vulnerável é a dos jovens trans, na qual 60% chegou a considerar abandonar os estudos.
Este cenário escolar hostil prejudica o desenvolvimento dos jovens LGBTQIA+ e sua inserção no mercado de trabalho. A isto soma-se a descriminação. Uma pesquisa da consultoria Santo Caos mostra que 47% das pessoas LGBTI+ têm renda média abaixo de quatro salários mínimos, número superior ao das pessoas que não fazem parte deste grupo (36%).
Anderson Felipe e Edson Batista Júnior acreditam que as próximas gerações de gays mais velhos experimentarão uma velhice diferente devido às mudanças na sociedade
Júlia Marçal, de 23 anos, conseguiu fugir de uma terrível estatística que aflige as mulheres trans e travestis, na qual grande parte precisa recorrer à prostituição para subsistir. Hoje, ela atua como gerente num restaurante fast food, sendo exemplo de uma travesti que alcançou cargo de liderança. “Muitos não aceitam, mas a gente bota a cara pra jogo. Eu quero ver as minhas alcançando lugares que as pessoas falam que a gente não consegue”, relata.
Em se tratando da saúde de pessoas LGBTQIA+, até mesmo quem consegue acesso às políticas públicas precisa lidar com dificuldades e receios perante os profissionais. Um levantamento feito por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e do Hospital Israelita Albert Einstein mostra que 34% desta população não revela para seus médicos sua identidade de gênero ou orientação sexual - entre aqueles que revelaram, 9% perceberam uma reação inadequada do profissional de saúde.
O autônomo Fabrício Fernandes, 23, defende que além da instituição de políticas públicas para pessoas LGBTQIAP+, é necessário que haja uma melhor capacitação dos profissionais para lidar com esta população. “Há muito profissional despreparado para lidar com estas pessoas, principalmente com a gente que é trans. Há muita falta de respeito”, relata.
Juntas há 23 anos, Carine Romero e Gezelly Teixeira relatam que uma ajuda no desenvolvimento pessoal e profissional da outra
União
Para além das políticas públicas, as pessoas LGBTQIAPN+ também aprenderam a lidar por contra própria e se ajudarem no envelhecimento. O casal Gezelly Teixeira, de 45 anos, e Carine Romero, de 44, é prova disso. As duas estão juntas há 23 anos e, durante este tempo, se desenvolveram mutuamente. “Eu mudei duas vezes de profissão, e essa última foi por incentivo dela”, conta Gezelly, hoje corretora de imóveis.
“A gente se ajuda na questão da saúde, no cuidar uma da outra. O envelhecimento para a população LGBTQIAPN+ é mais complicado do que para o restante da população, mas a gente busca políticas que melhorem para todo mundo”, comenta Carine.
Edson Batista Júnior, de 39, detalha que entre os gays há certa problemática com a questão da solidão dos homens mais velhos, ao que ele atribui a ideia de que a comunidade liga muito para aparência física. “O cara envelhece e continua tentando olhando pra juventude. Aí vai achar, realmente, que ninguém se atrai por ele”, defende.
Seu namorado, Anderson Felipe, de 38 anos, acredita que, apesar desta cultura, a perspectiva para as próximas gerações é positiva. “A gente vai ter agora uma nova geração de velhos gays totalmente diferente do que já teve, com um pouco mais de direitos e de reconhecimento. Talvez não seja a velhice que a gente conhece, triste, onde as pessoas ficavam escondidas”, afirma.
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