Com uma trajetória marcada pela versatilidade e pelo trânsito entre o erudito e o popular, já tendo se debruçado sobre repertórios que vão de Alceu Valença a A-Ha, a Orquestra Ouro Preto (OOP) agora volta seu foco para a obra de Luiz Gonzaga (1912-1989).


O grupo mineiro, sob direção e regência do maestro Rodrigo Toffolo, lançou, na última sexta-feira (26/12), nas plataformas musicais e em seu canal no YouTube, o álbum “Gonzagão: concerto para cordas e trio pé de serra”, em que costura violinos, violas e violoncelos com sanfona, triângulo e zabumba.


O trabalho traz arranjos inéditos de Mateus Freire para músicas como “Asa branca”, “Assum preto”, “O xote das meninas”, “Sabiá”, “Respeita Januário” e “Numa sala de reboco”. Ao todo, são 13 faixas que foram gravadas pelo engenheiro de som Bruno Corrêa e ganharam registro audiovisual, dirigido por Luiz Abreu, durante uma semana no Teatro do Centro Cultural Unimed-BH Minas, com a OOP tocando sem plateia. “Ficamos lá esse tempo, fazendo tudo com calma, com a limpeza que um trabalho desse merece”, diz Toffolo.


Ele explica que o embrião de “Gonzagão: concerto para cordas e trio pé de serra” se encontra, curiosamente, em um trabalho realizado sobre a obra de Vivaldi, que resultou no álbum “Concerto para cordas”, gravado na igreja de São José, em Ouro Preto, e lançado em 2015.


O maestro destaca, naquela obra, o caráter barroco e a potência sonora das cordas. “Passado esse tempo, ficamos imaginando como Vivaldi trabalharia esses aspectos caso estivesse no Brasil, daí surgiu essa ideia de um concerto para cordas e trio pé de serra”, diz.


Diversidade rítmica

O nome de Luiz Gonzaga, ele pontua, veio naturalmente na esteira do conceito, por se tratar de uma “figura máxima da música brasileira, com as possibilidades incríveis que a música dele tem para as cordas”.


Toffolo diz que o novo álbum da OOP une virtuosismo, profundidade musical, brasilidade e a ginga do forró. Ele destaca que a diversidade rítmica e atenção aos grandes clássicos do homenageado orientaram a escolha do repertório, que inclui xote, xaxado, baião e outras levadas que cabem sob a denominação forró.


“A ideia era ter uma elasticidade no trabalho dos arranjos, de forma que as músicas pudessem suceder uma a outra de maneira diversa, contemplando esses diferentes ritmos”, diz. O maestro conta que foi especialmente tocado por essa obra quando ouviu o álbum “Luiz Gonzaga ao vivo - Volta pra curtir”, gravado no Teatro Tereza Rachel, no Rio de Janeiro, em 1972, e lançado somente quase 30 anos depois, em 2001. “Eu sempre indico para quem quer conhecer Gonzagão”, comenta.


Segundo ele diz, que esse trabalho também está por trás da concepção da homenagem ora lançada pela OOP. “Tem ali faixas muito especiais, com uma diversidade de sons, de timbres, que evidenciam como Gonzaga era realmente um gigante da música brasileira, partindo do regionalismo, mas transcendendo esse regionalismo, porque ele é ouvido de Norte a Sul, de Leste a Oeste; é uma música brasileira, nossa, que chega a todos os cantos, o que é muito notável e muito simbólico num país de dimensões continentais”, ressalta.


Intimidade com a obra

Com relação aos arranjos de “Gonzagão: concerto para cordas e trio pé de serra”, Mateus Freire diz que contou a seu favor a intimidade com a obra do Rei do Baião. Paraibano, ele conta que nasceu em uma família musical e que seus pais tiveram o privilégio de tocar diversas vezes com Luiz Gonzaga.


“Essa música nunca foi algo distante ou somente histórico para mim. Ela sempre esteve muito próxima, dentro de casa, nas conversas, nas rodas de violões, nos bolachões que eu escutava na radiola da minha mãe”, recorda.


Ele considera que a obra de Luiz Gonzaga atravessa gerações porque carrega identidade e que, para si, não se trata apenas de um repertório, mas de memória, afeto e pertencimento. Freire diz que o maior desafio na criação dos arranjos foi encontrar o equilíbrio entre dois universos muito fortes e que carregam tradições próprias: o da música de concerto e do trio pé de serra.


“Era fundamental não engessar essa música. As cordas precisavam soar como uma extensão natural do forró, do baião e do xote. O trio pé de serra precisava continuar sendo o coração pulsante da obra, mas sem se sobrepor ao som das cordas, enquanto a orquestra entra como um comentário poético, ampliando cores, harmonias e texturas, sem jamais descaracterizar a simplicidade e a força popular da música de Luiz Gonzaga. As cordas da orquestra e o trio pé de serra soam como se fossem um só instrumento", aponta.

Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia


“GONZAGÃO: CONCERTO PARA CORDAS E TRIO PÉ DE SERRA”
• Disco da Orquestra Ouro Preto
• Musickeria / MSK Records
• 13 faixas
• Disponível nas principais plataformas musicais e no canal do YouTube da OOP

compartilhe