'O retrato de Norah' revela o opressivo mundo feminino na Arábia Saudita
Filme de Tawfik Alzaidi, diretor árabe premiado em Cannes, tem sessões no UNA Cine Belas Artes
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Em cartaz no UNA Cine Belas Artes, “O retrato de Norah” é o primeiro filme saudita a participar do Festival de Cannes – levou menção especial do júri na mostra “Um certo olhar”. É também o primeiro longa-metragem do diretor e roteirista Tawfik Alzaidi. A história vai ao encontro da dele próprio e de tantos outros sauditas que nasceram depois dos anos 1980.
Em 1983 (coincidentemente o ano de nascimento de Alzaidi), o cinema foi banido da Arábia Saudita, por ser considerado ameaça à religião e aos costumes muçulmanos.
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“As pessoas sempre me diziam que não fazia sentido tentar fazer filmes. Quando estava pensando em ideias para meu primeiro longa-metragem, me deparei com algumas histórias de artistas que foram reprimidos nos anos 1980 e 1990”, declarou o realizador. A Arábia Saudita só voltou a ter salas de exibição em 2018 – hoje, seu mercado é o líder do Oriente Médio.
Foi assim que nasceu a história de Norah (a estreante Maria Bahrawi), a musa de Nader (Yagoub Alfarhan). A narrativa é ambientada em 1996, na região de AlUla, lugar remoto e pouco habitado com história riquíssima, de antigas civilizações. A região intercala grandes formações rochosas e áreas desérticas.
Em uma vila que nem sequer tem luz elétrica, a jovem Norah vive com o irmão mais novo na casa de uma tia. Os pais morreram, e ela, assim como todas as mulheres da época, vive sob imensa rigidez. Só sai de casa completamente coberta. Mas quando está sozinha no quarto, Norah sonha com o mundo distante das revistas de moda, celebridades e cinema que contrabandeia do dono do armazém local. Ela quer sair dali e daquela vida à qual não pertence.
O dia a dia de homens analfabetos que vivem do pastoreio muda com a chegada de Nader. Ele será o novo professor da escola – obviamente, só aberta a alunos homens. Ele começa a ensinar os meninos a ler e a escrever. Para estimulá-los, decide recompensar o melhor aluno. Que vem a ser o irmãozinho de Norah. Ao acertar todas as questões do teste, ele ganha de Nader um retrato desenhado à mão.
Quando Norah fica sabendo do desenho, implora a Nader que a desenhe também. Quer ter sua imagem eternizada nas paredes de um museu, assim como as fotos que vê nas revistas. A impossibilidade de comunicação entre uma mulher solteira (Norah está noiva de um rapaz da aldeia) e um homem é apenas um dos empecilhos. Nader reluta em aceitar a missão, até que se deixa convencer. Só que o plano não é fácil de ser colocado em ação, pois a jovem é muito religiosa e não pode mostrar o rosto descoberto.
O mercadinho local, com a anuência do dono, vira o cenário. Nader fica atrás de uma das prateleiras de produtos observando Norah, na verdade só os olhos dela, descobertos através de uma fenda no véu. Os encontros têm de ser breves e secretos. Ainda que não haja romance no ar, a dinâmica entre os dois personagens traz um quê de romantismo – ambos sabem que depois do acontecimento secreto a vida não será a mesma.
“Acredito que sempre há criatividade dentro das pessoas e que ela precisa encontrar uma saída para o mundo exterior”, declarou Alzaidi sobre as motivações da história. Filme aparentemente simples, “O retrato de Norah” reflete, de maneira contundente, sobre como o processo artístico pode ser libertador.
“O RETRATO DE NORAH”
(Arábia Saudita, 2024, 95min.) – De Tawfik Alzaidi, com Yagoub Alfarhan e Maria Bahrawi. O filme está em cartaz às 16h10 na Sala 1 do UNA Cine Belas Artes