Lula precisa de um programa comum de centro democrático, com as forças de cujo apoio necessita no Congresso -  (crédito: Ed Alves/CB/DA.Press – 11/4/24)

Lula precisa de um programa comum de centro democrático, com as forças de cujo apoio necessita no Congresso

crédito: Ed Alves/CB/DA.Press – 11/4/24

 

Uma pesquisa do IPEC divulgada ontem mostrou que 18% dos brasileiros se dizem de esquerda, 28% e centro e 41% de direita, ou seja. A direita tem 23% a mais de eleitores do que a esquerda. Ocorre que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, embora tenha uma composição bastante ampla, que abarca partidos de direita, como o União Brasil, o PSD, o PP e o Republicanos, não são percebidos pela população como um governo de coalizão democrática.

O PT se esmera para que a percepção seja a de que é um governo de esquerda, corroborado pelo confronto permanente de Lula com Bolsonaro e certas declarações que corroborariam um viés estatizante, nacionalista e antiamericano. O fato é que, na disputa pelo centro político, que diminuiu de 34% para 28%, a direita tem levado a melhor. Lula obteve muitos votos de centro e até de direita, principalmente de mulheres, na disputa do segundo turno das eleições, quando teve o apoio de Simone Tebet (MDB). Esses votos se descolaram e muitos podem migrar para a direita.

 

Com Bolsonaro inelegível, a possibilidade de Lula enfrentar um adversário em condições de disputar esses votos de centro com certa facilidade é muito grande. Quatro governadores de estados importantes são capazes de atrair esse eleitorado, em seus respectivos estados. Todos estão posicionados para ser candidato em 2026 e já buscam projeção nacional: Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás; Romeu Zema (Novo), em Minas; Ratinho Junior (PSD), no Paraná; e Tarcísio de Freitas (Republicanos), o único que ainda pode concorrer à reeleição.

Os quatro podem se aproveitar de que Lula não tem empatia com o ethos conservador da maioria da sociedade; voltou à Presidência por causa do fracasso do governo Bolsonaro e da sua ameaça autoritária, por uma estreita maioria da sociedade. Ethos é um conceito que se utiliza do grego para descrever o “caráter moral”, os valores e as crenças de uma pessoa, grupo ou sociedade. Para a sociologia e a antropologia, o ethos são costumes e os traços comportamentais que distinguem um povo.

Nesse sentido, temos duas dimensões: a grande diversidade cultural do país, que favorece antagonismos entre baianos e mineiros, cariocas e paulistas, nordestinos e sulistas; e a cada vez mais expressiva divisão entre os católicos tradicionais e os evangélicos, que começam a transbordar dos salões para as ruas. O resultado eleitoral mostrou dois brasis: o setentrional e o meridional.

Em Aristóteles, o ethos influencia a sociedade ao lado do logos, a razão, e do pathos, a emoção. A calibragem dessa relação na política não é nada fácil. Mas existe um denominador comum: a Constituição. No direito constitucional, o ethos refere-se ao conjunto de valores fundamentais, princípios e ideais que permeiam a ordem constitucional. A radicalização política ameaça o texto constitucional. A facilidade com que surgem propostas de emendas constitucionais que tentam mudar a relação entre o Estado e a sociedade, sobretudo as minorias, merece muita atenção da sociedade civil e não apenas do Supremo Tribunal Federal (STF).

 

Imagem negativa

Mas voltemos ao governo Lula. As pesquisas de opinião pública mostram uma queda de popularidade do governo em diversas áreas, em contradição com os números macroeconômicos: emprego, renda, inflação. Nas oito áreas avaliadas pela pesquisa do Ipec, apenas uma teve a avaliação positiva maior do que a negativa: a Educação (38% dos entrevistados consideram como ótima ou boa; 31% avaliam como ruim ou péssima; 28%, regular), apesar do lobby dos professores contra o ministro Camilo Santana, ex-governador do Ceará. A sequência de resultados é preocupante para Lula.

Combate à inflação: ruim ou péssima para 46%; ótima ou boa para 23%; regular para 28%. Segurança pública: ruim ou péssima para 42%; ótima ou boa para 27%; regular para 28%; Combate ao desemprego: ruim ou péssima para 39%; ótima ou boa para 26%; regular para 31%. Saúde: ruim ou péssima para 42%; ótima ou boa para 29%; regular para 30%; Política externa: ruim ou péssima para 37%; ótima ou boa para 30%; regular para 24%; Combate à fome e à pobreza: ruim ou péssima para 38%; ótima ou boa para 33%; regular para 29%. Meio Ambiente, houve empate: 33% dos entrevistados consideram a gestão ótima ou boa e 33%, ruim ou péssima; regular para 29%.

Ontem, Lula cobrou mais agilidade e dedicação à articulação política de seus ministros, inclusive do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (precisaria “ler menos livros”, pasmem, e fazer mais política com o Congresso). Sim, existe um problema de desempenho nos ministérios, mas só a comunicação do governo e menos mancadas de Lula podem mudar a percepção sobre os resultados positivos do governo. É preciso também superar a concepção de que o eixo do governo é uma insustentável agenda de esquerda. Lula precisa de um programa comum de centro democrático, com as forças de cujo apoio necessita no Congresso, no qual todos, à esquerda e à direita, dentro do possível, sejam contemplados.