
Não à toa, o “padre” foi chamado em diferentes momentos primeiro por Soraya Thronicke e depois por Lula, nessa ordem de “padre de festa junina”, “candidato laranja” e impostor “fantasiado de padre”, expressões que aos mais argutos observadores fazem jus à situação: antes Kelman sentou-se ao lado de Bolsonaro, com quem trocou papeis com instruções de perguntas. As imagens do flagrante circulam hoje, viralizadas nas redes. Bolsonaro e Kelman agiram em dupla, durante o evento midiático, em que as maiores vítimas foram os planos de governo e os fatos.
Bolsonaro teve ainda o apoio do candidato do Novo, Felipe d’ Ávila, que levantou a bola para que o presidente atacasse o ex-presidente. D’Ávila usou réguas diferentes para se indignar, de um lado com o “Mensalão” e o chamado “Petrolão”; e, por outro, com o Orçamento Secreto, sangria desatada aos cofres públicos no atual governo. Sobre este, como de costume, Bolsonaro lavou as mãos e lançou sobre terceiros a responsabilidade: a excrescência com a qual coopta apoio político foi atribuída à Geni, digo, ao Congresso. D’Ávila foi reiteradamente seletivo em sua indignação contra a corrupção: evitou os níveis mais detalhados de denúncias que pairam sobre o governo Bolsonaro no MEC, na compra de vacinas, para não mencionar as conhecidas “Rachadinhas” e a predileção daquela família pela aquisição de imóveis em espécie. Estas foram questões apontadas principalmente por Simone Tebet, Soraya Thronicke e Lula. D’Ávila também comprou narrativas rasteiras, tentando associar Lula a países governados por uma demonizada “esquerda”.
D’Ávila se apresentou como uma espécie de “Ken de terno”, marido da boneca Barbie: impostado, repetitivo em jargões elitistas, não transmite emoção, o que seria realmente difícil para quem tenta vender uma pauta ultraliberal a um país em que 30 milhões passam fome. Além de atacar Lula e poupar Bolsonaro, linha que daqui para frente crescentemente deverá marcar o discurso político de Romeu Zema, - que até aqui se pretendia neutro para não perder intenções de votos da base “Lulema” - , D’Ávila aproveitou os seus momentos de exposição para propagandear o seu partido Novo, que faz seleção de candidatos mediante inscrição paga: indicou o governador de Minas, que se prepara para disputar em 2026 as eleições presidenciais, como referência em probidade e gestão.
Para quem conhece e está habituado aos modos, o tom de Bolsonaro foi de falsete, de certo cinismo quando interagiu com as candidatas Tebet e Thronicke. Após uma abertura nervosa em que jorrou sobre Lula trechos de acusações desconexas, não apenas apontando o dedo que se pretende vestal, como se em seu governo e em sua família denúncia de corrupção não houvesse; mas também vocalizando velhas teorias do submundo das fake news, que tentam associar Lula ao assassinato do ex-prefeito de Campinas, Celso Daniel. Em vez de fazê-lo diretamente a Lula, Bolsonaro usou Simone Tebet para endereçar ao petista a pergunta. A estratégia foi rebatida por Tebet, que manteve uma articulada participação, coerente com a sua atuação na CPI da Covid, mas que tampouco poupou críticas aos governos do PT. Tebet sai deste show pronta para concorrer em 2026 como a principal candidata à terceira via, posto até aqui atribuído a Ciro Gomes. Este, se saiu bem quando conseguiu expor algumas de suas propostas. Mas mirando excessivamente a árvore, Ciro se perdeu da floresta, num alinhamento político ditado mais pelo fígado do que pela razão, ora em apoio a Bolsonaro para atacar Lula; tentando compensar, nos últimos blocos, em críticas menos contundentes a Bolsonaro.
Lula se defendeu com mais ênfase do que no debate da Band e, foi mais firme em diversas passagens invertendo a argumentação com a indicação de muitas das incoerências lançadas por seus adversários. Em alguns momentos se saiu bem em discurso mais propositivo, como ao defender políticas afirmativas para a compensação histórica da herança escravocrata. Mas, no frigir dos ovos, a participação de Lula foi mais defensiva, deixando a impressão de não ter conseguido capturar indecisos. Se é que alguém o fez, Simone Tebet se não foi vencedora agora, pavimentou o seu caminho para o Planalto. As narrativas não contribuíram para um debate propositivo, esclarecedor, que abordasse os verdadeiros problemas do Brasil.
O "Beabá da Política"
A série Beabá da Política reuniu as principais dúvidas sobre eleições em 22 vídeos e reportagens que respondem essas perguntas de forma direta e fácil de entender. Uma demanda cada vez maior, principalmente entre o eleitorado brasileiro mais jovem. As reportagens estão disponíveis no site do Estado de Minas e no Portal Uai e os vídeos em nossos perfis no TikTok, Instagram, Kwai e YouTube.
