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Estado de Minas EM ENTREVISTA

Vídeo: Duda Salabert fala de representatividade, Serra do Curral e eleição

Em podcast EM/UAI, vereadora de Belo Horizonte relembra trajetória política e os tempos de sala de aula e faz críticas a rivais e colegas de partido


05/05/2022 18:46 - atualizado 08/05/2022 17:34


Professora, mulher trans e vereadora mais votada da história de Belo Horizonte, Duda Salabert (PDT) sabe o peso dos 37.613 votos que recebeu. Primeiro, porque representa um grupo social em que 90% dos integrantes tem a prostituição como fonte de renda - segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Segundo, porque prometeu plantar uma árvore para cada voto conseguido. E, embora tenha feito nascer cerca de 3,5 mil troncos, diz que está no "SPC das árvores".

A parlamentar é a convidada desta semana do "EM Entrevista", videocast do Estado de Minas e do Portal Uai. Durante os 55 minutos de conversa, falou sobre representatividade trans, participação das minorias nos espaços políticos e mineração na Serra do Curral. Ela aproveitou o bate-papo para tecer críticas a Romeu Zema (Novo) e, inclusive, a colegas de partido.

"Quem mais sofre a violência política são os grupos historicamente aviltados, como mulheres, indígenas, negros e a comunidade LGBTQIA+ - sobretudo travestis e transexuais", diz.

A vereadora de BH, Duda Salabert, no estúdio do Estado de Minas
Ao videocast do Estado de Minas, Duda Salabert teceu críticas a Romeu Zema, do Novo (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)


Duda tem na ponta da língua a palavra "consciência". Ela usa o termo ao contar do projeto das árvores - e afirma que a ideia é "plantar a consciência". A palavra aparece, também, quando explica porque ela, professora de Literatura, resolveu reivindicar um assento no legislativo.

"Mais importante do que o voto, em uma eleição, é construir pedagogicamente nova consciência para transformar o mundo. O que muda o mundo não são novas leis, mas novas consciências - e elas se constroem em salas de aula", afirma.

Ao longo da entrevista, Duda também relembrou os embates com Nikolas Ferreira (PL), vereador bolsonarista, e deu spoilers sobre seu futuro político. Cotada para disputar cadeira na Câmara dos Deputados neste ano, não descarta tentar o Senado ou mesmo o governo, embora o PDT tenha o ex-deputado federal Miguel Corrêa como pré-candidato.

"Minha tendência, hoje, é pensar um terceiro nome para o governo do estado", garante. "Pode ser eu, inclusive", continua, ao afirmar que há nomes em pauta para a empreitada da "terceira via" estadual.

Confira os principais trechos da entrevista:


A senhora tem a pretensão de se mudar para Brasília?

Minhas raízes políticas e afetivas estão em BH. A questão é onde podemos contribuir mais para a cidade, como vereadora, senadora ou deputada federal. Prometi, na campanha, cumprir o mandato, pois sou contra o carreirismo político. No entanto, após ser eleita com recorde de votação, recebi três ameaças de morte do maior grupo de ódio da internet brasileira.

Disseram que iam me matar e transformar a escola onde dava aula em um mar de sangue. Mandaram esse e-mail aos donos da escola e para alguns professores. Fiz uma reunião com representantes da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e ficou consagrado que um mandato na esfera federal daria mais segurança à minha vida.

Para eu construir política pública, tenho de estar viva. Minha família está exposta, pois não me mudei. Tenho de pensar onde posso contribuir para a cidade. A Câmara Municipal tem papel importante, mas os grandes debates, caros ao mandato, como transporte, meio ambiente e educação, acontecem em Brasília. Estamos avaliando e vamos conversar com a cidade.

A senhora citou o Senado. Pode concorrer à vaga em jogo neste ano?
Pode ser o Senado. A última pesquisa que nos colocou, nos pôs em segundo lugar, com empate técnico, sendo que 70% dos eleitores não sabem em quem votar. Estamos em um partido grande, com repercussão nacional devido ao que construímos na cidade. Temos que conversar com o PDT e os eleitores. Se for o caminho, temos fôlego, apenas quatro ou cinco pontos atrás do primeiro colocado.

A senhora citou a ameaça sofrida em dezembro de 2020. Há um cenário de violência política contra a mulher. Isso marcou os seus quase dois anos de mandato? Como vai ser na eleição deste ano?

Infelizmente, a eleição deste ano, possivelmente, será a mais violenta da história do Brasil. Há uma polarização se construindo, mas o problema não é a polarização em si, se for do ponto de vista de ideias. O problema é que ela está sob um contorno de violência e intolerância que impossibilita o diálogo. Venho da área de literatura e sei a importância e o poder da palavra. Quando a palavra falha, a violência entra em cena. Uma pessoa bate em outra quando não consegue mais discutir.

Daí a importância do diálogo e de colocar, como elemento fundamental da política, a arte de buscar consenso pelo diálogo. Nessa ausência de diálogo, os espaços legislativos acabam sendo, também, muito violentos.

Quem mais sofre a violência política são os grupos historicamente aviltados, como mulheres, indígenas, negros e a comunidade LGBTQIA+ — sobretudo travestis e transexuais.



A violência política é escancarada no Brasil, que está entre os países com mais homicídios no contexto de eleição. Tentaram matar o presidente Jair Bolsonaro e tivemos Marielle Franco assassinada; dois episódios que traduzem a violência política em algo mais extremo. Mas existem outras formas de violência política que passam na esfera legislativa.

Por isso, o espaço político para muitos grupos, como as mulheres e as pessoas travestis e transexuais, acaba sendo adoecedor. Não adianta apenas eleger mais mulheres. Temos que garantir a participação delas no espaço político para que ele seja minimamente saudável.

Já sofri algumas violências no espaço legislativo e denunciei todas. A maior violência é a silenciosa, que é difícil de explicar, porque não vai ter prova. Mas sabemos que é violência por meio de olhares que nos exotificam, hipersexualizam e ridicularizam, pequenos risos que tentam descredibilizar ou, então, ouvidos que viram para o lado para não ouvir porque acham que não temos o que contribuir por sermos mulheres, travestis e transexuais, negros e negras.

Em 2020, houve 294 candidaturas de pessoas trans, com 30 eleições. Esses números podem aumentar neste ano? Podemos falar que houve avanços?

A luta do movimento trans na América Latina ainda é para conquistar a categoria de humanidade. No Brasil, essa categoria não é dada, mas disputada. Até 120 anos atrás, negros não eram conhecidos como humanos pelo Estado brasileiro. Foram séculos de luta para que conquistassem, mesmo que precariamente, a categoria de humanidade. Nós, travestis e transexuais, ainda não conquistamos essa categoria.

A maior pauta do movimento trans na América Latina é o respeito ao nome, à identidade e de ter acesso a um banheiro.

O STF discute há seis anos o banheiro que vou usar. Se vou ao masculino, recebemos inúmeras violências devido ao preconceito cristalizado no imaginário popular. Se vou ao feminino, sou arrancada pelos cabelos. A luta pela categoria de humanidade passa por ocupar o espaço político. Uma legislação a seu favor te credibiliza enquanto ser humano.

Acredito que, com certeza, no mínimo uma travesti será eleita deputada federal. Isso alarga a democracia, que pressupõe diversidade.

O presidente da Fiemg classificou os defensores da Serra do Curral de causadores de ‘tumulto ambiental’. Como recebeu essa declaração?

“Tumulto ambiental” é um projeto de mineração no maior símbolo de BH, quiçá de Minas, responsável pela segurança hídrica da região metropolitana. Estamos em cenário de crise hídrica e emergência climática, o que nenhuma obra de mineração tem levado em conta.

O processo [de licenciamento à Tamisa] é ilegal, pois vai afetar diretamente BH pela possibilidade de o Pico Belo Horizonte, símbolo de nossa bandeira, ser destruído. [Pode] afetar também piorando a qualidade do ar, pelas explosões de dinamite e por intenso tráfego de caminhões.

No quadrilátero aquífero-ferrífero, é impossível minerar sem destruir reservatórios de água. Qual riqueza vai deixar? A mineração, em Minas, não é só uma atividade econômica, mas ideologia. A mineração, nos últimos 10 anos, representa em média apenas 4% do PIB, 1,2% dos empregos em Minas e 2% dos impostos arrecadados. Que essencialidade é essa? Temos que pensar um projeto de diversificação econômica para o estado.

Prefeitura de BH e governo mineiro têm visões opostas sobre o caso da Serra do Curral. O tema vai ser central na disputa estadual, que deve ter Kalil e Zema?

Zema representa o poder das mineradoras. Esse é o papel dele. Ele é um office boy das mineradores. Questionamos, tem que ser demitido como office boy, mas é o papel dele. O ex-prefeito Alexandre Kalil tinha que ser mais incisivo.

Chamamos ele para o carnaval em defesa da Serra do Curral. Estamos organizando, para quinta-feira, um grande ato, com a vida de artistas — possivelmente, devem vir Caetano Veloso, Gilberto Gil ou Milton Nascimento. Talvez algum deles venha. Que o Kalil esteja presente, como pré-candidato ao governo. Ele diz que é contra, mas falar, até papagaio fala.

Tem de estar na luta, como estamos fazendo. Se o PDT achar que, em um cenário de disputar o governo para escancarar o problema mineração, a gente faz do ponto de vista pedagógico — e político porque temos fôlego. Há um mito de que mineração distribui riqueza; ela distribui pobreza.

A senhora falou de um projeto do PDT para mostrar problemas da mineração, mas o partido recebeu o deputado Thiago Cota, que chegou a ser favorável à expansão da exploração na Serra da Moeda.

Muito mal vindo. Vai ser tratorado por nós dentro do partido. Todos os partidos têm influência da mineração. O PT foi responsável pela flexibilização da legislação ambiental no estado. [Fernando] Pimentel retirou o Ministério Público do Copam. No nosso partido, tem esse [Cota]. Não vamos dar chance. Não representa o programa do PDT. A cadeira não é do candidato, mas do programa, que tem de ser cumprido. Somos um partido ideológico.

Por que não foi ao evento do PDT para lançar a pré-candidatura de Miguel Corrêa ao governo?

Estava em Brasília, discutindo a criação do Parque Linear do Belvedere. Me sentei com os senadores Alexandre Silveira e Rodrigo Pacheco, além de deputados. A área seria vendida e iriam transformar aquela região em grande rodovia ou [empreendimento do] setor imobiliário. Conseguimos frear o leilão daquela vez. Sobre Miguel Corrêa: não o conheço, temos divergências políticas claras. Partido é espaço de disputa, tese, antítese e síntese. Estamos em campos diferentes. 

Mas ele é o pré-candidato, embora a aliança com Kalil não esteja descartada. Como fica a senhora nesta situação?

Fico com meus ideais e meu projeto, que vamos discutir no PDT. Roupa suja se lava em casa. O partido tem disputa. Em alguns dias, haverá reunião da Executiva, e estou vice-presidente nacional do PDT. Vamos discutir.

Posso me lançar candidata ao governo. Podemos lançar outra pessoa. Quem decide não é Mário Heringer [presidente do PDT em MG], Miguel Corrêa ou Ciro. É o partido. Vamos discutir com a base.

O fato é que temos divergências claras com Miguel Corrêa. Minha tendência, hoje, é pensar um terceiro nome para o governo do estado. Temos conversado, mas não posso dizer [nomes]. Pode ser eu, inclusive. Tenho fôlego.

A senhora está à esquerda e, antes do PDT, foi do PSOL. Ciro Gomes não descarta conversar com partidos do centro à direita, como o PSD. Como recebe isso?

Não estamos discutindo a conquista de um grêmio, mas de um país. E, para isso, tem de conversar com várias frentes ideológicas. Brizola ensinou que apertou a mão de todo mundo. O mistério não é apertar, mas não sujar depois que apertou. A questão é o programa. O programa econômico de Ciro é o mais à esquerda. É o único pré-candidato que fala em revogar a Reforma Trabalhista e as reformas de Michel Temer.

Foi o único que comentou sobre a Serra do Curral. Lula escolheu Alckmin como vice, e o PSOL está apoiando. Discutimos a maior crise da história do Brasil. Discutimos a minha vida.

A reeleição de Bolsonaro pode significar a minha morte. Seja que as ameaças me assassinem, seja por meio de um suicídio ou por meio da violência na rua. E, quando falo ‘minha’, é, também, dos grupos do qual faço parte. Temos de eleger alguém do campo progressista — que seja Lula ou Ciro, minha preferência.


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