A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de prosseguir com a ação de impugnação de mandato eletivo (Aime) da presidente Dilma Rousseff (PT) e do vice Michel Temer (PMDB) gera divergências entre juristas sobre o que pode ocorrer daqui para frente. Há dúvida até mesmo se o TSE tem competência para cassar o mandato da petista. Sem um prazo formal para o julgamento, especialistas em direito eleitoral acreditam que uma decisão pode ser tomada no ano que vem ou demorar anos, e, em caso de uma eventual condenação, também não há certeza em dizer quem assumirá o comando do país.
Em parecer elaborado a pedido da defesa da presidente Dilma, o jurista Dalmo de Abreu Dallari, professor emérito da Universidade de São Paulo, argumenta que o TSE não tem competência para cassar mandato de presidente. “O artigo 85 da Constituição dispõe, especificamente, sobre as hipóteses de cassação de mandato do Presidente da República e ali não se dá competência ao TSE para decidir sobre a cassação”, argumentou, em resposta aos advogados da campanha da petista. Dalari sustenta ainda que um presidente não pode ser responsabilizado durante o mandato por atos que não têm relação com suas funções, mesma regra que fundamentou a decisão do STF em março de não investigar Dilma no âmbito da Lava-Jato.
Já o professor emérito da Universidade Mackenzie, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército e Superior de Guerra e membro da Academia Brasileira de Filosofia, Ives Gandra Martins, afirma que o TSE pode anular a eleição de Dilma se comprovar que a campanha foi abastecida com dinheiro desviado da Petrobras. “O TSE tem obrigação (de investigar), se não, a corte não teria função nenhuma. O TSE pode anular com a maior tranquilidade”, afirmou o jurista. Segundo Gandra, se for comprovado que o PT recebeu dinheiro de propina da Petrobras, isso pode tornar a eleição da presidente Dilma “anulável, uma vez que ela teria sido eleita com dinheiro de delito”.
Caso isso ocorra, porém, a petista pode recorrer até ao Supremo Tribunal Federal (STF), que terá a última palavra. O processo será longo. Haverá citação dos acusados, oitiva de testemunhas e possíveis perícias em provas documentais. O processo pode se arrastar por anos. “Essa ação teve início agora, é preciso apurar os fatos, verificar os documentos da Lava-Jato para ver se há relação com a campanha de Dilma. Em tese, teria um ano para a ação ser julgada, só que passamos quase um ano para ela se iniciar”, afirmou o presidente da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais, Wederson Siqueira.
Demora de dois anos
Segundo o advogado, juízes de primeira instância demoram de um a dois anos para julgar processos dessa natureza nos municípios. “Por ser uma presidente e uma decisão que repercute no Brasil inteiro, acredito em prazos ainda mais dilatados. Acho que não haverá uma pressa grande e será dada toda a possibilidade de produção de provas, eu apostaria em uns dois anos para julgar”, afirmou Siqueira. Essa demora e a possibilidade de recursos, segundo o jurista, poderiam deixar o país sob comando do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB/RJ) ou de quem vier a assumir a função dele.
Pela Lei 13.165, sancionada em 29 de setembro pela presidente Dilma, em caso de cassação pela Justiça Eleitoral, são realizadas novas eleições independentemente do número de votos anulados. Até então, outro pleito só ocorria quando a votação do eleito fosse superior a 50%. A norma diz ainda que a nova escolha só ocorrerá depois do trânsito em julgado do processo. “Um processo desses nunca vai chegar lá, porque existe recurso até o STF, neste caso, quem governaria o país seria o presidente da Câmara”, afirmou o presidente da comissão da OAB.