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Estado de Minas

Promessas descumpridas enterram sonhos de quem participa de programas

Ao contrário do que disse na campanha, Dilma encolheu e mudou regras de programas sociais, deixando a ver navios quem almejava casa própria, crescer profissionalmente e melhorar de vida


postado em 13/09/2015 08:00 / atualizado em 13/09/2015 09:20

"Nunca mais conto com o Fies. O governo tira tudo dos pobres. Por que não tirar do salário do senador ou pegar o dinheiro da roubalheira?" (Marciano Jonathan de Souza, eletricista/FIES) (foto: Beto Noaves/EM/D.A Press)

Enquanto a presidente Dilma Rousseff (PT) vai a público dizer que o governo gastou demais e, por causa da crise, terá que “reavaliar medidas” e administrar “remédios amargos”, enquanto o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirma que os brasileiros têm de encarar a alta de impostos como um “investimento”, uma parcela dos brasileiros já amarga os efeitos das turbulências criadas no Palácio do Planalto. Embora a mandatária tivesse garantido na campanha política que não mexeria nos programas sociais, para quem depende desse apoio, a crise pela qual passa o Brasil não apenas está doendo no bolso, mas já começa a comprometer sonhos. O sonho de entrar na faculdade. O sonho de comprar a casa própria. O sonho de se qualificar para entrar no mercado. O sonho de se formar com experiência internacional. Todos os desejos de crescer na vida que começam a ser abalados pela redução de investimentos, a mudança de regras e o encolhimento de programas que foram a principal vitrine eleitoral do PT.

O anúncio da terceira fase do programa habitacional Minha casa, minha vida pelo governo esta semana só serviu para que a monitora infantil Elaine Andrade da Silva, de 33 anos, pusesse ainda mais os pés na dura realidade. O governo diminuiu os subsídios e aumentou os juros para novos contratos, e o próprio ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, admitiu que a continuidade do programa ocorrerá “mais devagar, condizente com o cenário fiscal do próximo ano”. “Agora, o sonho de ter minha casa está muito distante. Mas nem fiquei surpresa. Na atual situação, cortam é nas questões sociais”, critica.

Elaine está na fila do Minha casa, minha vida da capital mineira desde a criação do programa, em 2009. Ela já se cadastrou, já se recadastrou e até agora não teve qualquer sinalização sobre quando terá a casa própria. Metade da renda da monitora infantil é comprometida com o aluguel de R$ 600 do apartamento onde mora com a filha, no Bairro Vale do Jatobá, no Barreiro. “Eu não acredito mais nesse projeto. Ele foi feito num momento de crise para beneficiar construtoras”, afirma Elaine, que sabe exatamente o que fazer. “Tenho que matar um leão por dia. E, enquanto trabalhadora e mãe, procuro lutar pelo direito à moradia”, reforça.

"Eu não acredito mais nesse projeto. Ele foi feito num momento de crise para beneficiar construtoras" (Elaine Andrade da Silva, monitora infantil/ MINHA CASA, MINHA VIDA) (foto: Cristina Horta/EM/D.A Press)


Segundo o Ministério das Cidades, a terceira fase vai contratar mais 3 milhões de unidades até 2018. O número é praticamente o mesmo das unidades pendentes que o governo ainda precisa entregar nas duas primeiras fases do programa – 2,9 milhões de moradias. Até agora, foram contratadas 6,7 milhões de unidades.


EDUCAÇÃO
O eletricista Marciano Jonathan de Souza, de 26 anos, também está sentindo os efeitos da crise na pele e ficou de fora da “Pátria educadora”, slogan usado pela presidente em seu segundo mandato. Ele havia sido aprovado no curso de engenharia elétrica numa faculdade particular. Ficou matriculado três meses, mas, sem garantia de que conseguiria o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e com medo de assumir uma dívida impagável, abandonou o curso. “Foi muito ruim ter que sair da faculdade. Mas a mensalidade era R$ 1,1 mil. Esse é o dinheiro com que eu sobrevivo”, diz.

Além de problemas de inscrições por causa do esgotamento dos recursos, as regras do Fies, programa do governo que financia cursos em instituições de ensino privado, mudaram e criaram um funil para quem quer participar do programa. “Nunca mais conto com o Fies. O governo tira tudo dos pobres. Por que não tirar do salário do senador ou pegar o dinheiro da roubalheira?”, questiona o rapaz, indignado. “Minha casa já foi levada por enchente em 1996. Não tenho medo do futuro, não, moça”, conta Marciano, empenhado em passar, no ano que vem, numa universidade pública.

No ano passado, foram concedidos em todo o país 732,2 mil novos financiamentos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), vinculado ao Ministério da Educação (MEC). No primeiro semestre deste ano, eles caíram para 252 mil e, no segundo semestre, para 61,5 mil novos contratos, totalizando 313,5 mil bolsas, nem a metade de 2014. Apesar disso, o FNDE afirma que o recurso para este ano é de R$ 16,58 bilhões, maior do que no ano passado, de R$ 13,75 bilhões. O governo justifica que as mudanças têm como objetivo “melhorar a qualidade dos cursos e contribuir para a sustentabilidade do programa”.

"Você quer uma coisa a vida inteira e consegue, mas, por causa desse problema, você tem que sair. Não quero depender do Fies, não tem nenhuma segurança" (Gustavo Diniz, estudante/FIES) (foto: Cristina Horta/EM/D.A Press)



CURSINHO Quem também não conseguiu passar pelo funil do MEC foi o estudante Gustavo Diniz, de 18 anos. Ele começou a cursar medicina veterinária numa escola particular e largou o curso, pois a família não poderia pagar os R$ 2 mil de mensalidade. “Quando fiz vestibular, estava contando que ia conseguir a bolsa do Fies. Pagar R$ 2 mil todo mês é bem difícil”, conta Gustavo, filho de um gerente de supermercado e de uma professora da rede estadual. Os pais bancaram dois meses e, sem ter de onde tirar mais dinheiro, o filho abandonou o sonho. “Você quer uma coisa a vida inteira e consegue, mas por causa desse problema, você tem que sair. Não quero depender do Fies, não tem nenhuma segurança”, afirma o estudante, que se matriculou num cursinho pré-vestibular.

Já o estudante do 6º período de engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Vítor Dutra, de 20, está em compasso de espera. Ele planejava fazer um intercâmbio no exterior por meio do programa Ciência Sem Fronteiras, que dá bolsas a alunos de graduação e pós-graduação em universidades internacionais. “Já era para ter aberto o edital e o processo seletivo”, comenta Vítor, que via na experiência a possibilidade de expandir horizontes. “Para o currículo, é bom ter essa experiência. Se não for agora, não terei opção, porque já vou ter concluído o curso”, diz.

A Capes, órgão ligado ao MEC e responsável pelo programa, informou que o Ciências sem Fronteiras já atingiu as 101 mil bolsas previstas e que os últimos estudantes da graduação selecionados já estão viajando neste segundo semestre. Segundo o órgão, a segunda fase ainda está em elaboração. Em maio, o MEC havia anunciado que o programa teria “sua continuidade garantida este ano, com o redimensionamento na oferta, buscando otimizar o atendimento dos estados e das vagas, com ofertas que ainda serão definidas, mas que quantitativamente serão em número inferior ao do ano passado”.

"Para o currículo, é bom ter essa experiência (estudar fora do país). Se não for agora, não terei opção, porque já vou ter concluído o curso" (Victor Dutra, estudante/CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS) (foto: Cristina Horta/EM/D.A Press)


Pronatec reduzido a um terço em 2015

Na campanha eleitoral, a presidente Dilma Rousseff (PT) falou maravilhas do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), chegou a sugerir a uma economista desempregada que fizesse um curso técnico gratuito e prometeu a expansão do programa para 12 milhões de vagas até o fim do mandato. A sugestão, na época, virou piada, mas, agora, mesmo seguindo a dica da mandatária, a economista pode encontrar dificuldades para se recolocar no mercado. Além de reduzir o número de cadeiras do programa, o governo ainda endureceu as regras para o repasse de recursos para instituições de educação que formam os estudantes.

Em 2014, foram 3 milhões de bolsas abertas para cursos profissionalizantes por meio do programa. Em 2015, serão abertas em torno de 1 milhão. Somente em Minas, o número de vagas ofertadas pelo Pronatec este ano caiu mais de três vezes em relação a 2014, passando de 28,7 mil oportunidades para 8,1 mil. As vagas nos cursos gratuitos oferecidos por instituições parceiras, como Senai e Senac, diminuíram de 19,8 mil para 4.920 cadeiras, na comparação entre 2014 e este ano. Já os ministrados nas escolas estaduais tiveram o número de vagas reduzidos de 8.840 para 3.225. As opções de cursos também caíram, assim como os municípios atendidos.

A Secretaria de Estado de Educação (SEE), que controla as inscrições no programa, justifica que o Ministério da Educação (MEC) fez uma revisão nos critérios de alocação de vagas em todo o país para “otimizar a oferta” e levou em conta o tamanho dos municípios, as taxas de evasão, entre outros critérios. Segundo a SEE, cerca de 6 mil cadeiras não foram preenchidas.

Os cursos em instituições parceiras têm inscrições abertas até segunda-feira. Já os vinculados às escolas estaduais ocorrem entre os dias 17 e 20. A estudante do 1º ano do Instituto de Educação de Minas Gerais Juliana Vicente, de 15, tem interesse em ingressar no Pronatec, mas não sabe se conseguirá. “Aqui na escola são poucas vagas. Eu acho que quem tem curso técnico é mais fácil encontrar emprego”, diz. (FA)


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