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Estado de Minas

Plano Brasil Sem Miséria não atendeu moradores de grandes Centros

Plano não enxergou nem mesmo uma parcela da população miserável que vive próximo aos centros de decisão política e está fora do cadastros dos programas sociais


postado em 11/12/2011 07:16 / atualizado em 11/12/2011 07:25

Francisca nasceu num 7 de setembro, há 62 anos. Ia se chamar Independência, mas a mãe desistiu da ideia. A catadora de papel trabalha há 25 anos nos fundos do Senado, num acampamento miserável. E nunca quis assistir às comemorações do Dia da Independência na Esplanada dos Ministérios, a poucos metros dali. “Eu não acho bonito. Acho bonito o desfile do Nordeste.” Francisca não sabe sua idade, nem o nome da cidade onde nasceu. Na carteira de identidade, cuidadosamente guardada por ela, estão os registros de sua existência: Francisca Pedro da Silva, nascida em Cajazeiras, na Paraíba, em 7 de setembro de 1949.

O Estado de Minas esteve pela primeira vez com Francisca nos primeiros dias de janeiro, para uma reportagem sobre as famílias extremamente pobres situadas no quintal da presidente Dilma Rousseff. O jornal mostrou a realidade de pessoas que se instalaram a poucos metros dos centros de decisão política, como o Congresso Nacional, o Palácio da Alvorada, o Palácio do Jaburu e a Granja do Torto – onde está a residência oficial adotada por Dilma na transição de governo e no início do mandato. Nos percursos da presidente por Brasília, essas famílias lembram a urgência do compromisso de erradicação da miséria. Na semana passada, o EM voltou aos mesmos lugares e constatou que a ação do Estado ainda é uma utopia. Ninguém apareceu. A situação é ainda mais dramática.

Em janeiro, a principal preocupação de Francisca na invasão da garagem do Senado era amealhar uma quantidade de papel branco suficiente para garantir o dinheiro das refeições básicas. Hoje, a dificuldade da catadora de papel é a mesma, com um agravante: “Os ‘pedreiros’ não me deixam juntar papel.” “Pedreiros” são usuários de crack, a droga que tomou conta da invasão aos fundos do Senado. Francisca não quer ver os netos nem um dos filhos na invasão. Segundo ela, seus familiares trocam até as panelas pelo crack. “Um filho meu é ‘noiado’, me dá muito trabalho. E não coloquem meus netos na minha frente. Eles vivem me roubando.”

A invasão está menor. O mato alto toma conta de boa parte do espaço, ocupado por menos famílias, praticamente todas elas ligadas a Francisca. As filhas que não vivem na invasão têm procurado mais a mãe. “Quando a fome bate, elas aparecem”, diz Francisca. No primeiro ano do Brasil Sem Miséria, o poder público não enxergou a catadora de papel. Ela diz não ter sido procurada por nenhum agente público e não ter recebido nenhum tipo de benefício, como o Bolsa-Família. “Se eu recebesse dinheiro do governo, não estaria nesse inferno.” Juntamente com a carteira de identidade, Francisca – que já trabalhou como empregada doméstica – guarda sua carteira de trabalho. O documento está vazio. Nunca foi assinado.

Onde está a pobreza extrema?

Uma das principais estratégias do Plano Brasil Sem Miséria é o serviço de busca ativa, que objetiva encontrar famílias extremamente pobres que desconhecem a existência de assistência pelo Estado. É o caso, por exemplo, das famílias localizadas pelo EM a poucos metros dos centros de decisão política. O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) sustenta que as novas inclusões no Bolsa-Família se deram a partir da busca ativa.

Sobre as ações para as quais já existem créditos especiais, o MDS se limitou a informar que “os créditos ainda estão na fase de empenho”. Os dados do balanço do plano neste primeiro ano de governo serão divulgados sexta-feira, no Palácio do Planalto, com a presença da presidente Dilma Rousseff.

Para o diretor de Estudos e Políticas Sociais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Jorge Abrahão de Castro, uma avaliação precisa dos resultados do Brasil Sem Miséria só será possível no próximo ano. “Algumas ações demoram mais para dar resultado. O mais importante é que não houve nenhum tipo de descontinuidade da política social.” Jorge diz que um ponto positivo do plano é a busca ativa. “Cerca de 800 mil pessoas precisam ser encontradas pela busca ativa e inscritas no programa.”

Outro ponto que deve ser prioritário, segundo o professor de política social da Universidade de Brasília (Unb) Perci Coelho de Souza, é a garantia de que os 28 milhões de brasileiros que deixaram a pobreza extrema nos últimos anos permaneçam na posição conquistada. “Se diminuírem os investimentos em educação, saúde e assistência, esses grupos podem voltar à miséria absoluta.”


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