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Estado de Minas

Família de menino raptado pelo Exército no Araguaia ficou marcada para sempre

Uma ferida que ficou para sempre


postado em 22/09/2013 06:00 / atualizado em 23/09/2013 14:12

Juraci mostra a mão direita com os dedos queimados que a mãe considera como prova de que ele é seu filho(foto: Alessandra Mello/EM/D.A Press )
Juraci mostra a mão direita com os dedos queimados que a mãe considera como prova de que ele é seu filho (foto: Alessandra Mello/EM/D.A Press )

Juracir Bezerra da Costa, de 48 anos, também filho de dona Maria Bezerra de Oliveira, foi levado de São Geraldo do Araguaia com 8 anos, em 1972, mesmo ano em que carregaram Miraci, seu irmão. Ele não se lembra ao certo das circunstâncias em que partiu e tem dúvidas sobre sua história verdadeira. Para Maria Bezerra, porém, não há dúvidas de que o menino, segundo ela, iludido pelos militares, e que reapareceu em sua vida 25 anos depois, é seu filho. A prova é uma queimadura na mão direita que deixou os dedos dele unidos. Segundo ela, Juracir era pequeno quando colocou a mão na brasa. Ela se lembra do nome completo do sargento que levou Juracir para ser mateiro e depois para Fortaleza: Antônio Essílio de Azevedo Costa. Ele servia, conta ela, na mesma unidade que o sargento João Lima Filho, que levou Miraci.

Em Fortaleza ele foi registrado como se fosse filho de Essílio com dona Maria, mas nascido em outra data e ano. Juracir veio ao mundo em 23 de setembro de 1964 e é filho de Raimundo Mourão de Lira com dona Maria Bezerra, conforme registro de batismo arquivado na Diocese de Conceição do Araguaia. No cartório, sua data de nascimento é 12 de novembro de 1966.

Em 1997, Juracir abandonou a mulher e as filhas que moravam em Fortaleza e partiu para a região do Araguaia em busca da família verdadeira. Como foi levado maiorzinho, ainda tinha vaga lembrança das origens e uma informação importante registrada em sua certidão: seu local de nascimento, o município de Xambioá (TO), na época pertencente a Goiás. Chegou primeiro a Araguaína (TO) e foi acolhido por uma família, que, segundo conta, acreditava ser ele um filho que teria sumido durante a guerrilha. Depois se mudou para a casa de Pedro Martins, de 74, em Piçarra, na margem do rio do lado paraense. É que sua história correu a região e ele começou a ser tratado como se fosse filho do lendário guerrilheiro Osvaldão, que teve um romance com Maria Vieira da Conceição, conhecida na região como Maria Xambaria. Perseguida pelo regime militar por causa de seu romance com o militante, Maria Vieira perdeu todos os cinco filhos. Os maiores desapareceram no mundo, o caçula, apontado como filho de Osvaldão, foi levado pelos militares, e um deles, José Vieira, foi adotado por Pedro Martins.

Mas, como não havia provas do parentesco e a idade de Juracir não batia com a chegada do militante comunista à região – Osvaldão apareceu na região em 1967, quando ele já tinha 3 anos –, continuou em busca da família. Por causa do nome na carteira de identidade acabou encontrando dona Maria Bezerra, mas o tempo já havia separado os dois.

Homens de Farda

Em 2005, quando se intensificaram as buscas e o levantamento das histórias dos camponeses vítimas do Araguaia, foi aberto um processo para recebimento de indenização no Ministério da Justiça. Nele, Juracir foi apresentado como se fosse filho de Osvaldão e por causa disso sequestrado pelos militares. Os ferimentos em sua mão direita foram descritos como se tivessem sido feitos por integrantes do Exército.

Dona Maria rechaça toda a história. Segundo ela, Juracir foi “encantado pelos homens vestidos de uniforme e armados” e os guiava pelo meio da mata. “Um dia, voltando da escola, ele deu com os soldados na beira do rio. Desde então ia da escola direto para a base. Nisso, o Essílio ficou amigo do menino e sempre me pedia: ‘Dona Maria, me dê esse menino’. ‘Não dou não. Só tenho dois meninos grandes e ele me serve muito, quebra coco, carrega água. São eles que me ajudam. E o Juracir ainda tem uma mão defeituosa’. ‘Me dá ele que eu mando operar’, prometia.” A mãe não deu, mas o menino, segundo ela, se rebelou e partiu com Antônio Essílio. Chegou a ficar 30 dias, segundo ela, embrenhado na mata. Hoje vive de favor em uma cabana de palha, em São Geraldo, sem direito a aposentadoria por invalidez, por causa da burocracia na papelada e também por falta de documentos de quitação com o serviço militar. Seu processo de indenização, cheio de equívocos e informações incorretas, também está parado no Ministério da Justiça. (AM)


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