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Estado de Minas PATRIMÔNIO

Leilão na internet evidencia risco ao patrimônio cultural

Oferta de peça classificada como barroca expõe necessidade de reforço em ações para proteger bens do comércio clandestino. Mas desta vez, era só uma cópia


28/07/2020 06:00 - atualizado 28/07/2020 12:04

Esculturas de anjos resgatados pelo Santuário Arquidiocesano de Santa Luzia, em movimento que marcou a história da preservação do patrimônio de Minas (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press - 12/7/17)
Esculturas de anjos resgatados pelo Santuário Arquidiocesano de Santa Luzia, em movimento que marcou a história da preservação do patrimônio de Minas (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press - 12/7/17)


À primeira vista, aos olhos leigos, parece uma peça esculpida por algum dos artistas que fizeram o esplendor do Barroco mineiro. Mas, quando examinada pelos especialistas, a história não é tão fiel assim. E pode confundir, tipo "gato por lebre". No leilão programado para a noite de ontem, no Rio de Janeiro (RJ), com lances apenas on-line devido à pandemia do novo coronavírus, um dos destaques estava, conforme o material de divulgação, na "imponente escultura barroca de um menino, em madeira policromada, século 18, altura de 105cm". Valor: R$ 42 mil.
 
No entanto, ao analisar as fotos do objeto, a equipe de restauradores da superintendência em Minas do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) notou traços grosseiros e enxergou muito mais uma cópia do que um original, embora sejam necessárias análises, com exames técnicos e científicos. Se a manga da veste é quadrada – "evidência de algo malfeito"–, a sandália tem cano de bota, a pátina (envelhecimento) é nova e a talha não tem movimento. Segundo os organizadores do leilão (o repórter não se identificou como jornalista, mas como um interessado em arte), não há um laudo detalhado a respeito da escultura, sendo a avalição própria dos donos do antiquário. Dessa forma, tudo transcorre numa relação de "confiança" entre o comerciante e o comprador.
 
A situação ocorre 17 anos após a grande campanha deflagrada em Minas para valorização do patrimônio cultural, notadamente a fim de impedir furtos de igrejas, capelas, museus, prédios públicos e outra locais. Por coincidência, tudo começou num leilão no Rio – naquela época, 2003, foram resgatados os três anjos do Santuário Arquidiocesano de Santa Luzia, na Grande BH, por meio de ação ajuizada pela Associação Cultural local e cumprida pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha). Se desta vez não se torna necessário retirar a peça do pregão, fica evidente a necessidade de manter viva a campanha, acredita a superintendente do Iphan, Débora do Nascimento França. Além da fiscalização no comércio, para impedir o tráfico de peças sacras sem documentação, Débora destaca a importância do corpo técnico. "Com restauradores capacitados, podemos verificar se há adulteração de obras e ter maior controle", afirma.
 

Minas procura


Conforme o último levantamento do Ministério Público de Minas Gerais, por meio da Coordenadoria das Promotorias de Justiça do Patrimônio Cultural e Turístico de Minas Gerais (CPPC), que tem como titular a promotora de Justiça Giselle Ribeiro de Oliveira, há, do patrimônio mineiro, 742 peças desaparecidas e 539 judicializadas. Em 17 anos da campanha, foram apreendidas 419, incluindo imagens, castiçais, sinos, partes de altares e outros bens.
 
Na lista, que contém objetos desaparecidos desde 1848, há muitas peças atribuídas a Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814), o “mestre do barroco”. As apreensões se tornaram fruto de apreensões do MPMG, polícias Federal, Militar e Civil ou entregues espontaneamente. O objetivo do MP é devolver as peças aos locais de origem, por serem objetos de devoção das comunidades e patrimônio cultural das cidades.

História e fé


Quem chega ao Santuário Arquidiocesano de Santa Luzia, que adota um esquema especial para missas presenciais nesse tempo de pandemia, pode ver dois anjos ladeando a tarja do arco-cruzeiro e outro, o do sepulcro, no coroamento do altar de Nosso Senhor dos Passos – é bom ressaltar que essas peças teriam sido vendidas, e não roubadas. Para especialistas, a história da preservação do patrimônio cultural de Minas tem um divisor de águas caudaloso: a mobilização em Santa Luzia, na Grande BH, se propagou em todo o estado e as comunidades passaram a lutar pela volta de obras de arte e de peças sacras desaparecidas, ao longo do tempo, de igrejas, capelas, museus e prédios públicos.
 
Foi um grito contra o furto de peças sacras e outras obras de arte que movimentam o comércio clandestino. De acordo com a Interpol, só é superado, no mundo, pelo de drogas e armas. De forma pioneira, Minas passou a ter uma política específica para a preservação do acervo histórico, algo inédito no país, contando com a participação de instituições públicas e privadas. Outro setor que ganhou força foi o de educação patrimonial, disseminado de forma ampla na capital e no interior e com resultados positivos entre os jovens, disse ao EM o promotor de Justiça da comarca de Santa Luzia, Marcos Paulo de Souza Miranda. Na época, começaram a trabalhar de forma integrada as secretarias estaduais da Cultura e da Defesa Social, Iepha, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), polícias Federal, Militar e Civil, ministérios públicos Federal (MPF) e de Minas Gerais (MPMG), Igreja, Associação das Cidades Históricas e outros.
 
Em matérias diárias, a equipe de jornalistas do EM denunciou a dilapidação dos templos barrocos, divulgando, igualmente, ações positivas, do poder público ou da comunidade, para garantir a integridades dos tesouros mineiros. Numa iniciativa do MPMG, foi criado um serviço de inteligência, com banco de dados, para localizar e identificar peças sumidas, enquanto a Interpol faz um rastreamento internacional.

Faça contato


Qualquer informação sobre as peças desaparecidas deve ser comunicada aos órgãos competentes. Veja como acioná-los

Ministério Público de Minas Gerais, via Coordenadora das Promotorias de Justiça de
Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico (CPPC): pelo telefone (31) 3250-4620, pelo e-mail seccultural@pmmg.mp.br ou carta para Rua Timbiras, 2.941, Bairro Barro Preto, Belo Horizonte, CEP 30.140-062

Iphan: pelos telefones (31) 3222-2440 / (61) 2024-6342 / (61) 2024-6355 / (61) 2024-6370 ou pelos e-mails depam@iphan.gov.br, cgbm@iphan.gov.br e faleconosco@iphan.gov.br

Iepha: pelos telefones (31) 3235-2812 e (31) 3235-2813 ou pelo e-mail www.iepha.mg.gov.br


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