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Estado de Minas COVID-19

Como as fakes news prejudicam a luta contra o coronavírus

Com rápida propagação pelas redes sociais, notícias falsas afetam a confiança nas instituições científicas e nas políticas públicas, reforçando sentimentos negativos como ódio, raiva e medo


17/05/2020 04:00 - atualizado 17/05/2020 09:28

(foto: Prefeitura de Araçuaí/Divulgação)
(foto: Prefeitura de Araçuaí/Divulgação)
Com seu visual característico, composto por um chamativo chapéu de caubói, o pastor Valdemiro Santiago, da Igreja Mundial do Poder de Deus, comemora a cura de um suposto caso grave do novo coronavírus. Durante o vídeo, cuja retirada do YouTube foi determinada pelo Ministério Público Federal (MPF), o religioso atribui a melhora do paciente a uma semente de feijão, plantada em um vaso. Em troca do grão, Valdemiro pede um “propósito”, doação cujo valor sugerido por ele é de R$ 1 mil.

Como a fake news disseminada por Valdemiro, supostas curas milagrosas para a COVID-19 têm ganhado corpo nas redes sociais. No WhatsApp, mensagem já desmentida pelo Ministério da Saúde dizia que um chá composto por limão e bicarbonato de sódio podia sarar a infecção. Segundo o texto, que viralizou no aplicativo de mensagens em abril, a bebida era responsável por impedir a aceleração do contágio em Israel.

“Os órgãos de saúde e as sociedades científicas estão atentas a tudo. Se houver alguma novidade benéfica à população, os órgãos de saúde e as sociedades médicas serão os primeiros a divulgar. Se isso não foi aprovado ou divulgado por uma entidade médica, não tem nenhum valor científico”, alerta o presidente da Sociedade Mineira de Infectologia e integrante do comitê de enfrentamento à doença criado pela Prefeitura de Belo Horizonte Estevão Urbano.

Para combater as notícias falsas em tempos de pandemia, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) criou a força-tarefa Amerek, grupo com o objetivo de abastecer a população com informações confiáveis sobre o vírus. De acordo com o sociólogo Yurij Castelfranchi, professor da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (Fafich) da UFMG e membro da força-tarefa, a checagem é a melhor receita para evitar a desinformação.

“A principal dica é: escolha as fontes em quem confiar. Essas fontes são as instituições. Não é um cientista, um político ou uma pessoa famosa. São as instituições. O mecanismo de uma universidade ou de um grupo de cientistas, por exemplo, é de se criticar entre si. Então, o que sai das instituições é um conhecimento muito mais sólido, pois foi avaliado, verificado e questionado por dezenas de cientistas, que pertencem a todos os grupos, que acreditam em visões políticas diferentes e são de religiões diferentes”, ressalta, frisando que as notícias falsas podem ser espalhadas, inclusive, por pessoas de boa fé.

Há, no YouTube, um vídeo que visa a desestimular a utilização de máscaras faciais. Na gravação, um homem — creditado, no título da publicação, como Daniél Rocha — diz que o equipamento diminui a imunidade dos usuários. Ele chega a afirmar, inclusive, que as máscaras facilitam a proliferação de bactérias e atrapalham a oxigenação do corpo.

Segundo Estevão Urbano, falas que colocam em xeque a eficácia de instrumentos comprovadamente importantes no combate à doença, como a higienização das mãos e o uso das máscaras, são altamente prejudiciais. “Isso só desmobiliza a população. Os erros aumentam e os casos também”, salienta.

(foto: WhatsApp / Reprodução %u2013 2/5/20)
(foto: WhatsApp / Reprodução %u2013 2/5/20)


Negacionismo Fake news que subestimam a letalidade do coronavírus também têm sido propagadas internet afora. A vendedora Valdete Pereira Zanco gravou um vídeo com acusações de caixões enterrados com paus e pedras nos cemitérios de BH. A notícia falsa viralizou nas redes sociais e motivou a abertura de investigação pela Polícia Civil. No dia 6, quatro dias após a corporação anunciar a caça à autora do boato, Valdete divulgou novas imagens com o objetivo de se retratar. Ela prestou depoimento em uma delegacia no município de Campanha, no Sul de Minas.

Em nota divulgada após o pedido de desculpas, o advogado de Valdete, Alexsander Ribeiro, alegou que sua cliente viu, no Facebook, uma publicação sobre supostos enterros falsos em Belo Horizonte. A gravação foi feita logo depois que ele atendeu uma cliente que fez comentários sobre o assunto.

No entanto, engana-se quem pensa que apenas anônimos fizeram viralizar notícias falsas sobre o número de óbitos por COVID-19. No último dia 30, a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) disse, durante entrevista à Rádio Bandeirantes, que caixões vazios estavam sendo enterrados no Ceará. Devido à declaração, o governo local resolveu processar a parlamentar, uma das mais fiéis aliadas do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no Congresso Nacional. Ao rebater reportagens sobre o tema, Zambelli não desmentiu a declaração, mas justificou ter recebido fotos dos caixões de dois cidadãos. Ela pontuou, ainda, que a imunidade parlamentar garante o direito de fazer denúncias sem a revelação de fontes.

Campanhas contra as notícias falsas, como a da Prefeitura de Araçuaí, tentam barrar mentiras divulgadas na internet, como as histórias sobre caixões enterrados com pedras, contada por Valdete Zanco(acima), e vazios, como disse a deputada Carla Zambelli(foto: Michel Jesus/Câmara dos Deputados %u2013 3/2/20)
Campanhas contra as notícias falsas, como a da Prefeitura de Araçuaí, tentam barrar mentiras divulgadas na internet, como as histórias sobre caixões enterrados com pedras, contada por Valdete Zanco(acima), e vazios, como disse a deputada Carla Zambelli (foto: Michel Jesus/Câmara dos Deputados %u2013 3/2/20)


“As fake news são construídas para despertar algumas emoções básicas primárias, viscerais, principalmente ódio, medo, raiva, indignação ou nojo e, em alguns casos, esperanças de uma cura milagrosa. Mas, principalmente, elas despertam emoções negativas, que aumentam a raiva que as pessoas têm pelo grupo rival, pelo adversário, o que aumenta a desconfiança nas instituições, no governo ou nos cientistas”, explica o professor Yurij Castelfranchi.

Post ocultado

O deputado estadual cearense André Fernandes (PSL) publicou um quadro com números comparando as mortes por problemas respiratórias ocorridas no estado em 2019 e este ano. O post dizia que 6,3 mil pessoas foram mortas por essas doenças no ano passado, ante 6,2 mil em 2020. Nos stories de sua conta no Instagram, o presidente Jair Bolsonaro repercutiu o levantamento, mas teve a publicação ocultada pela rede social.

A Agência Lupa, responsável por checar os dados publicados por usuários da plataforma, informou que os números incluem mortes em decorrência de outras doenças. Por isso, o Instagram colocou um “alerta de fake news” no post original e em todos os compartilhamentos, como o do presidente.

Fernandes refez a postagem no dia seguinte, eliminando do texto a menção às doenças respiratórias. O Portal da Transparência — Registro Civil, fonte da informação, contudo, esclareceu que os dados são defasados, visto que demoram alguns dias para chegar à ferramenta, em conformidade com os prazos legais.


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