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Estado de Minas SAÚDE

Os perigos do autodiagnóstico e da automedicação pela internet diante do novo coronavírus

Pelo fato de os sintomas do COVID-19 serem similares aos de uma gripe, a automedicação descontrolada pode agravar o quadro, além de afetar outras doenças


postado em 20/04/2020 04:00 / atualizado em 20/04/2020 14:54

Clínico Erickson Gontijo desenvolveu aplicativo de monitoramento em tempo real de temperatura e de sinais e sintomas de COVID-19(foto: Gláucia Rodrigues/Divulgação)
Clínico Erickson Gontijo desenvolveu aplicativo de monitoramento em tempo real de temperatura e de sinais e sintomas de COVID-19 (foto: Gláucia Rodrigues/Divulgação)


Coriza, tosse, dor de cabeça, febre, moleza, desânimo... Quem já não sentiu estes sintomas e correu para o Dr. Google? Está tudo lá. O que fazer? O que pode ser? Como agir? Qual medicamento indicado? Com diagnóstico em segundos, ppr que consultar um médico? Em plena pandemia do novo coronavírus, que tem sinais bem parecidos com o da gripe, o risco do autodiagnóstico e da automedicação pela internet é real, ocorre a todo momento e é muito grave.

Se você se identificou é porque pertence ao grupo dos 40,9% de brasileiros que fazem autodiagnóstico pela internet. Desses, 63,84% têm formação superior. Os dados são do Instituto de Ciência, Tecnologia e Qualidade (ICTQ), entidade de pesquisa e pós-graduação na área farmacêutica. Na pesquisa anterior, de 2016, o índice de autodiagnóstico on-line foi de 40%.

O otorrinolaringologista Alexadre Rattes avisa para quem deposita tanta confiança no "Dr.Google" que "informação é diferente de conhecimento" e que "a pergunta de um médico faz mudar todo um diagnóstico. Portanto, não deixe de procurar seu médico, pare de resolver as coisas por conta própria. Com a internet todos viraram especialistas... Especialista em consertar geladeira, fogão e saúde".

Alexadre Rattes alerta que neste histórico de automedicação e autodiagnóstico, a consequência é "gerar um problema maior". O médico destaca que, o que tem percebido desde a chegada da pandemia do novo coronavírus, é que "os pacientes estão com medo de ir ao hospital, a um consultório ou procurar pelo médico, o que ficou muito ruim".
 
O médico revela um caso que teve de lidar há poucos dias: "Um paciente jovem, com quadro de febre, por telefone foi medicado e teve pedido de um raio-x do tórax. Estava com pneumonia, tomou antibiótico e não melhorou. Então, entrou em contato comigo, falei que pelo tempo precisava de uma tomografia e de um hemograma. Não queria sair de casa, que o pai achava melhor não sair, com medo. Disse que eu não estava aconselhando, mas dizendo o que teria de fazer porque tinha 95% de chance de estar com COVID-19. Pedi até para ligar para outro médico e confrontar minha decisão. O medo era tão grande que o paciente nem conseguia falar o nome da doença, dizia 'aquela doença'. No fim, chegou a ir para  UTI, o pai também foi internado, mas se recuperaram".

Aliás, Alexandre Rattes chama a atenção para esta mudança de comportamento: "Muitos pacientes já não falam coronavírus, COVID-19, mas 'aquela doença'. Outro sinal do medo".
 
O otorrinolaringologista Alexandre Rattes avisa que informação é diferente de conhecimento (foto: Arquivo Pessoal)
O otorrinolaringologista Alexandre Rattes avisa que informação é diferente de conhecimento (foto: Arquivo Pessoal)
Para Alexandre Rattes, o que está acontecendo é "a negação. O pavor tomou conta da população e ela tem tomado atitude que não tomaria em situação normal. Se enganam, 'ah é uma febre baixa', 'não estou nem tossindo'. É a negação confrontando com a realidade, que é um ingrediente a mais neste cenário. O pânico gerou a negação e, agregado a isso, o temor de procurar um pronto atendimento e mesmo pelos médicos. Atendi a um paciente que chegou com um amigdalite em estado tão ruim, que poderia tê-lo perdido em 24h. Ele já caminhava para uma sepse. E outro caso de cera que virou infecção. O autodiagnóstico complica com a negação que, como descreve a psicanálise, na sequência terá a aceitação e depressão, ao ter confirmada a doença".
 
O otorrinolaringologista conta que contiua atendento, não parou, mas os pacientes sumiram do consultório: "Primeiro que médico que tem medo de doença não pode ser médico. Temos 15, 20% dos consultórios acessíveis, mas é incrível que em três semanas atendi ao número de pacientes de um dia normal de trabalho. É preciso procurar pelo médico, estamos aqui." 

O lado positivo da tecnologia 
 

O clínico Erickson Gontijo enfatiza que sempre alertou seus pacientes sobre os riscos de consultar o Dr. Google para se autodiagnosticarem e, principalmente, se automedicarem. "A internet traz muita informação boa, mas também muita fake news e conteúdos que não fazem sentido para leigos. Entretanto, vivemos um momento delicado. Com o avanço da pandemia do novo coronavírus, nós, profissionais da saúde, estamos fazendo o possível para evitar o colapso do sistema de saúde público e privado e uma das medidas que adotamos com o apoio da imprensa é a divulgação de informações corretas."

No caso específico da pandemia, Erickson Gontijo destaca que a internet pode contribuir de forma positiva auxiliando o paciente a identificar se os sintomas que ele está sentindo são critérios para ir até um hospital, posto de saúde ou UPA. "Pensando no potencial da internet em conectar pessoas com profissionais de saúde e com informações corretas, o Ministério da Saúde lançou o app Coronavírus-SUS com o objetivo de conscientizar a população. Para isso, o aplicativo conta com as seguintes funcionalidades: informativos de diversos tópicos como os sintomas, como se prevenir, o que fazer em caso de suspeita e infecção e etc".

Como médico e gestor de saúde domiciliar, Erickson Gontijo fala da experiência positiva que tem vivido com o apoio da tecnologia: "Desenvolvi um aplicativo de monitoramento de sintomas para um grupo de pacientes e familiares para avaliação em tempo real de temperatura e de sinais e sintomas de COVID-19. A experiência foi exitosa e hoje estamos aplicando a ferramenta em uma cidade do interior de Minas, alguns comércios da capital mineira, clínicas, pacientes domiciliares, pacientes particulares e em uma grande mineradora multinacional."

O clínico explica que, por meio do autodiagnóstico, "conseguimos acompanhar em tempo real se há no nosso grupo sinais e sintomas de gravidade e esses, sim, são contactados e avaliados por médicos especializados. Ressalto que esta abordagem foi possível por meio da análise do nosso público-alvo e devido ao treinamento dos usuários."

Erickson Gontijo avisa que os sinais leves podem e devem ser tratados em casa, os sinais moderados e graves devem ser avaliados por uma equipe de saúde. "Não podemos perder vidas para situações que podem ser controladas."


A importância do autocuidado

 
Para o oncologista clínico Bruno Muzzi, do Cetus Oncologia, o acesso ao Dr.Google ocorre pelo imediatismo das pessoas, principalmente os jovens, que têm mais acesso aos meios digitais. Aliás, pesquisa mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de novembro de 2019, aponta que 79,9% da população vive em lares com internet fixa ou móvel. Isso quer dizer que 166 milhões de brasileiros já têm algum acesso à rede. "Logo, fica mais fácil obter informação de todo e qualquer tipo", ressalta.

Oncologista Bruno Muzzi destaca a importância do autocuidado, de ter atenção ao sinais do corpo(foto: Arquivo Pessoal)
Oncologista Bruno Muzzi destaca a importância do autocuidado, de ter atenção ao sinais do corpo (foto: Arquivo Pessoal)
O perigo, porém, mora no risco que o autodiagnóstico traz consigo, principalmente por causa da pandemia do novo coronavírus. "Na internet qualquer um pode receber a chancela de ‘médico’ e escrever sobre tudo, sem necessariamente ter conhecimento técnico/acadêmico sobre o que está falando. Algo que é lido na web, e que não é verdade, pode até mesmo gerar pânico no paciente. Com isso, ele pode acreditar erroneamente que seu caso é mais grave do que parece ou o contrário, que seu quadro é leve e sem riscos, sendo que na verdade a situação é oposta".

Pelo fato de os sintomas do COVID-19 serem similares aos de uma gripe, Bruno Muzzi acrescenta que o melhor a fazer é seguir as recomendações do Ministério da Saúde: "O que o paciente não pode fazer é ignorar esses protocolos e partir para a automedicação descontrolada por achar que somente os remédios de sua caixa de primeiros socorros conseguem reverter seu quadro".

Bruno Muzzi deixa deixa claro que a tecnologia pode ser uma aliada do paciente, desde que bem usada. "O que não pode ocorrer é a figura humana do profissional de saúde ser inteiramente substituída por mecanismos de buscas como o Google. É o médico quem deve tomar todas as condutas do tratamento do paciente, ou seja, norteá-lo".

O oncologista destaca que, embora a automedicação deva ser evitada, o mesmo não pode ser dito sobre o autocuidado com o corpo. "Alguns cânceres, por exemplo, podem dar sinais antes de se agravarem ou ainda em estágio inicial. Por isso, ao menor indício de mudanças no corpo, é crucial entrar em contato com o médico, mesmo que por telefone. E não esqueça de se tocar, de se autoexaminar, visto que neste período de confinamento está mais difícil sair de casa para as consultas de rotina".
 
 

Emergência x urgência x eletivo  

 
O clínico Erickson Gontijo avisa que, neste momento, é muito importante retomar os conceitos de urgência, emergência e eletivo. E alerta que "a famosa dor no peito que pode ser angústia e tristeza, também pode ser infarto e cada minuto de espera significa um ponto a mais para a morte contra a vida." 

Por isso, a sugestão de Erickson Gontijo neste período é para que "não seja negligenciado nem pelos pacientes e nem pelos meus colegas de saúde as diversas queixas da população, já que as doenças continuam assolando a população e devem ser tratadas. Caso contrário, estaremos diante de uma situação de COVID-19 e de uma pandemia de doenças que já conseguimos tratar com excelência mas que voltarão a matar diariamente." 

- Emergência: risco de morte e necessita de atendimento imediato. 
- Exemplos: parada cardiorrespiratória, politraumatizado, batida na cabeça, queimaduras, batidas no tórax, barriga ou cabeça com perfuração, convulsão cerebral, fechamento de via garganta, ferimento extenso, amputação e fratura com deformidade ou sangramento.

- Urgência: risco à saúde e precisa de atendimento breve.
- Exemplos: vítima de agressão, abuso sexual, mordeduras, ferimentos sangrantes, hemorragias, cólica renal, crise de asma, gestantes de alto risco, dor, febre que não cessa.

- Eletivo: situações controladas e podem ser agendadas.
- Exemplos: rastreios, exames de controle anual, procedimentos estéticos, renovação de receitas – se não comprometer o tratamento, e outros. 


Onde buscar informação segura

 
Para quem não abre mão de buscar informações sobre doenças na internet, a melhor opção é recorrer aos grandes portais, que têm credibilidade, além dos canais oficiais da medicina.

- Ministério da Saúde: 
https://saude.gov.br/

- Conselho Federal de Medicina: 
https://portal.cfm.org.br/

- Associação Médica Brasileira: 
https://amb.org.br/

- Prefeitura de Belo Horizonte: https://prefeitura.pbh.gov.br/

- Secretaria Municipal de Saúde:  https://prefeitura.pbh.gov.br/saude 
 
- Secretaria Estadual da Saúde: https://www.saude.mg.gov.br/ 
 
- Associação Médica de Minas Gerais: https://ammg.org.br/  
 


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