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Estado de Minas RECONSTRUÇÃO

Amostras de lama são recolhidas em Santa Luzia para verificar boato de contaminação

Município lida, desde sábado passado, com os estragos provocados pelo Rio das Velhas


postado em 01/02/2020 06:00 / atualizado em 01/02/2020 07:44

Sujeira carregada pelo Velhas. População ficou preocupada com boatos que circularam em redes sociais sobre presença de rejeitos de minério(foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press )
Sujeira carregada pelo Velhas. População ficou preocupada com boatos que circularam em redes sociais sobre presença de rejeitos de minério (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press )
Mesmo tendo passado por outros momentos de aflição em enchentes que se repetiram ao longo de décadas, os moradores de Santa Luzia, atingidos pela cheia do Rio das Velhas na madrugada do sábado passado, estão assustados com a quantidade de barro e rejeitos de minério que invadiram casas, terrenos e ruas dos bairros às margens do curso d'água. Os boatos que correm na cidade da Grande BH é que uma mineradora aproveitou as fortes chuvas para despejar rejeitos no leito do rio ou que uma represa abriu suas comportas para dar vazão à quantidade de água acumulada.
A irmã Maria Helena, do convento de Macaúbas, em Pinhões, local que acolheu desabrigados, disse que “circulou a notícia de que as comportas de uma represa seriam abertas, mas nada foi confirmado oficialmente”. A fazenda de propriedade do convento foi atingida. O gado ficou ilhado e uma vaca morreu quando paria, ao ser picada por uma cobra. Moradores do entorno tiveram a ajuda das irmãs para salvar crianças e pertences.

Na Avenida Raul Teixeira da Costa, que liga o Centro Histórico à Cidade Baixa, contornando os bairros centrais, o trecho construído, segundo moradores, há menos de uma década teve parte de sua extensão interditada e a lama ultrapassa os muros de contenção em quase um metro de altura, além de provocar o desabamento das laterais do canal. O trabalho de limpeza é incansável e em alguns pontos a previsão é de que dure ainda mais alguns dias para que as casas se tornem habitáveis.

“O que mais me impressionou foi que, apesar de a enchente ter sido menor que a de 1997, naquele ano a água era mais limpa. Agora foi muita lama, densa, com muito minério. Não sabemos até onde isso pode significar riscos à nossa saúde”, comenta o comerciante e atleta Reginaldo Alfredo Ferreira, de 64 anos, que mora no Bairro Moreira desde 1974. A região fica na entrada de Santa Luzia, para quem chega pela via Beira Rio, ligação entre a BR-381 e a parte histórica do município. Apesar de estar a 300 metros do leito do rio, a casa e o bar de Reginaldo foram atingidos, com a água chegando a 1,20m no interior da residência.

Ele e a esposa, Ângela Maria Rodrigues Ferreira, de 58, professora aposentada, tentam há uma semana limpar o imóvel. “Perdemos quase todos os móveis e roupas”, conta, mostrando uma centena de medalhas conquistadas em sua trajetória no atletismo. A esposa lamenta a perda de mil títulos de sua biblioteca, constituída ao longo da carreira no magistério.

O comerciante disse que houve um alerta no dia anterior e todos ficaram atentos. Entretanto, o leito do rio que havia subido começou a baixar e todos foram dormir, por volta das 23h da sexta-feira da semana passada.

Susto à noite Por volta da 1h de sábado, recebeu telefonema de um amigo que alertava sobre enchente no Bairro Borges, em Sabará, vizinho a Santa Luzia, nas imediações da ponte sobre o Rio das Velhas, na BR-381. Ao chegar ao portão, a água estava na calçada. “Em menos de meia hora já estava tudo tomado pela lama.” O prejuízo estimado é de R$ 8 mil. Ele contabilizou 27 carrinhos carregados de entulho e roupas perdidas na tragédia.

Em Pinhões, os moradores próximos ao rio estão sem previsão de quando tornarão suas casas habitáveis. A aposentada Fátima Augusta Francisco, de 63, deixou sua residência no Bairro Ribeiro de Abreu para ajudar os familiares na limpeza de suas casas. O imóvel pertence à mãe de Fátima, que morou por mais de 80 anos no local. “Ela viu muitas enchentes, inclusive a antiga casa foi tragada por um transbordamento no fim dos anos 1950”. Ontem, ela usava uma mangueira para tirar a lama de móveis e paredes. O irmão, Wagno Pereira dos Santos, de 50, pedreiro e pintor industrial, disse que contou com a ajuda de amigos e da comunidade para tirar inúmeros carrinhos de lama. “Eles levaram quase uma semana limpando o grosso da lama e agora estou aqui para ajudar na desinfecção”, comentou Fátima.

solidariedade Dona de uma casa de rações na entrada de Pinhões, Cleonice Cipriano, de 37, passou o fim de semana passado limpando a sujeira acumulada em sua loja. “A minha sorte foi a solidariedade da comunidade”, afirma. Às 6h de sábado, foi avisada por vizinhos sobre o risco para sua loja. “Foi o tempo suficiente de eu chegar e retirar as coisas e o rio subiu rapidamente”. O prejuízo ficou somente nos gastos com a limpeza do estabelecimento.

A solidariedade marcou e amenizou a tragédia deste ano no município. A presteza, a empatia da população fora das áreas de risco e a disposição em ajudar talvez tenham contribuído para que não houvesse vítimas de morte desta vez, lembra, emocionado, o pintor Wagno Santos. “Todos se ofereceram para ajudar na evacuação de pessoas com dificuldades de locomoção, a tirar objetos das casas e a limpar toda a sujeira posterior à inundação.”

Tanto Wagno quanto Reginaldo, moradores em lados opostos da cidade, fizeram questão de destacar os trabalhos de autoridades policiais e do município no alerta, limpeza e orientação aos habitantes das áreas em risco. Eles contam que logo após as águas baixarem, a prefeitura disponibilizou máquinas e caminhões-pipa para limpar as ruas, e todos foram orientados de como proceder a desinfecção de suas casas. Porém, em vários pontos o trabalho de remoção de entulhos e lama deverá durar um bom tempo. Sem levar em conta o tempo que levarão as obras de reconstrução de vias e prédios atingidos.

A loja de rações de Cleonice Cipriano foi invadida pela enxurrada. Últimos dias foram de faxina(foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press )
A loja de rações de Cleonice Cipriano foi invadida pela enxurrada. Últimos dias foram de faxina (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press )


Reginaldo Ferreira, morador de bairro na entrada da cidade, recorda de cheia no fim dos anos 1990(foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press )
Reginaldo Ferreira, morador de bairro na entrada da cidade, recorda de cheia no fim dos anos 1990 (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press )


A aposentada Fátima Augusta foi à cidade para ajudar a família a limpar a sujeira (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press )
A aposentada Fátima Augusta foi à cidade para ajudar a família a limpar a sujeira (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press )

Emergência em quase 200 municípios


Larissa Ricci, Cristiane Silva e Matheus Muratori

Chega a 196 o total de municípios mineiros em situação de emergência em função das chuvas deste início de ano, número que corresponde a 23% das cidades do estado (853). A atualização foi publicada ontem em uma edição extra do Minas Gerais, diário oficial do estado. De acordo com a Defesa Civil estadual, 95 municípios entraram na lista, entre eles os que haviam decretado de forma individualizada. Conforme o último boletim do órgão, também divulgado ontem, 55 pessoas morreram entre 24 e 30 de janeiro. Uma pessoa continuava desaparecida, mas o corpo foi localizado após a publicação do documento. Elas foram vítimas de soterramentos, desmoronamentos, enxurradas ou afogamento. O número de pessoas desabrigadas ou desalojadas é de 53.581.

O corpo da 56ª vítima das chuvas em Minas foi encontrado ontem por equipe de bombeiros em Conselheiro Lafaiete, Região Central de Minas. O homem, identificado como Valmir Gonçalves de Paiva, foi arrastado pelas águas na noite do dia 24. Desde o desaparecimento, as equipes de resgate faziam buscas ao longo das margens de cursos d'água da região.

O decreto de emergência nos municípios mineiros, assinado pelo governador Romeu Zema (Novo), é válido por 180 dias. Com a situação confirmada, as prefeituras poderão adquirir bens para atividades de resposta ao desastre sem fazer licitação, desde que as ações sejam concluídas no prazo. O presidente da República, Jair Bolsonaro, anunciou, na tarde de quinta-feira, durante visita a Minas, a liberação de R$ 1 bilhão para ações emergenciais em municípios afetados pelas chuvas em toda a Região Sudeste.

A verba deve ser dividida entre cidades mineiras, do Espírito Santo e do Rio de Janeiro. Bolsonaro anunciou a medida após sobrevoar seis cidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte, incluindo a capital mineira, e de se reunir com o governador Romeu Zema, sete ministros, seis prefeitos, deputados e outras autoridades municipais e estaduais.

DIFÍCIL RETORNO Em Coronel Fabriciano, também na Região Central de Minas, famílias vítimas da chuva começaram a voltar para suas casas ontem. Segundo dados do Comitê de Crise, 151 famílias foram desalojadas pelas chuvas no município, totalizando 420 pessoas. Uma pessoa morreu por afogamento no Bairro Mangueiras, no Rio Piracicaba. Entre 23 e 26 de janeiro, choveu 239 milímetros – 61% do volume esperado para janeiro em Fabriciano, estimado em 390 milíme- tros. Diante dos estragos e vários pontos de alagamentos, a prefeitura decretou situação de emergência com o objetivo de assegurar recursos para mão de obra e materiais para contenção do desastre.

A prefeitura também segue com o mapeamento das áreas afetadas, reforço na limpeza de ruas, córregos, galerias de drenagem e bueiros, além de manter a operação tapa-buracos nos corredores viários. Outra ação foi o pedido de isenção da conta de água e taxa de esgoto da Copasa para as famílias que foram desalojadas pelas chuvas por um período de 90 dias.


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