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Estado de Minas CIDADANIA E CULTURA

Arte que liberta: presos reverenciam com origamis vítimas de tragédias

Exposição de origamis feitos por detentos homenageia vítimas de desastres com barragens em Minas, ao mesmo tempo em que representa para artistas uma janela para a ressocialização


postado em 11/08/2019 04:00 / atualizado em 11/08/2019 07:57

Suspensos, no chão ou numa árvore, há flores, borboletas, grilos, macaquinhos, ninhos, sapos entre cerca de mil peças produzidas ao longo de cinco meses(foto: JAIR AMARAL/EM/D.A PRESS)
Suspensos, no chão ou numa árvore, há flores, borboletas, grilos, macaquinhos, ninhos, sapos entre cerca de mil peças produzidas ao longo de cinco meses (foto: JAIR AMARAL/EM/D.A PRESS)

Asas da imaginação e liberdade para criar estão simplesmente “nas mãos” dos jovens Warley Matoso Coelho, de 19 anos, e Lucas Brendon de Assis, de 21. Na manhã de ontem, recebidos com palmas, os dois participaram da abertura da mostra Vidas interrompidas, no Museu Mineiro, na capital, em homenagem às vítimas de tragédias em barragens no estado.

 

Ao contrário do que possa pensar, Warley e Lucas não são artistas plásticos, mas detentos que cumprem pena e, junto com mais 38 internos do Centro de Remanejamento do Sistema Prisional (Ceresp), em Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), capricharam nos origamis, a tradicional arte japonesa de dobrar o papel. Suspensos, no chão ou numa árvore, há flores, borboletas, grilos, macaquinhos, ninhos, sapos entre cerca de mil peças produzidas ao longo de cinco meses, que dão leveza a episódios tão devastadores.

 

Com foco em Brumadinho, cujo rompimento da barragem do Córrego do Feijão ocorreu em 25 de janeiro, e Bento Rodrigues, em Mariana, distrito arrasado em 5 de novembro de 2015, a exposição remete também às cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, bombardeadas há 74 anos, em 6 de agosto de 1945. “Aprendi muito com os origamis, conheci histórias que nunca tinha ouvido.
 
Os origamis significam liberdade e, quando sair do presídio, quero vida nova”, afirmou Warley. Ao lado, olhando para o tsuru, ave sagrada no País do Sol Nascente e símbolo de boa sorte, saúde e felicidade, Lucas já faz planos: “Quem sabe me tornar um artesão?”. Com respeito, se lembrou das vítimas das barragens em Minas, “algo terrível”. Para retribuir o voto de confiança das autoridades, os jovens se concentraram no trabalho em Betim e vão ministrar oficinas, no museu, no período da exposição em cartaz até 29 de setembro.
 
Ambientada na Sala de Exposições Temporárias II do Museu Mineiro, no Circuito Liberdade, na Região Centro-Sul de BH, Vidas interrompidas é fruto da parceria da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública e Secretaria de Estado de Cultura e Turismo, por meio da Diretoria de Museus. Logo na entrada, os visitantes podem ver o triângulo da bandeira de Minas de forma bem diferente, conforme mostra Tatiane Lídia Costa, atual diretora de Atendimento da Penitenciária Professor Jason Soares Albergaria, em São Joaquim de Bicas – ela atuava no Ceresp de Betim quando os origamis foram feitos dentro do projeto Mãos pela Paz, em prática desde 2013 para “transformar a percepção de mundo de pessoas que cumprem pena”. O projeto foi desenvolvido pela assistente social da unidade prisional de Betim, Rosemary Ramos.
 
RENASCIMENTO “No contorno do triângulo, há flores vermelhas, em homenagem aos bombeiros, depois branco, para homenagear todos os voluntários, e, no centro, pretas, em sinal de luto pelas vítimas”, explicou Tatiane. O menino Davi Ursini Nascimento, de 8 anos, acompanhado do pai, João Batista Néris do Nascimento, preferiu o silêncio ao ficar alguns minutos diante do símbolo da bandeira. A assistente social e organizadora com Tatiane da oficina e mostra, Rosemary Ramos não escondia o entusiasmo. “O corpo está encarcerado, mas a mente livre para criar. Basta o papel e as mãos”, afirmou, com brilho nos olhos e contando que, nas oficinas, foram feitas cerca de 2 mil peças.
 
Mostra em exibição no Circuito Liberdade revela trabalho em arte de origem japonesa admirado por visitantes como João Batista e o filho Davi(foto: JAIR AMARAL/EM/D.A PRESS)
Mostra em exibição no Circuito Liberdade revela trabalho em arte de origem japonesa admirado por visitantes como João Batista e o filho Davi (foto: JAIR AMARAL/EM/D.A PRESS)
Comparando a exposição à metamorfose da borboleta, nas fases lagarta, casulo e depois com asas, Rosemary mostrou as demais partes da mostra. Em um telão, há projeção de imagens de rompimentos de barragens, e, num efeito cênico, um foco de luz sobre os origamis suspensos no alto, os pássaros, e embaixo, os peixes provoca sombras sobre as imagens de resgates no meio dos rejeitos. No meio, pode-se ver a árvore com as várias formas de dobraduras e significado de “renascimento”, informou a assistente social. Complementando a cena há registros de Brumadinho da fotógrafa Bárbara Ferreira.
 
De acordo com os organizadores, o projeto Mãos pela Paz nasceu para desenvolver a capacidade de concentração, raciocínio, memorização e persistência, além de contribuir com o processo de ressocialização dos detentos. Mas cresceu e frutificou e, assim, conforme os organizadores, “a exposição das peças no museu integrante do Circuito Liberdade, um dos mais importantes do cenário cultural do estado, resulta dos seis anos de trabalho voltado para a população carcerária”.

  • SERVIÇO
  • Exposição Vidas interrompidas
  • Local: Museu Mineiro – Avenida João Pinheiro, 342, Circuito Liberdade, em BH
  • Período: até 29 de setembro 
  • Funcionamento: de terça a sexta-feira, das 10h às 19h, e sábado e domingo, das 12h às 19h
  • Entrada gratuita


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