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Estado de Minas

Relatório que originou operação da PF contra docentes da UFMG revela suspeita de pagamentos irregulares

Deflagrada com base em documentos da Controladoria-Geral da União (CGU) e do Tribunal de Contas da União, a ação gerou forte reação na comunidade acadêmica


postado em 07/12/2017 06:00 / atualizado em 07/12/2017 19:27

Operação deflagrada na manhã de ontem pela Polícia Federal no câmpus Pampulha da Universidade Federal de Minas Gerais, com condução coercitiva de professores e integrantes da cúpula da maior instituição do tipo no estado, revelou uma investigação sobre suposto desvio de dinheiro destinado ao projeto de construção do Memorial da Anistia Política do Brasil (MAP). Deflagrada com base em documentos da Controladoria-Geral da União (CGU) e do Tribunal de Contas da União, a ação gerou forte reação na comunidade acadêmica e entre entidades políticas e movimentos sociais, além de protestos diante da sede da PF, no Bairro Gutierrez, Região Oeste de Belo Horizonte, na própria universidade e na Assembleia Legislativa de Minas.

Força-tarefa apura denúncias de não execução e de desvio de recursos públicos que deveriam ter sido destinados à construção do memorial, um projeto financiado pelo Ministério da Justiça e executado pela UFMG(foto: Edesio Ferreira/EM/D.A Press)
Força-tarefa apura denúncias de não execução e de desvio de recursos públicos que deveriam ter sido destinados à construção do memorial, um projeto financiado pelo Ministério da Justiça e executado pela UFMG (foto: Edesio Ferreira/EM/D.A Press)
Em entrevista coletiva, delegados da PF sustentaram que pelo menos R$ 4 milhões teriam sido desviados do projeto, em processo que pode envolver peculato e formação de quadrilha. A força-tarefa apura denúncias de não execução e de desvio de recursos públicos que deveriam ter sido destinados à construção do memorial, um projeto financiado pelo Ministério da Justiça e executado pela UFMG.  Entre os conduzidos estão o reitor da UFMG, Jaime Arturo Ramírez; a vice-reitora Sandra Goulart, eleita para o cargo máximo da instituição a partir de 2018; o presidente da Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep), Alfredo Gontijo de Oliveira; a ex-vice-reitora Heloísa Starling (2006 a 2010), coordenadora do Projeto República da UFMG; a ex-vice reitora Rocksane Norton (2010-2014); e a socióloga Silvana Cozer, uma das responsáveis pelo Memorial da Anistia.

 

Documentos da Controladoria-Geral da União (CGU) e do Tribunal de Contas da União (TCU) que deram origem à investigação da Polícia Federal questionam como foi firmado o Termo de Cooperação 001/2009 – entre a UFMG e o Ministério da Justiça para a construção e implantação da sede do Memorial da Anistia Política do Brasil (MAP), os controles da execução e a legalidade dessas ações. O trabalho da CGU se atém a avaliar o planejamento, e o do TCU levanta suspeita de pagamentos irregulares.


Antes mesmo da operação da PF, a CGU já havia apontado falhas na execução do projeto, em auditoria na Comissão de Anistia, ligada ao Ministério da Justiça, referente ao período de 2009 a 2016. Em um dos documentos, a CGU detalha três fases do projeto: reforma e adaptações ao uso do prédio do memorial, o antigo “Coleginho” da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas; construção de um estacionamento e de uma praça; e construção de prédio administrativo nos fundos, em cinco pavimentos, para a administração do memorial e do centro de pesquisa e documentação.

Ação gerou forte reação na comunidade acadêmica e entre entidades políticas e movimentos sociais, além de protestos diante da sede da PF(foto: Edesio Ferreira/EM/D.A Press)
Ação gerou forte reação na comunidade acadêmica e entre entidades políticas e movimentos sociais, além de protestos diante da sede da PF (foto: Edesio Ferreira/EM/D.A Press)
“Registra-se (...) que não há discriminação, na formalização do termo, dos valores que seriam gastos nem planilha dos custos do empreendimento. Ressalta-se que a unidade buscou cumprir as exigências na formalização do processo, porém o plano de trabalho foi erroneamente denominado projeto básico (...)”, afirma o relatório.

O documento questiona o aumento dos valores empenhados: foi definido valor total de implantação do MAP de R$ 5,150 milhões na formalização do termo de cooperação e, na assinatura do primeiro aditivo, vigente entre novembro e dezembro de 2010, o montante deu um salto para R$ 14.318.231. Posteriormente, foram assinados outros cinco aditivos, o último com vigência até  31 de dezembro de 2018. Nele, o valor orçado já era estimado em R$ 28.817.864.48.

Apesar da apresentação de um plano de trabalho na assinatura do termo, a CGU o considera “incipiente”. “No caso de obras, instalações ou serviços, não evidenciou o conjunto de elementos necessários e suficientes para caracterizar, de modo preciso, a obra, instalação ou serviço (...), nem sua viabilidade técnica, custos, fases ou etapas, e prazos de execução”. “É irregular a celebração de convênio com planos de trabalhos mal elaborados, com objetos imprecisos, metas genéricas e insuficientemente descritas”.

Entre as justificativas apresentadas à CGU, sem citar nomes dos representantes do MAP, consta no relatório que “os acréscimos são fruto da melhor compreensão sobre o escopo do empreendimento e maior clareza da administração pública quanto às ações que pretende empreender”. Sobre o aumento de valores, a ausência de orçamento em 2009 é a razão apontada para a elevação do valor de R$ 5 milhões para R$ 14 milhões.

Também sem citar nome, o documento afirma que o coordenador-executivo do memorial diz que o acréscimo ocorreu em virtude da definição em preços de mercado com fornecedores locais, que importou em um acréscimo significativo do custo de reforma do prédio de exposição; o encaminhamento pela UFMG de demandas por ampliação do financiamento da exposição de longa duração; e ampliação da estimativa do custo do prédio administrativo, tendo em vista uma ampliação do escopo e ajuste na estimativa anterior. A justificativa para o sexto aditivo são “fragilidades estruturais no edifício do ‘Coleginho’ (...) não percebidas nos termos anteriores”.

CONTAS No Tribunal de Contas, dois documentos serviram de subsídio à investigação da Polícia Federal. Relatório de auditoria, de maio deste ano, teve objetivo de verificar a conformidade dos procedimentos adotados pela universidade e suas fundações de apoio à legislação aplicável. Neles, foram identificados problemas em pagamento de bolsas. O relatório gerou acórdão que está em tramitação na 2ª Câmara do TCU. O outro, de abril, é um processo de representação que trata de irregularidades na contratação de funcionários. De acordo com o TCU, o processo ainda está em aberto, sem deliberação de mérito, que terá a análise reforçada com documentos obtidos na operação Esperança Equilibrista. Por isso, ele permanece confidencial.

No primeiro caso, o documento cita que, por lei, a soma da remuneração com as retribuições e bolsas recebidas da fundação pelo professor não poderá exceder o teto do funcionalismo. De acordo com o relatório, a universidade não tem controle implantado para garantir o cumprimento desse dispositivo, o que seria agravado “pela constatação de casos concretos de pagamentos acima desse limite”. O TCU informa que 140 servidores da UFMG teriam recebido pagamentos acima do teto de janeiro de 2015 a junho de 2016, em valores que totalizaram R$ 2.533.602,70. Tomou-se por limite mensal o valor de R$ 33.763, estipulado na Lei 13.091/2015.

O documento acrescenta que “os esclarecimentos apresentados pelos responsáveis da instituição foram insuficientes para justificar a ausência de ações efetivas para assegurar o cumprimento do teto constitucional”. O relatório aponta ainda ausência de normativos internos para disciplinar a sistemática e o controle dos convênios e contratos celebrados com a fundação de apoio e que foram ainda identificados casos de prestação de contas que não continha os elementos mínimos necessários.

O que diz a CGU
– Testes de auditoria indicaram que o planejamento do Memorial da Anistia foi extemporâneo e impreciso, ocasionando excessivas alterações no projeto executivo e, consequentemente, no custo previsto, bem como no plano de trabalho. A definição do objeto do termo de forma genérica ocasionou dificuldades na sua delimitação, possibilitando, inclusive, alterações em seu conteúdo por meio de termos aditivos
– A Comissão de Anistia não apresentou as análises das prestações de contas dos valores repassados, tampouco fiscalizou o andamento das obras do memorial
– Não foi identificada estrutura formalizada para acompanhamento da fiscalização
– Constatou-se que não há plano de ação para a conclusão, contemplando as dificuldades de execução e a possível ausência de recursos para financiamento das despesas restantes para o término do projeto

O que diz o TCU
– 140 servidores da UFMG teriam recebido pagamentos acima do teto do funcionalismo no período de janeiro de 2015 a junho de 2016, em valores que totalizaram R$ 2.533.602,70
– Ausência de normativos internos para disciplinar a sistemática e o controle dos convênios e contratos celebrados com a fundação de apoio da universidade
– Foram identificados casos de prestação de contas que não continham os elementos mínimos necessários à situação
– Irregularidades na contratação de funcionários

A posição da UFMG

A UFMG informou que espera um posicionamento jurídico para decidir se vai se pronunciar ou não sobre as acusações. Em ato contra a operação no câmpus, o reitor Jaime Arturo Ramírez afirmou que prestaria depoimento para esclarecer os fatos por livre e espontânea vontade, caso fosse chamado a fazê-lo.

O MEMORIAL E A DENÚNCIA
Idealizado em 2008, o projeto do Memorial visa à preservação e à difusão da memória política dos períodos de repressão – contemplados pela atuação da Comissão da Anistia do Ministério da Justiça. Segundo o delegado Leopoldo Lacerda, as obras começaram em 2013 e deveriam ter sido concluídas em 2015. “O projeto contempla dois eixos. Um deles era a reforma do ‘coleginho’ (parte da antiga Facudade de Filosofia e Ciências Humanas – Fafich), a construção de dois prédios anexos e uma praça de convivência e de reflexão. Outro, a pequisa de conteúdo e produção de material que seria exposto no museu”, disse. “A vice-reitora sempre foi a coordenadora do projeto financiado pelo Ministério da Justiça. A UFMG, como executora, contratou uma construtora e a Fundep para executar a pesquisa. O contrato foi várias vezes aditivado e prorrogado. Até hoje não foi finalizado e os valores sempre aumentaram”, sustentou o delegado.

(* Estagiário sob supervisão do editor Roney Garcia)


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