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Estado de Minas

Dois anos após tragédia, manchas de minério ressurgem nas praias e na foz do Rio Doce

Ambientalistas e pescadores denunciam o problema no local onde a lama vinda da Barragem do Fundão, em Mariana, encontrou o mar, no Espírito Santo


postado em 04/11/2017 11:00 / atualizado em 04/11/2017 12:42

Moradores dizem que faixa escura na praia nunca foram tão extensas e que desta vez o minério estaria presente na areia(foto: Ramon Lisboa/EM/DA Press)
Moradores dizem que faixa escura na praia nunca foram tão extensas e que desta vez o minério estaria presente na areia (foto: Ramon Lisboa/EM/DA Press)

Regência Augusta –
A água verde do Rio Doce só ficava escura quando encontrava o mar em Regência Augusta, distrito de Linhares, no Espírito Santo, onde se encerra a jornada desse manancial que nasce em Minas Gerais. E sempre foi assim, segundo os pescadores dessa antiga colônia capixaba. Mas, após a passagem da lama de rejeitos minerários que foi despejada no Rio Doce depois do rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, essa situação mudou. Desde 21 de novembro de 2015, quando os rejeitos produzidos em Minas Gerais chegaram a Regência Augusta, tanto o rio quanto o mar mudam seu aspecto para uma coloração marrom, por vezes mais escura. Basta uma mudança de vento, de maré ou chuva para que o rejeito, que chega a dois palmos nos leitos fluvial e marinho, se eleve.

“Ainda está tudo lá, depositado no fundo do rio e do mar. Nesses dois anos de rompimento a gente tem visto essa lama voltar e sujar tudo. Não tem uma ação de reparação nesse sentido. Essa situação acabou com o nosso turismo e com a pesca tradicional”, lamenta o ambientalista Carlos Alberto Sangalia, que é educador do Projeto Tamar e vice-presidente do Comitê da Bacia do Barra Seca e Foz do Rio Doce.

Não bastasse o aspecto da água e a contaminação dos peixes, a areia das praias também está sofrendo com essa situação. Desde o início do mês, pelo menos dois quilômetros de faixas de praia ficaram escuras, como se uma manta de minério tivesse sido despejada justamente na barra sul onde o Rio Doce encontra o mar. Há controvérsias sobre o fenômeno. De tempos em tempos, um mineral chamado de areia monazítica costuma aflorar naquele litoral. Contudo, segundo pescadores e ambientalistas, nunca foi algo muito extenso e desta vez está presente também minério proveniente do rompimento da barragem. “Nunca se viu uma areia tão escura assim e num espaço tão grande como está agora. Isso é certamente por causa da lama que desceu pelo rio até aqui. É minério de ferro”, afirma o vice-presidente do Comitê da Bacia do Barra Seca e Foz do Rio Doce.


Em Vitória, a areia das praias próximas ao porto de Tubarão ganham um aspecto similar sempre que ocorre algum derramamento ou carreamento de minério de ferro das esteiras entre os navios e os depósitos do mineral. Essa situação já é conhecida dos capixabas, que chamam esse material de “pó preto”. Contudo, devido a esse tipo de poluição, o porto chegou a ser interditado e multas foram aplicadas à Vale, que é a operadora do terminal. De acordo com a análise de especialistas da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), o pó preto é uma mistura de minério de ferro e carvão que circulam no porto de Tubarão. O pó preto cai na água e se deposita no fundo, sendo reerguido dependendo das condições climáticas e do mar, indo parar, inclusive, na areia da praia.

ROTINAS ALTERADAS O pescador Joel Marques Ferreira, de 64 anos, afirma que tanto no rio quanto no mar basta uma mudança de vento para observar o ressurgimento do minério trazido pelo Rio Doce. “É só dar um vento que joga para fora (da água) o resíduo que sobrou. Está tudo contaminado. Desanimou tudo para a gente que tinha aqui só a pesca e a praia. Agora, nem a praia mais a gente tem. Se quiser tem de sair daqui para pescar ou curtir uma prainha. Está tudo contaminado, o peixe pode fazer mal para a saúde. Aqui, agora, acabou”, reclama.

Dois anos depois da passagem da lama, Regência ainda sofre os impactos. “Ainda há quatro pescadores que não foram cadastrados e não receberam nada ainda. Não temos a análise do peixe para ver se está contaminado e por isso não podemos pescar. Por falta de uso, os equipamentos da colônia de pesca estão se acabando. Acabou o gás dos congeladores, as geladeiras trancaram os motores. Os barcos estão encostados, apodrecendo”, afirma o presidente da Associação dos Pescadores de Regência, Leônidas Carlos. “Pouca ou nenhuma medida corretiva foi feita. A situação do turismo tem se agravado a quase zero, com muitas pousadas fechando. Caiu a renda do pescador e nada ainda de suas indenizações saírem. Tudo o que temos é a população e voluntários que conseguem. Tudo está aquém da necessidade e da velocidade do impacto”, considera Carlos Sangália, vice-presidente do Comitê da Bacia do Barra Seca e Foz do Rio Doce.

ANÁLISE QUÍMICA O Instituto Estadual de Meio Ambiente (Iema) do Espírito Santo informou não ter feito uma análise nos minerais encontrados na praia de Regência Augusta, mas destacou que há algumas praias com grãos mais pesados que podem ter sido expostos pela intensa agitação marítima. A Fundação Renova, que foi criada para organizar e executar as reparações ambientais necessárias depois do rompimento da Barragem do Fundão informou por meio de nota que “irá fazer uma caracterização em um trecho piloto no Espírito Santo para caracterizar detalhadamente a presença e o comportamento do rejeito no local. Mas, sem uma análise química, não se pode afirmar que é rejeito ou minério”.


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