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Estado de Minas

EM relata a rotina em curso de sobrevivência em condições inóspitas

A cada ano é maior o número de interessados em testar capacidade de resistência ao frio, à fome e à sede em áreas selvagens


postado em 25/06/2017 06:00 / atualizado em 25/06/2017 11:52

Participantes se desdobram para racionar água e comida, montar acampamento, fazer armadilhas e abater caça(foto: Mateus Parreiras/EM/D.A Press)
Participantes se desdobram para racionar água e comida, montar acampamento, fazer armadilhas e abater caça (foto: Mateus Parreiras/EM/D.A Press)

Imagine passar duas noites sem dormir, com alimentação racionada, água contada e dormindo praticamente ao relento, sob um frio de 5 graus centígrados? Essas condições inóspitas desanimariam a maioria das pessoas, mas a cada ano mais e mais gente busca matas de Minas Gerais para aprender técnicas de sobrevivência e testar os limites do corpo e da mente em simulações de situações de emergência em terreno selvagem. No fim do mês passado, a equipe do Estado de Minas acompanhou por três dias os treinamentos da escola de sobrevivência Mestre do Mato, em Lagoa Santa, a 36 quilômetros de Belo Horizonte, onde sete alunos se inscreveram para o curso de nível intermediário, um deles do Rio de Janeiro, dois de São Paulo e quatro mineiros.


A aventura é para candidatos determinados. “O curso avançado é tão extremo que costuma ocorrer uma vez a cada dois anos. No curso básico, o aluno aprende técnicas e conceitos de kits para sobreviver por 72 horas, que é a média de um resgate. Já no intermediário, algumas privações entram em cena e o aluno precisa vencer com técnicas as dificuldades e, com a mente, o contexto de privação”, afirma o instrutor e fundador da escola, Giuliano Toniolo, que é reconhecido no meio dos mateiros e da sobrevivência como um dos pioneiros do tema no YouTube, além de fazer trabalhos de consultoria a programas do gênero.

Para simular as condições de uma pessoa em uma situação de emergência, os alunos são privados de grande parte dos costumeiros confortos da vida moderna. Para três dias, cada um só pode levar dois litros de água, duas barrinhas de cereal e duas de chocolate. Na primeira noite, cada pessoa precisa enfrentar a escuridão do entardecer dentro de uma área de cerradão, onde deve montar sua rede de selva e a cobertura de lona. Não é permitido levar cobertores ou sacos de dormir.

Produção de fogo de maneira primitiva está entre técnicas ensinadas em atividades promovidas pelo instrutor Giuliano Toniolo(foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
Produção de fogo de maneira primitiva está entre técnicas ensinadas em atividades promovidas pelo instrutor Giuliano Toniolo (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
A restrição torna o frio, que facilmente chega aos 5°C durante a madrugada, um tormento para os alunos. É permitido que cada pessoa se enrole em cobertores aluminizados de emergência, como aqueles usados pelos bombeiros em acidentes, algo que não aplaca a sensação de congelamento iminente. Todas as noites, os participantes se revezam em turnos de vigília para que a fogueira do acampamento não se apague, mas, devido à temperatura, é comum que por volta das 4h todos já estejam de pé, tentando se aquecer junto ao fogo.

Na segunda noite, as condições pioram. Enquanto metade do grupo se organiza para trazer folhas para forrar o chão de terra de uma clareira, o restante se esforça para esticar uma tenda improvisada que servirá de abrigo. Dormindo no chão, a perda de calor é ainda mais intensa e obriga que todos se espremam, em busca do aquecimento da fogueira e dos corpos dos companheiros de sobrevivência. “O mais desafiador para mim foi a falta de sono, ficar muito tempo sem dormir, dormir no chão. Com um frio que chegou a 5°C, a mata ensina que quem não está totalmente preparado, com agasalhos e equipamentos, passa frio mesmo”, disse um dos alunos, o administrador de empresas paulistano Bruno Coelho, de 32 anos.

“Na primeira noite estava muito frio e o cobertor aluminizado não ajuda. Quando esquenta, a pessoa sua tanto que fica molhada. Aí o frio acaba com qualquer um. A solução é acordar e ir para perto da fogueira”, afirma o engenheiro André Augusto Orsi Dutra, de 49, também de São Paulo.

 

Água racionada e abate de codorna

 

A alimentação acaba sendo dosada para momentos de necessidade de energia, como a navegação pela mata com todo equipamento nas costas e o uso de facão e bússola para avançar. Como parte do ensinamento, os sobreviventes aprendem a escolher quais os tipos de cipós acumulam água, e podem purificar a água de um córrego para completar sua hidratação. A falta de comida cobra seu preço, e entra uma das mais duras partes do treinamento para alguns, que é a simulação de caça, abate e preparação de alimento. Codornas de cativeiro são levadas para essa finalidade. A fome é tanta que a lição sobre o que é necessário para viver por mais algum tempo faz com que o abate dos animais seja silencioso, rápido, mas sem arrependimentos.

Os gastos de energia são grandes também nas oficinas de fogo primitivo, onde é preciso aprender a fazer uma fogueira usando métodos como a fricção de um arco e uma broca de madeira ou pelo atrito de pedras de quartzo com limas de aço. Tanto esforço feito em meio ao racionamento de água e comida cobra seu preço. Muitos alunos acusam, ao fim do segundo dia, um quadro de leve desidratação, com urina escura e dores de cabeça.

Um deles, o empresário belo-horizontino Rhana Mussa, de 33, sofreu mais com os sintomas e contou com a ajuda dos companheiros para repousar e se recuperar. “Controlei tanto o consumo de água que passei o dia sem beber nada. Não conhecia os sintomas de desidratação e depois dessa experiência passei a saber todos”, conta. “Comecei tendo dor de cabeça, depois tonteira, ânsias. A pressão caiu. Foi uma grande oportunidade de aprendizado, que deixou clara a importância de um grupo. No ano passado tive problemas com o frio por falta de agasalho e quase tive hipotermia. Essa vivência em um ambiente em que temos suporte técnico é o momento de aprender”, considera.

 


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