
Cansamos dessa situação, vamos embora, foram várias inundações. Num alagamento ocorrido há dois anos, tivemos prejuízo de R$ 40 mil. A água subiu tanto que o piano ficou boiando”, recorda-se a professora e vice-diretora do Spasso, Roberta Mesquita, que, na quinta-feira, se juntava à trupe para carregar o caminhão. Por enquanto, os equipamentos ficarão guardados num lote vago emprestado pela mãe de um estudante, embora o maior prejuízo seja para os futuros profissionais do circo – 170 alunos, dos quais 50% bolsistas. “Os cursos livres serão transferidos para um clube e uma academia, mas os de formação profissional, com duração de três anos e reconhecido pelo Ministério da Educação, ficarão sem lugar”, lamenta a professora.
Há um descaso muito grande com uma escola que está aqui há duas décadas, pagando aluguel caro, que nem pelas enchentes foi reduzido, e R$ 1 mil mensalmente à prefeitura, entre IPTU e outros tributos. Apelamos para a prefeitura, o estado e a Fundação Nacional de Artes (Funarte) e não adiantou. Já passamos muito aperto, mesmo instalando comportas na entrada. Uma vez, durante uma aula infantil, tivemos que amarrar as crianças e depois levá-las para a parte superior do galpão para que não fossem arrastadas pela enxurrada”, conta Roberta, mãe de Flor, de 10 anos, e Brisa, de 8. “A mais velha está traumatizada com chuva, não pode nem ouvir falar.”
A professora Brícia Paloma não se esquece de uma noite em 2011, quando perdeu o carro na enxurrada. Ao lado, a funcionária Adriana Oliveira mostra as cenas dramáticas na tela do celular. Do lado de fora, o ex-aluno Philippe Ribeiro, de 32, que está treinando na escola, recorda-se do dia em que se amarrou a uma árvore para não ser tragado pelas águas. “Achei que fosse morrer.” Mesmo com os problemas, Roberta se mostra dura na queda: “A escola é parte de nossas vidas, muito importante para a formação de profissionais. Alguns que saíram daqui trabalham em companhias do Brasil e exterior”.

Ao longo do trecho de riscos da Francisco Sá, onde predomina o comércio, há placas alertando motoristas para não estacionarem em caso de chuva forte, além de muitos bueiros, muros reforçados, comportas em residências e lojas, portas mais altas e portões com vedação na parte inferior. Segundo um corretor de imóveis, “este é um trecho problemático para quem sabe das enchentes, mas, para quem desconhece, acaba comprando pelo valor de mercado”.

FUNIL Na noite de domingo, a chuva foi tão rápida quanto pesada e espalhou o pânico. “As pessoas continuam no sufoco. Moro na Jaceguai desde 1963 e já vi de tudo. Debaixo deste asfalto passa o Córrego dos Pintos e jamais deveriam ter desviado tanto trânsito para cá. Agora, falam até em alargar a via. Felizmente, minha casa é numa parte mais alta, então, escapo da enxurrada. O problema é que, se precisar sair de carro, é impossível, tal a velocidade da enchente. Esse trecho é um vale, vem água da Avenida Amazonas, do Bairro Gutierrez, dos morros ao redor e afunila aqui”, diz o morador, que prefere não se identificar.
A Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) informa que está desenvolvendo um projeto de reforma e ampliação de galerias de macrodrenagem e implantação de microdrenagem para captação de águas pluviais do Córrego dos Pintos, na Avenida Francisco de Sá, beneficiando aproximadamente 30 mil pessoas.
Em nota, os técnicos explicam que as inundações decorrem da insuficiência de captação de excedente de chuva, por meio do sistema de microdrenagem existente. “A solução de engenharia proposta é a implantação de uma nova galeria, paralela à existente, com incremento na captação superficial. A extensão aproximada de intervenções é de 1,5 mil metros.” E mais: “A implantação de canal paralelo ao existente no Córrego dos Pintos irá reduzir o risco de inundações por meio da ampliação da capacidade de resposta do sistema de vazões, ou seja, aumentar em cinco vezes o nível de segurança do sistema de drenagem da região”. A obra está orçada em R$ 15 milhões.
