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Estado de Minas

Migração para EUA causa impacto em famílias de Valadares, diz estudo

Tese de doutorado alerta para os custos emocionais suportados por filhos de pais que emigram em busca do sonho de conquistar independência financeira nos Estados Unidos


postado em 19/06/2016 06:00 / atualizado em 19/06/2016 07:57

(foto: Arte EM)
(foto: Arte EM)

Governador Valadares – Conquistar a América e voltar com os bolsos cheios de “valadólares”, como os moradores da região se referem à moeda americana, é um sonho que povoa o imaginário de um sem-número de famílias valadarenses. Mas muita gente da cidade que mais exporta brasileiros para os Estados Unidos paga um alto custo para realizá-lo. O desejo de voltar da terra do Tio Sam com a vida ganha e ajudar a movimentar a economia da maior cidade do Vale do Rio Doce nem sempre sai como planejado, o que prejudica não só os chefes de família, sejam pais ou mães, mas até o próprio desenvolvimento dos filhos.


É o que mostra, entre outras abordagens, o estudo “Convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes e vulnerabilidades no processo de migração internacional”, que rendeu o título de doutora a Silvana Andrade Pena Knup. A tese, sob orientação do professor Duval Fernandes, foi aprovada no Programa de Pós-graduação em Geografia: Tratamento da Informação Espacial, da PUC Minas.

 Silvana entrevistou dezenas de pessoas em Governador Valadares e em Boston (EUA), principal destino dos mineiros do Vale do Rio Doce que viajam para a América. Ela investigou as situações de vulnerabilidade que crianças e adolescentes brasileiros da região de Valadares vivenciam no processo migratório dos pais. “É importante salientar que não apenas a emigração precisa ser bem planejada, mas também o retorno”, alertou ela, na tese.

Muitos adultos planejam viajar sem a companhia dos filhos, para juntar alguma economia, com planos de, em um segundo momento, reunir a família no estrangeiro. Mas nem sempre isso ocorre no tempo imaginado pelos migrantes. Ainda há pais que deixam os pequenos sob a tutela de parentes, pois acreditam que conseguirão retornar antes de a criança crescer e com os bolsos cheios de dólares, podendo transformar sonhos em realidade, como o de comprar a casa própria ou financiar ao descendente uma educação de melhor qualidade.

Mas a distância entre pais e filhos pode interferir na relação de afeto. Em sua tese, Silvana cita o psiquiatra John Bowbly, autor da teoria do apego, para mostrar que “os vínculos familiares dos pais com a criança dependem da responsividade do adulto aos apelos desta por contato”. “Vínculos fortes e seguros criados nos primeiros anos de vida preparam melhor a criança para suas relações ao longo de toda a vida”, escreveu.

Bowbly, continua a doutora, “afirma que, se vínculos forem criados bem cedo, tanto com a mãe quanto com qualquer outro adulto que se mostre bastante responsivo às necessidades da criança, ela sofrerá um processo de ‘luto’ ao passar por um afastamento, porém, o vínculo já estará criado”.


‘Você não é meu pai’


Um dos entrevistados relatou a Silvana que viajou para os Estados Unidos quando a filha tinha 6 meses de idade. Ficou lá por quatro anos e dois meses. “(Depois de que eu retornei), a gente fica vergonhoso na hora de brigar (corrigir) com ela. A gente fica com vergonha, porque ela já está grandinha, com 5 anos, e, por ter ficado longe, ela pode falar: ‘Você não é meu pai’. Agora (ela) acostumou, mas, no começo, ficava meio assim (…). Meu primo ficou muitos anos lá e, quando ele veio, a menina estava com 10 anos. Hoje, ele já legalizou, a menina conversa com ele, mas não é aquela coisa de pai e filha. É uma coisa mais distante”, relatou José (nome fictício).

“Mesmo sentindo muita culpa ao tomar a decisão difícil de deixar seus filhos no Brasil, (pais) fazem essa escolha justificando que os beneficiarão materialmente e, em muitos casos, subestimam os custos afetivos e emocionais que o processo migratório pode inflingir à criança que é afastada temporária ou definitivamente dos seus pais”, avaliou Silvana.

Ela constatou ainda que o adiamento do retorno e a impossibilidade de reunificação da família “podem ter impacto bastante negativo nas uniões preexistentes, levando à separação definitiva de casais e a perdas de vínculos com crianças que foram deixadas no Brasil”.


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