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Estado de Minas

Famílias desalojadas na tragédia de Mariana tentam celebrar Natal

As 303 famílias desalojadas no rompimento da Barragem do Fundão tentam reunir forças para celebrar após a onda de perdas. Parte não recebeu auxílio e várias continuam em hotéis


postado em 22/12/2015 06:00 / atualizado em 22/12/2015 07:59

Amanda Carmo com a filha Dafine: família não poderá comemorar unida, como de costume, e ainda enfrenta falta de dinheiro já que a Samarco ainda não pagou auxílio(foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
Amanda Carmo com a filha Dafine: família não poderá comemorar unida, como de costume, e ainda enfrenta falta de dinheiro já que a Samarco ainda não pagou auxílio (foto: Túlio Santos/EM/DA Press)

Mariana –
A alegria da pequena Dafine diante da colorida árvore de Natal é um contraste à tristeza que aflige o coração da mãe dela, Amanda Carmo, de 17 anos: “As festas deste fim de ano não terão a mesma graça. A família, acostumada a comemorar unida, estará dividida”. A jovem morava em Bento Rodrigues, o primeiro povoado devastado pela avalanche de lama de rejeitos de minério da Samarco, em 5 de novembro, em Mariana. Às vésperas do Natal, as 303 famílias desalojadas (1.129 pessoas) de seis distritos da cidade colonial tentam reunir forças para celebrar a data.


Quase 50 dias depois da maior catástrofe ambiental do Brasil, mais de 70 famílias que perderam suas casas não receberam, até ontem, o auxílio mensal prometido pela mineradora – um salário mínimo (R$ 788), mais 30% por dependente e o correspondente ao valor de uma cesta básica (R$ 388). Algumas dezenas delas continuam hospedadas em quartos de hotéis ou pousadas alugados pela Samarco, que obteve lucro líquido de R$ 2,8 bilhões em 2014.

“Quando preciso comprar algo, peço à minha mãe um dinheiro emprestado. A Samarco me deu previsão de quando irei recebê-lo”, cobrou Amanda, cujo marido ganha a vida como pedreiro no lugarejo. Hoje, ele garimpa uma vaga no mercado de trabalho. Ontem, Amanda e outras vítimas foram ao centro de distribuição de donativos atrás de mantimentos, garrafas de água, brinquedos e materiais de limpeza.

Muitos pais levaram os filhos. Enquanto a criançada se divertia escolhendo bonecas e carrinhos, os adultos listavam aos voluntários o estoque para os próximos dias, pois o lugar ficará fechado das 14h de quarta-feira à manhã de 28 de novembro. A colorida árvore que chamou atenção de Dafine foi montada lá. Neste Natal, a casa dela não terá enfeites típicos da data.

A ceia também não será farta como a de anos anteriores. Aves e outras criações que os desalojados costumavam abater nesta época do ano foram levadas pelo tsunami de lama.

“Vamos juntar a família, tentar um Natal alegre. Mas sei que não será como antes”, prevê Ana Paula Ferreira, de 22. Ela também esteve no centro de distribuição de donativos na esperança de encontrar um colchão. Conseguiu. Ainda levou para a casa um velotrol usado para o filho, Anthony, de 9 meses. O sorriso do menino deu uma pitada de alento à mãe.

Mas a família dela não estará completa neste Natal, pois os dois cães de estimação, o Valente e o Jack, foram levados pela enxurrada de minério. “A Lilica, uma maritaca, também não sobreviveu. Assim como os passarinhos que criávamos”, recordou Ana Paula, acrescentando que muitos desalojados são alvos de comentários maldosos. ‘Há quem diga que a mineradora está fazendo por nós mais do que deveria. Não! E minha casa?”, questionou.

O sorriso do pequeno Antony ao receber um velotrol doado deu um pequeno alento à mãe, Ana Paula(foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
O sorriso do pequeno Antony ao receber um velotrol doado deu um pequeno alento à mãe, Ana Paula (foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
Dona Joelma Souza, de 25, também ouviu comentários maldosos. Ela era a dona do bar onde os moradores de Bento Rodrigues dançavam forró nos fins de semana. “Havia montado o estabelecimento há dois anos. Meu estoque estava cheio quando ocorreu o desastre, pois haveria uma festa no sábado seguinte. Perdi tudo”. Só não perdeu a fé, mas ela faz questão de dizer que este Natal não terá a mesma alegria dos anteriores. Será a primeira vez que ela celebrará a data longe do lugarejo.

“A família toda se reunia na casa de minha avó, dona Orides da Paixão, que tem mais de 90 netos, bisnetos e tetranetos. Não terá mais doce de jacatiá, que é uma árvore parecida com o pé de mamão. A gente abria o tronco, retirava o alimento, como se faz com o palmito. Todo mundo ajudava. A gente ralava, deixava na água, misturava com açúcar e fervia no fogão a lenha. Não temos mais o fogão a lenha. Não terá jacatiá neste Natal”, reclamou Joelma. Ela ainda não pôde comprar a guloseima, pois também não recebeu o cartão com auxílio mensal.

“Dizem que vai chegar esta semana. Mas o triste mesmo é que não teremos como reunir a família para as festas de fim de ano”, lamentou Joelma, que ontem passou parte da manhã no centro de distribuição de donativos. Ela voltou para casa com algumas sacolas plásticas com brinquedos para o filho, de 8 anos, e sobrinhos. Ficou mais de meia hora aguardando carona para chegar em casa. No fim, concluiu: “A gente não merecia um Natal assim”.

FORÇA-TAREFA
Representantes das dioceses de cidades mineiras e capixabas atingidas pela lama da Samarco vão afinar os trabalhos em recuperação do meio ambiente e da ajuda às vítimas. A pauta será discutida, hoje, numa reunião em Mariana. “Queremos, ainda, discutir ações comuns que sejam assumidas em conjunto pelas dioceses”, disse o coordenador de pastoral da arquidiocese da cidade histórica, padre Geraldo Martins Dias. A reunião será presidida pelo arcebispo de Mariana, dom Geraldo Lyrio Rocha.


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