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Estado de Minas

Médicos da saúde pública temem reações dos pacientes e têm atuação limitada pela escassez

Espera e falta de insumos e pessoal que castigam usuários do SUS pressionam também médicos. Profissionais temem reações dos pacientes e têm atuação limitada pela escassez


postado em 21/06/2015 06:00 / atualizado em 21/06/2015 08:03

Em unidades de urgência, dificuldades de trabalho relatadas por profissionais são sentidas na pele por quem espera horas para ser atendido(foto: Cristina Horta/EM/D.A PRESS )
Em unidades de urgência, dificuldades de trabalho relatadas por profissionais são sentidas na pele por quem espera horas para ser atendido (foto: Cristina Horta/EM/D.A PRESS )

A escassez de recursos, pessoal, medicamentos e materiais que sacrifica usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), antes de atingir os pacientes pressiona as equipes que estão dentro das unidades. Os médicos relatam ter medo, não só de agressões mas de serem punidos por complicações provocadas pela falta de infraestrutura ou pela pressão exercida pelos gestores por aumento de atendimentos – que não necessariamente significa melhor qualidade. Segundo uma das médicas da UPA Norte, no Bairro 1º de Maio, em Belo Horizonte, faltam medicamentos básicos, como amoxilina, para tratar infecções respiratórias típicas desta época do ano. Ela diz ainda que o trabalho fica comprometido pela falta de aparelhos de raios x e eletrocardiogramas, que chegam a permanecer inoperantes por dias. Insumos básicos, como talas de imobilização, máscaras para inalação, água filtrada para diluição de medicamentos orais, lençóis para macas e camas de observação, assim como cobertores, também estão na lista de materiais que faltam.

“A infraestrutura também é complicada. A UPA é pequena. Pacientes ficam nos corredores e alguns chegam a receber soroterapia em pé, por falta de leitos. Nos banheiros, faltam sabonete líquido, álcool em gel, papel toalha e papel higiênico”, diz a profissional. Segundo ela, o último ano tem sido o pior da carreira de duas décadas na unidade. “Muito médicos vêm e não ficam. Só não saio porque acho que tenho uma missão com essa comunidade”, afirma, lembrando que a violência do tráfico no local é outro complicador. “Constantemente a gente ouve tiros e tem que abaixar para se proteger. Traficantes já entraram na UPA para matar inimigos na nossa frente”, relatou.

Presidente da Associação Médica de Minas Gerais, Lincoln Lopes Ferreira explica que o problema da escassez de recursos é generalizado em Minas. No interior, onde a infraestrutura é ainda mais precária, os pacientes se vêm obrigados a procurar cidades polo para tratamento. Essa migração, de acordo com Lincoln, provoca um inchaço nos serviços de Belo Horizonte, também sufocados pela região metropolitana. “Como as unidades de pronto atendimento (UPAs) são porta aberta durante 24 horas, sete dias por semana, os doentes dão entrada na urgência e emergência para conseguir tratamento”, disse.

“Quem mais sofre é o paciente, que espera horas para ser atendido ou nem mesmo consegue o tratamento. Mas, na outra ponta, o profissional também vive a angústia de não ter estrutura. Fica de mãos atadas e não encontra retaguarda em outros hospitais para transferir o paciente”, afirma Lincoln Ferreira. Segundo ele, isso ajuda a explicar o motivo da falta de médicos. “Com tantas dificuldades, o profissional não assume o risco de continuar numa unidade onde o paciente pode morrer no seu plantão por falta de condições, porque pode responder ética e criminalmente por omissão de socorro”, ressaltou.
Atendimento a doentes em corredores é rotina em unidades de urgência. Pacientes e médicos relatam falta até de insumos básicos, como lençóis (foto: Valquíria Lopes/EM/D.A PRESS)
Atendimento a doentes em corredores é rotina em unidades de urgência. Pacientes e médicos relatam falta até de insumos básicos, como lençóis (foto: Valquíria Lopes/EM/D.A PRESS)

DESRESPEITO
Pior para quem precisa do atendimento. De acordo com a diarista Simone Aparecida Oliveira, de 37 anos, que frequentemente usa o serviço da UPA Norte, as condições chegam a ser desrespeitosas com o cidadão. “É sempre demorado. O atendimento é ruim desde a portaria. Os funcionários não dão conta de tanta gente”, disse a mulher, que na quarta-feira passada levou o filho Diego Richard de Oliveira, de 5 anos, para se consultar. “Vi uma mulher que chegou passando mal e mesmo passando pela triagem só foi atendida depois que teve um AVC na recepção”, contou.

Na UPA Nordeste, as dificuldades vivenciadas na Norte se repetem. Um dos médicos plantonistas relata um ambiente que pode ser considerado insalubre. Faltam um sistema de ventilação que funcione, lençóis, assento para vaso sanitário, medicamentos e a estrutura é completamente sucateada. O profissional, que pediu anonimato, lembra que a manutenção de equipamentos é algo problemático, pois a gestão da unidade não se preocupa com essas coisas. “Já ficamos sem água na UPA e o entupimento de pias é frequente. Balanças, macas e estruturas gerais dos consultórios sofrem com a ação do tempo e não são substituídas, apenas repintadas”, acrescenta. Outro problema é a sobrecarga de trabalho. “Já vivenciei várias vezes problemas gerados por equipe desfalcada. As vezes um médico sai de férias ou adoece e a demanda permanece a mesma. Normalmente, não se faz nada, o médico que restou tem que dar conta do serviço”, completa.

O problema está longe de se restringir à capital. No Hospital Regional de Betim, uma das médicas, que pediu para não ser identificada, relata o drama vivido pela falta de vagas para fazer partos. “Antes de o parto acontecer, a gente interna a paciente em um setor que chamamos de pré-parto, onde temos sete leitos. Em um dos meus plantões, já atendemos 19 pacientes e tivemos que colocar mulheres em macas espalhadas e também em cadeiras, dada a falta de lugares apropriados”, exemplifica. Outro problema é a falta de vagas no bloco cirúrgico, o que impede que cirurgias agendadas sejam realizadas. “Às vezes, o paciente chega e vê que não tem a vaga. Eles ficam extremamente chateados e a gente fica muito triste ao presenciar uma situação dessas”, afirma.




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