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Estado de Minas

Quatro em cada 10 adolescentes viciados em drogas começaram com bebidas alcoólicas

Estudos e especialistas alertam que o consumo de bebida alcoólica é cada vez mais precoce, devido à tolerância e à propaganda. Atendimento a pacientes cresceu 25% no HPS João XXIII


03/03/2015 06:00 - atualizado 03/03/2015 07:13

"Melhor morrer de vodca do que de tédio" - Humberto Moura Fonseca, estudante que morreu de infarto depois de consumir 30 doses de vodca (foto: Reprodução/Facebook )

A morte prematura do universitário Humberto Moura Fonseca, de 23 anos, expõe os riscos do consumo de álcool entre os jovens. O laudo médico indicou que o estudante de Passos, no Sul de Minas, sofreu infarto do miocárdio, no sábado, depois de participar de competição alcoólica em ingeriu de 25 a 30 copos de 50 milímetros de vodca durante festa organizada por repúblicas de estudantes em Bauru (SP). A combinação juventude e bebida é preocupante e as estatísticas demonstram que, enquanto a dependência começa cada vez mais cedo, a quantidade consumida aumenta. “A questão do álcool é endêmica no Brasil. Associados a esse histórico cultural estão dependência química, fatores individuais, sociais e o próprio efeito das substâncias. Há uma tolerância ao consumo de álcool. É um ritual de iniciação. Muitas famílias até servem bebida em festas de 15 anos para que os filhos possam aprender a consumir em família”, afirma a diretora-superintendente da Terra da Sobriedade Ana Luiza  Viana. A associação desenvolve trabalho de prevenção e tratamento de dependência química.


No Hospital de Pronto-Socorro João XXIII, pelo menos um jovem é atendido por semana em coma alcoólico. No ano passado, foram atendidos 80 por consumo excessivo, incluindo 64 com idade entre 16 e 35 anos. Em relação a 2013, houve aumento de 25% , quando se somaram 64 atendimentos, 51 de jovens adultos.

Em pesquisa recente, o Centro de Referência Estadual em Álcool e Drogas (Cread) informou que mais de dois terços dos 1.976 dependentes químicos, que buscaram ajuda, experimentaram drogas entre 12 e 17 anos. O álcool foi a porta de entrada para 37% . A entrada precoce no vício se confirma com os dados do Ministério da Saúde. Mais da metade dos adolescentes experimenta bebida alcoólica antes dos 16 anos. Os dados são da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar , do Ministério da Saúde, que, em 2012, constatou que 66,6% dos adolescentes - entre 13 e 15 anos - experimentaram bebida alcoólica alguma vez na vida.

Coordenador médico do pronto-socorro do João XXIII, Marcelo Lopes Ribeiro diz que, nos últimos cinco anos, cresceu o número de pacientes com alcoolemia aguda. “Os dados, porém, não refletem plenamente a gravidade do problema em todo o estado, já que recebemos ligações de colegas de várias cidades pedindo orientação, que não são computadas. E há ainda os pacientes acidentados, cuja causa é o consumo de álcool, que não está na estatística de pacientes atendidos por consumo excessivo”, explicou Ribeiro

O maior percentual é entre as meninas, 68,3%. Entre os meninos é de 64,8%. O estudo mostra também que 21,8% dos entrevistados ficaram bêbados pelo menos uma vez. Os dados alertam para a forma como esses jovens têm acesso ao uso das bebidas, apesar da venda proibida  a menores em todo o país. A pesquisa mostra que um em cada cinco (21,9%) adolescentes consegue comprar álcool por conta própria e que cerca de 12% conseguem a bebida no ambiente doméstico e na companhia de parentes.

VODCA X TÉDIO Por ironia do destino, a frase que Humberto escolheu para colocar no perfil da rede social falava do consumo de bebida e antecipava a fatalidade: “melhor morrer de vodca do que de tédio”. Depois da cerimônia de sepultamento do jovem no domingo, a frase, que surpreendeu familiares dele, atribuída ao poeta russo Vladimir Maiakovski, ainda estava no perfil. “Ele gostava muito da vida. Para nós, ele bebia como uma pessoa normal. Em festas e aniversários da família, tomava dentro dos conformes”, afirmou o tio e padrinho de batismo de Humberto, Cássio Brandão Lemos. Segundo o tio, nem mesmo o irmão mais velho do universitário, que estudou em Ouro Preto, onde há também muitas repúblicas, sabia das competições.

Laudo preliminar indicou que Humberto tinha problemas cardíacos, segundo o delegado de Bauru Kleber Granja.
Ontem, a Justiça de São Paulo concedeu liberdade provisória aos dois organizadores da festa  em Bauru. Os jovens, que não tiveram os nomes divulgados, foram autuados em flagrante por homicídio com dolo eventual e lesão corporal de natureza grave dos outros três estudantes que foram hospitalizados.

Glamourização do consumo 

Especialistas criticam a tolerância à bebida alcoólica no país. A diretora-superintendente da Terra da Sobriedade Ana Luiza César Viana, dizk que  a propaganda glamouriza o consumo. “Os destilados já saíram da mídia. A luta é para retirar outras bebidas, principalmente no horário em que as crianças assistem à TV.” Ela ressalta que é extremamente proibido expor, oferecer e servir bebidas para menores de 18 anos. “As bebidas teriam que ficar em locais não expostos. O álcool mata muito mais que o crack”, defende.

No vídeo em que os jovens participam da competição alcoólica em Bauru, a maior parte usa camisa amarela com a logomarca da Skol. Procurada pelo Estado de Minas, a Ambev não informou se patrocinou o evento. Em nota, afirmou que “lamenta o ocorrido e reforça que consumo responsável é um de seus principais compromissos.” Disse ainda que “não interessa qualquer lucro proveniente do consumo indevido de seus produtos.”

Para Marcelo Lopes, o crescimento do número de pessoas em coma alcoólico é um reflexo do bombardeio de que os jovens são alvo da publicidade. “As propagandas de bebida apresentam sempre pessoas alegres, se divertindo, muitas vezes em festas. Muitos dos casos que atendemos são jovens que estavam em eventos patrocinados por fabricantes de bebidas em sítios em cidades da Grande BH. Nesses ambientes, não há qualquer controle e adolescentes abusam do consumo, principalmente, se desafiados”, diz Marcelo. O médico alerta que por ser o álcool uma droga lícita, em muitos núcleos familiares crianças assistem seus pais bebendo e experimentam  bem cedo.


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