(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas MUITO ALÉM DO ESPIRITUAL

Cinquentenária, Igreja Nossa Senhora do Carmo, em BH, guarda relíquias

Prestes de comemorar seus 50 anos, a Igreja de Nossa Senhora do Carmo, o maior templo católico de BH, dispõe de um rico acervo de livros raros, além de desenvolver obras sociais


postado em 29/01/2013 06:00 / atualizado em 29/01/2013 06:44

A Igreja de Nossa Senhora do Carmo deu nome ao bairro e também à avenida que passa em frente. (foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
A Igreja de Nossa Senhora do Carmo deu nome ao bairro e também à avenida que passa em frente. (foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)


A primeira impressão é de surpresa. A segunda, de encantamento. De início, os olhos custam a crer que um livro de 1731, feito à mão, com capa de couro e molduras de metal, possa ser tão grande –70cm x  40cm. Mas logo as páginas com iluminuras e hinos religiosos, escritos em latim sobre a escala musical, mostram que se está diante de uma obra de arte que atravessa os séculos e precisa ser bem preservada. Na estante da biblioteca de raridades jamais vistas pelo público estão mais sete volumes com a mesma temática e dimensão, alguns feitos de pele de cordeiro, embora sem data e origem. “Esse é um dos mistérios da nossa igreja, saber de onde vieram e quando”, diz o titular da Paróquia de Nossa Senhora do Carmo, frei Evaldo Xavier Gomes. À frente da festa do cinquentenário de inauguração do maior templo católico da capital, cujo ponto alto será em 15 de agosto e terá concertos e outras atividades culturais, o frei lembra que a história da igreja, localizada entre os bairros Carmo e Sion, na Região Centro-Sul, passa pela forte presença na comunidade, trabalhos sociais de vulto e participação permanente dos fiéis.


Se os livros raros chamam a atenção – e precisam de restauração, pois estão com as bordas das páginas cortadas, fitas adesivas coladas etc. –, mais ainda se destacam os vitrais da igreja, pertencente à Ordem Carmelita e com capacidade para acomodar 1,5 mil pessoas. No total, são 350 metros quadrados de vidros coloridos artisticamente trabalhados, de autoria da Casa Conrado, retratando cenas bíblicas e da ordem carmelita. Admirando os detalhes das peças, vê-se que o conjunto da nave e da sacristia demanda recuperação urgente. “Já temos o orçamento e corremos atrás de recursos”, conta o frei, que prefere não revelar o valor. Mas, para trazer de volta o som do carrilhão com 39 sinos, considerado o segundo maior do país – o primeiro é o da Catedral da Sé, de São Paulo (SP), com 60 –, a paróquia vai lançar campanha para arrecadar dinheiro. “O nosso sonho é ver o carrilhão funcionando, se possível na celebração do cinquentenário de sagração da igreja”, anima-se frei Evaldo, que chegou à paróquia há quase dois anos, depois de uma década na Itália, para substituir frei Cláudio van Balen, hoje vigário auxiliar e pároco por mais de quatro décadas.


Carrara

A Igreja de Nossa Senhora do Carmo deu nome ao bairro e também à avenida que passa em frente. O altar tem mesa de mármore de Carrara, pedra inteiriça, com 3,3m de comprimento, 70cm de largura e 10cm de espessura, com quatro pilares imitando o perfil de um frade, mostra frei Evaldo: “Quase tudo que está aqui dentro foi feito na cidade, das estalas ou bancos laterais do altar aos mosaicos, de autoria de A. Mucci. Só a imagem da padroeira foi esculpida no Rio Janeiro (RJ), por um artista português”. De tão perfeita, a acústica do altar permite que uma pessoa no último banco possa ouvir o celebrante. “Temos uma ótima concha acústica, pois, na época da construção, ainda não havia microfone eletrônico, observa.


Os mosaicos do altar, alguns folheados a ouro, reproduzem a imagem dos santos carmelitas “entrando na glória celestial”. São eles, do lado esquerdo, Santa Terezinha do Menino Jesus, São Simão Stock, Santa Maria Madalena de Pazzi, Beato Mantovano, Santo Alberto da Sicília e São Pedro Tomás; e, do direito, personagens do Antigo Testamento: Santo Elias, o profeta, com uma roda, simbolizando o seu carro de fogo que subiu aos céus; e Santo Eliseu, o discípulo, a quem entregou o seu manto. No alto e laterais, há anjos. “Esta igreja está cheia de símbolos. Nas laterais dos bancos de madeira estão os raios do carro de fogo. No altar estão três arcos representando a Santíssima Trindade”, diz o frei. De acordo com a Diretoria de Patrimônio da Fundação Municipal de Cultura, a igreja, já com processo de tombamento municipal aberto, tem estilo eclético pitoresco ou inspirado na arquitetura europeia. O projeto original saiu da prancheta do arquiteto Luiz Signorelli, também autor da planta do Grande Hotel de Araxá, no Alto Paranaíba.

História começa em 1930

Vindos de São Paulo e comandados pelo frei holandês Atanásio Maatman, os carmelitas chegaram a BH no fim da década de 1930 para fundar uma igreja de grandes dimensões. Na época, a região, que muita gente chama hoje de Carmo-Sion, tinha o nome de Acaba Mundo, pois se imaginava que a cidade terminava ali. De início, os frades ergueram um templo pequeno e provisório, de alvenaria, voltado para a Rua Grão Mogol. Mais tarde, quando Juscelino Kubitschek (1902-1976) era prefeito e começava a abrir a antiga rodovia BR-3 (atual BR-040), ligando BH ao Rio de Janeiro, frei Inocêncio Gerritsjans, então dirigindo a ordem na capital, decidiu fazer a frente voltada para o trecho da estrada que se tornou a Avenida Nossa Senhora do Carmo. “Foi usado o mesmo projeto, por isso o piso é meio inclinado. Onde está a entrada principal seria o altar, e vice-versa”, afirma frei Evaldo.

O projeto demorou mais de 20 anos para sair do papel. Para conseguir o dinheiro, frei Inocêncio circulava pela Cidade Jardim, considerado então “o bairro das famílias ricas de BH”, e pedia ajuda. “Entrava nas festas, ao final tocava piano e depois ganhava adesão”, diz o frei. Era comum ainda ver outros religiosos pelas ruas, batendo de porta em porta atrás dos recursos necessários para a obra. De memória prodigiosa, o engenheiro e arquiteto Ildeu de Oliveira Aguiar, de 87 anos, se lembra bem daqueles tempos. Ele foi o responsável técnico e executor da obra e até se mudou para a Rua Passatempo, onde mora até hoje, para acompanhar melhor o serviço de construção da igreja e de um convento. “Foram três etapas, começando pela igreja, depois pela ala da Avenida Nossa Senhora do Carmo e depois a parte da Grão Mogol.”

Para quem vai às missas e outras celebrações, a melhor definição para a Igreja do Carmo é casa de Deus. “Ela tem uma arquitetura bonita, é bem frequentada, tem participação grande da comunidade, realmente um lugar acolhedor”, avalia a técnica em assuntos educacionais Maria Iara Alkimin, moradora do Bairro Cruzeiro e que se casou nesse templo em 1974. Para a gerente de loja Luiza Dutra, de 28, residente no Bairro Sion, a igreja é um “convite à oração”. Ela fez a primeira comunhão e vai se casar no templo este ano, com missa. “Admiro principalmente os vitrais. Maravilhosos!” Os mais novos estão presentes, a exemplo de Arthur Pereira de Mattos Paixão Neto, de 19, morador do Bairro Serra, na Região Centro-Sul, e estudante de relações internacionais na PUC Minas: “Faço parte do grupo de jovens Eliseu, e comparecer às missas, aos domingos, é muito bom”.

 

Sino doado por JK

(foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
(foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
» Os sinos do campanário foram doados por autoridades, empresários e figuras ilustres de BH: Juscelino Kubitschek, Bias Fortes, José Maria Alkmim, Celso Mello Azevedo, Flávio Gutierrez, Antônio Luciano Pereira e outros. Cada um tem gravado em alto relevo o nome de quem presenteou a igreja e uma frase.

» A Paróquia do Carmo tem quatro bibliotecas: uma aberta ao público, uma específica para crianças, a de obras raras e uma de livros teológicos. Há também uma mapoteca para consulta.

» Os oito livros de hinos religiosos, do século 18, contêm as iluminuras, ou ilustrações coloridas. Quem já assistiu ao filme O nome da rosa vai se lembrar dos monges medievais, os copistas, na biblioteca do mosteiro fazendo esse tipo de trabalho.

» Nos livros de iluminuras há ilustrações de todo tipo. Impressiona a beleza das letras, algumas desenhadas sobre paisagens detalhadas ou com “chinesices”, que são motivos orientais.

» Na década de 1980, todo o acervo da ordem carmelita no país foi transferido para BH, daí o grande número de livros nas bibliotecas.

» Carmo, em hebraico, significa jardim. Dessa forma, Nossa Senhora do Carmo é também Nossa Senhora do Jardim. A Ordem Carmelita surgiu em 1606 no Monte Carmelo, na Terra Santa (Israel).

 

 

Trabalho abnegado

A Igreja do Carmo, com 5 mil metros de área construída, desenvolve diversas obras sociais. O ambulatório atende cerca de 35 mil pessoas por ano. “Mantemos convênio com quatro universidades e dois hospitais, temos farmácia, salas para fisioterapia e acupuntura, antroposofia, homeopatia e gabinete odontológico. As taxas são simbólicas”, diz frei Evaldo. Há curso de alfabetização de adultos, ludoterapia (jogos) para crianças; centro de atendimento ao menor adolescente; assistência jurídica; escola profissionalizante e creches. A igreja tem 50 funcionários e vive de doações.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)