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Estado de Minas

Corregedoria amplia apuração de mortes no Aglomerado da Serra


postado em 25/02/2011 07:26

Um dia depois da prisão dos quatro militares do Batalhão de Rondas Táticas Metropolitanas (Rotam) suspeitos de executar sumariamente o adolescente Jeferson Coelho da Silva, de 17, e seu tio Renilson Veriano da Silva, de 39, a Corregedoria da Polícia Militar volta a apuração para as inúmeras denúncias contra PMs do Rotam e do 22º Batalhão. Ontem, pelo menos cinco policiais prestaram depoimentos para esclarecer as acusações. Entre eles, o cabo Camargos, apelidado de Cabeça de Repolho e lotado no 22º BPM. Ele é apontado por moradores como o mais truculento dos policiais e acusado, inclusive, de comandar uma boca de fumo no Bairro Alto Vera Cruz.

Depois de mais de cinco horas no prédio da Corregedoria, ele saiu sozinho, sem a companhia de advogados, e tampando a identificação da farda. Questionado sobre as denúncias de muitos moradores quanto à sua atuação, preferiu o silêncio sobre as acusações de moradores da comunidade da Serra.

Acompanhando de um defensor, outro dos cinco ouvidos ontem também decidiu tampar a identificação para não ser reconhecido. Na favela, o mesmo recurso é usado, principalmente pelos policiais do Rotam, para não serem identificados por moradores. Por isso passam a ser chamados por apelidos, dificultando a identificação quando cometem abusos. Pouco depois da chegada do militar, compareceu à Corregedoria o capitão Natan, ex-comandante da 127ª Companhia, localizada na Serra, e colega de batalhão, o 22º, de parte dos acusados de cometer crimes graves no maior conjunto de vilas da cidade. Ele só disse que iria acompanhar os depoimentos, deixando o prédio uma hora depois.

Segundo o chefe da comunicação social da PM, tenente-coronel Alberto Luiz Alves, a Corregedoria prioriza a apuração das duas mortes, mas, simultaneamente, verifica caso a caso as denúncias de moradores em relação à atuação de policiais no aglomerado. “É importante que todos que foram apontados sejam ouvidos, mas, por enquanto, os temos como testemunhas”, afirma. Quanto à reação dos policiais ao tampar a identificação, o tenente-coronel considera que “quem não deve nada, não tem o que temer. Mas há pessoas que têm comportamento diferente”.

Entre as acusações que recaem sobre Cabeça de Repolho e pelo menos outros oito militares está a cobrança de propina de traficantes do aglomerado. Toda semana, eles visitariam chefes de 18 bocas de fumo cobrando R$ 1 mil de cada para que os traficantes pudessem continuar atuando sem interferências da corporação. Na madrugada do último sábado, depois de ir a uma boca no Arara – como é conhecida uma região da favela –, eles não teriam encontrado o gerente e, sem o dinheiro, ameaçaram os traficantes que lá estavam. Depois de um desentendimento, os criminosos teriam fugido e conseguido despistar os PMs numa bifurcação de becos. Descendo pela Rua Bandaneon, segundo a versão de moradores, os policiais se depararam com Jeferson e Renilson, que teriam sido executados por terem sido confundidos com traficantes.

Experiente e temendo problemas para seus interesses no aglomerado, segundo o relato de moradores, Cabeça de Repolho teria ido ao local, sem farda, para orientar os acusados quanto à descaracterização do local, uma vez que ele conhecia os dois por serem parentes do cabo Denilson Silva, lotado no mesmo batalhão que Cabeça de Repolho. O cabo Camargos, segundo denúncias, faria apreensões de drogas no aglomerado para revendê-las no Alto Vera Cruz.

Local da morte foi isolado após tiros

Testemunhas ouvidas ontem no inquérito que apura as mortes de dois moradores do Aglomerado da Serra, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, confirmaram à Polícia Civil a versão de que o local do crime foi isolado por policiais militares do Rotam, suspeitos de executar as vítimas, possivelmente para que provas fossem eliminadas. “Eles fecharam os becos com os carros da PM e não deixavam ninguém passar, ordenando que todo mundo voltasse para dentro de casa e fechasse as janelas”, contou um morador do aglomerado. O crime foi na madrugada do último sábado e 22 testemunhas já foram interrogadas pelo delegado Fernando Mirada, da Homicídios Sul. São moradores do aglomerado, vizinhos, amigos e parentes das vítimas.

O primeiro a ser ouvido ontem foi um estudante de 18 anos. Ele conta que estava na Praça do Cardoso com a vítima Jeferson Coelho da Silva, auxiliar de padeiro de 17 anos, e que subiram para um pagode. Algum tempo depois, o tio de Jeferson, o auxiliar de enfermagem Renilson Veriano da Silva, de 39, chegou chamado o sobrinho para ir para casa, pois iriam trabalhar às 5h. O estudante garantiu que as vítimas não carregavam uniformes da PM, como alegaram os suspeitos, e também não tinham armas. O rapaz era colega de escola de Jeferson. Foi ele quem mostrou à polícia as marcas dos tiros no asfalto.

Uma balconista de 22 anos também foi ouvida. Ela e uma irmã estavam em casa e escutaram os tiros. As duas saíram desesperadas para a Praça do Cardoso, com medo de que algo tivesse acontecido com um irmão delas, e foram interceptadas pelos PMs, que estavam transtornados e encostaram fuzis na cabeça das duas mulheres. “Estranhamos muitos, pois a PM não costuma fechar a rua quando alguém é morto. Normalmente, os moradores acompanham todo o trabalho da perícia, mas desta vez eles ordenaram que todos voltassem para casa e que fechassem portas e janela, aos gritos. A abordagem deles foi muito agressiva, afastando todo mundo do local”, disse o marido da testemunha, um motoboy de 23 anos. Ele contou que na quarta-feira à noite, quando a polícia anunciou a prisão dos quatro PMs suspeitos, moradores do aglomerado festejaram soltando fogos de artifício na Praça do Cardoso.

O advogado Ricardo Gil de Oliveira Guimarães, defensor dos quatro PMs, esteve ontem no Departamento de Investigações buscando cópias do inquérito. “Ainda não tive condições de conversar com meus clientes. Vou tomar conhecimento primeiro das acusações. Informalmente, eles disseram que foi uma ação legítima, que homens armados atiraram contra eles e eles se defenderam”, disse o advogado, que também solicitou cópias do Inquérito Policial Militar (IPM), instaurado pela PM.


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