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Bom gosto de família


postado em 24/03/2019 05:07

(foto: Isabela Teixeira da Costa/EM/D.A PRESS)
(foto: Isabela Teixeira da Costa/EM/D.A PRESS)

O dom para o comércio e o desejo de trabalhar foram a mola propulsora da mãe de Berenice Surette, para abrir uma loja em seu apartamento, em uma época na qual a maioria das mulheres não trabalhava. Assim nasceu a butique Mary Caetano, que celebra 50 anos de elegância. Berenice só entrou no negócio depois que teve seus três filhos e que eles chegaram a uma idade que tornava possível uma ausência maior da mãe. Mesmo com toda essa idade, a empresa se rejuvenesceu, é uma cinquentona com corpinho de 18. Hoje, a terceira geração da família já atua no negócio, em um processo de transição suave, da mesma forma que Mary passou tudo para sua filha.
Hoje, as netas já atuam com prazer na butique que não perdeu seu foco: uma loja para mulheres elegantes, acima dos 40 anos, com itens de qualidade e bom gosto.

Como foi sua infância e adolescência?
Normal. Como morávamos ao lado do Minas Tênis Clube – na época só tinha a unidade de Lourdes –, vivia no clube. Jogava tênis, vôlei, nadava, fazia ginástica com o Seu Macedo (quem conhece vai entender o que eu estou falando). Enfim, passava grande parte do tempo lá. Conheci meu marido, Marco Aurélio Surette, no Minas e começamos a namorar muito cedo. Ele tinha 16 e eu 13 para 14 anos, foi o meu primeiro e único namorado, e também nos casamos cedo, eu tinha 18 e ele 21 anos.

Como começou a loja?
Minha mãe, Mary, começou sua vida comercial no nosso apartamento, vendendo produtos importados, dos quais 90% eram novidades. Na época, Maria Eunice Medrado também tinha uma loja em sua casa, com os mesmos produtos, inclusive compravam nos mesmos fornecedores do Rio de Janeiro, que eram pessoas que viajavam e traziam as peças. Desde o começo atendia a uma classe média alta. As duas não eram sócias, porém traziam produtos dos Estados Unidos de meia, em “tranques”, tipo os contêineres atuais. Elas compravam juntas de importadores e dividiam a mercadoria ao meio. Eu tinha uns 12 anos quando ela começou. A loja é fruto de seu grande desejo de trabalhar, e de seu dom que sempre foi o comércio.

O que era vendido?
Enxoval, lingerie americana e italiana, vestuário, enfim, todo e qualquer produto importado utilitário para casa que não se encontrava por aqui. As clientes eram mulheres da sociedade, classe AB, as coisas não eram baratas e ela vendia tudo. Hoje, tem pessoas que vem à loja e dizem que a avó comprou o enxoval da filha com minha mãe. Ela ficou alguns anos com a loja em casa. Eu era pequena, estudava e por isso nunca ajudei. Depois ela passou a vender roupas das melhores marcas que existiam, como Gucci, Emílio Pucci, Chanel, Belini. As aeromoças traziam as peças, deviam comprar com preço bom no exterior, e minha mãe comprava tudo para revender.

O que a levou a abrir a loja?
Loja em casa é uma coisa muito difícil. Éramos meu irmão Eduardo, eu e meus pais. Era um entra e sai de mulheres, até que um dia meu pai, Alberto Caetano, falou que não dava mais para ficar ali, porque estavam criando a família e o apartamento não era enorme, e que se ela realmente quisesse continuar mexendo com loja, eles procurariam um local mais adequado. Nessa época, a Savassi estava começando, estava o máximo, e eles decidiram comprar uma loja por ali. Mas as coisas quando têm de acontecer Deus fala amém. Um dia, um amigo de meu pai viu que a casa que ocupamos hoje, que era dos Marçola e estava à venda. Decidiram comprar a casa e chamaram a Consuelo Garzon para fazer a reforma. Mas reforma de casa antiga consome muito dinheiro, foi pesado porque investiram muito mais do que previam. Ele gastou quase tudo o que tinha na época. Mas tinha que ser uma loja muito elegante por causa do tipo de clientela que minha mãe tinha. O negócio da Mary sempre foi o comércio, ela dizia que nos amava, e que tinha tido só dois filhos porque não tinha muita paciência. Já quis abrir uma lanchonete na Savassi quando não existia nem o Xodó. E a vida foi encaminhando e a colocou nesse ramo. Na época em que abriram a loja eu já era casada e tinha duas filhas – tenho um rapaz também.

E você foi trabalhar com ela?
Não, estava com os filhos pequenos. Meu marido, Marco Aurélio Surette, trabalhava com mercado de capitais, mas sempre teve muito jeito para o comércio e minha mãe o chamou para ajudá-la a fazer uma butique bacana, ela ficaria com a parte feminina e ele criaria uma área para roupas masculinas. O lado feminino ficou bem maior, porque já tinha uma grande clientela, e o masculino em espaço menor, mas muito bem montado, com coisas lindas.

Surette mergulhou de cabeça?
Sim. A família dele é de comerciantes, e ele herdou esse gen. Foi desbravando essa área, porque na época não existia nenhuma loja boa de roupa masculina. Marco Aurélio ia para São Paulo e trazia roupas da Elle et Lui, Dijon, todas as marcas importantes do mercado. Foi uma das melhores lojas do segmento durante anos. A sociedade masculina em peso comprava aqui. Ele sempre foi muito simpático, fez amizade com os colunistas sociais, Eduardo Couri e Wilson Frade, entre outros, e eles deram muita força para nós. Os jogadores de futebol vinham aqui. Ele fazia, há mais de 40 anos, o que hoje é muito comum, pequenos coquetéis na loja, para segmentos específicos. Um dia chamava médicos, no outro, advogados, engenheiros, e todos vinham. Ele ficou amigo das pessoas.

Quando você entrou?
Pouco tempo depois, quando meus meninos cresceram mais. Acho que somos a única loja que está no mercado há 50 anos, conseguimos ficar no mercado inovando sempre, e isso é difícil, quantas crises nós enfrentamos em cinco décadas... Plano Bresser, Collor, Real, cada hora era uma coisa, e nós enfrentando tudo isso com muita dificuldade. Meu pai, como mexia na área financeira, sempre ajudava muito e conseguíamos sair dessas crises.

Como era trabalhar com sua mãe?
Muito bom. Sempre fomos muito amigas e nos dávamos muito bem. Ela me levava para fazer as compras e sempre perguntava a minha opinião. Me passou todos os seus conhecimentos na área. Foi um tempo delicioso, de união e cumplicidade. Às vezes ela entusiasmava demais, não foram poucas as vezes em que  comprava algumas roupas dizendo “se não vender pelo menos vai dar uma vitrine maravilhosa”, e eu a trazia para a realidade. Naquela época se permitia isso, hoje o pensamento é completamente diferente. Na época do Eduardo Couri fizemos uns dois desfiles grandes no Automóvel Clube em benefício da Jornada Solidária Estado de Minas, e ela gastava uma fortuna comprando só roupas importadas de primeira linha. Tinha a Maria Italiana, quem comprava peças dela era o top do top. Nunca brigamos por ter gostos diferentes. Ela foi muito sábia, e como sempre teve uma personalidade muito forte, soube a hora certa em que precisou afastar um pouco para que eu tivesse mais espaço. Ela soube fazer essa transição muito bem, de forma tranquila e sutil.

E a expansão?
Quando o BH Shopping abriu, nos convidaram para ter uma loja lá. Abrimos a butique e ficamos 20 anos lá, porém a roupa da loja não condizia com o público do shopping. Pagávamos um aluguel e um condomínio caríssimos e quem frequentava o local não consumia tanto quanto deveria. Nossos clientes preferiam a loja da Cláudio Manoel. Quando abriu o Diamond Mall fomos convidados, e por ser um shopping menor e mais elitizado, abrimos uma filial, que funcionou por cerca de 12 anos. Chegamos à conclusão de que nosso lugar não é shopping e abrimos a loja de Lourdes. Ficamos uns 12 anos com a maison de Lourdes. Meu pai faleceu e meu irmão assumiu a área administrativa e financeira da Mary Caetano. Quando começou esta crise que estamos vivendo até hoje, Eduardo fez uma análise e decidimos fechar a loja e ficar só aqui no Bairro Funcionários, enquanto estávamos bem capitalizados. Esta sempre foi a loja que mais vendeu e o espaço aqui é muito grande.

Hoje, são você e seu irmão cuidando de tudo?
Nós somos os donos, aqui é uma empresa bem familiar, mas minha filha Luciana está conosco há quase 20 anos, me ajudando em tudo, ela é meu braço direito. Se eu quiser parar de trabalhar e ficar só conversando ela dá conta do recado direitinho. Duas cabeças funcionam melhor que uma. Tive a felicidade de ter uma filha que gosta do negócio, e com isso sabemos que se precisarmos parar por causa de doença ou pelo peso da idade, já temos a continuidade. Minha mãe sempre disse que estava montando uma empresa para deixar para nós, diante disso fez da melhor forma possível e isso deu a minha missão, levar esta loja até o fim. Por sinal, as coisinhas mais chatas como reposição e devolução de mercadoria já passei para ela. Minha sobrinha Paula, filha de Eduardo, que morava em São Paulo voltou para Belo Horizonte e agora também trabalha conosco. Apesar de ser jornalista, é ela quem cuida da área da Lenny Niemeyer e das nossas redes sociais.

Fizeram uma reformulação abrindo espaços especiais. Como foi isso?
O que garante todo esse tempo de existência, além da qualidade do produto e no atendimento, é estar sempre se atualizando e modernizado, sem, contudo, perder o foco. A Lena Pinheiro fez um novo projeto e decidimos abrir três espaços separados para algumas marcas. A primeira que veio foi a Lenny. Quando fecharam a loja de Lourdes, nos propuseram trazer a marca pra cá. Achamos interessante. Como nunca trabalhamos com moda praia, achamos que seria melhor criar um espaço separado para eles, deu muito certo e aí decidimos criar “córneres” para outras marcas. A loja adquiriu uma nova cara, mais moderna, mas nosso foco é atender a mulher acima dos 40 anos, com roupas elegantes.

E como atravessaram esta crise?
A crise ainda não acabou, estamos vivendo ela há cinco anos, mas estamos bem, graças à nossa clientela fidelizada. Representantes e até clientes perguntam se não temos crise na empresa, porque sempre tem gente na loja. Respondo que temos sim, mas que temos que saber trabalhar com a crise. Estar  aqui, no mesmo local, há 45 anos, olha o tanto de gente que nos conhece nesse tempo todo e acabam falando para as amigas. Para quem está firme no mercado a chance de continuar é muito grande em relação a quem está começando, porque temos uma história muito grande que começou com minha mãe, passou pelo meu marido e continuou comigo. Agora, já está vindo a terceira geração e elas têm tudo para levar a loja para frente.

Esta casa foi tombada. Atrapalhou para vocês?
Foi sim, há dois anos. A casa é de 1911. Tivemos que voltar algumas partes no estilo da época, mas conseguimos um bom acordo para não ter que colocar janelas, para não escurecer muito o espaço interno, foi possível manter as vitrines, mas tivermos que colocar grades, mexer na pintura. Vale a pena porque o imóvel é muito bonito e tem uma história importante na arquitetura da cidade.

Quais os novos planos?
Com certeza não abriremos nenhuma outra loja, mas queremos abrir mais um espaço exclusivo para uma grife que ainda estamos escolhendo, para o próximo verão. Temos que selecionar bem, porque o tiro tem que ser certeiro, é o risco calculado. O mais importante de tudo isso é manter o amor no que fazemos, e não deixar que o maior patrimônio que nossos pais nos deixaram, que é a loja e nome forte criado pela mamãe, perca o peso e a qualidade. Temos clientes de uma vida. Há pouco tempo, tivemos duas clientes de 100 anos cada uma. Um delas, a filha veio primeiro, escolheu algumas coisas e depois voltou com a mãe, que chegou aqui toda animada dizendo que não queria nada de velha. Nosso foco é continuar atendendo nossas clientes cada vez com mais qualidade.


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