Felipe Salto

Com a apresentação das novas regras, Felipe Salto avalia que agora a equipe econômica ganha fôlego para apresentar novas medidas, como a reforma tributária

Marcelo Camargo/Agência Brasil/Divulgação - 10/9/17

As linhas gerais do novo arcabouço fiscal apresentadas pelos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, na quinta-feira, agradaram o mercado por unir as partes positivas de duas âncoras fiscais: a meta de superavit primário e o teto de gastos, na avaliação do economista-chefe da Warren Rena, Felipe Salto. Mas a proposta não garante ao governo zerar o rombo das contas públicas em 2024, como previu o ministro.

O especialista em contas públicas que criticou a modelagem rígida do Teto de Gastos, quando ele foi aprovado, em 2016, elogiou o novo arcabouço fiscal. Segundo ele, a nova regra fiscal é um "divisor de águas", contribuindo para o avanço de agendas mais complexas. Ele ressalva, no entanto, que “não existe regra fiscal perfeita, nem a regra fiscal sozinha vai resolver os problemas estruturais da economia brasileira, nem das contas públicas”.

“Há uma regra de gasto. Ela tem uma essência importante, que é o controle baseado na trajetória da receita, mas tem também uma banda. O gasto não pode crescer nem menos do que 0,6%, nem mais do que 2,5%, descontada a inflação (em termos reais). Esse conjunto de regras agradou, porque, mesmo que o governo não consiga toda a receita adicional para produzir esse resultado primário positivo, essa trajetória é muito positiva. Mas zerar o deficit, já no ano que vem, acho muito difícil”, diz Felipe Salto. Para ele, o ministro Fernando Haddad conseguiu marcar um ponto porque, na sua avaliação, o arcabouço fiscal dá força para a equipe econômica avançar em outras pautas mais complexas, como a Reforma Tributária.

Salto criticou a regra do Teto de Gastos por ela associar o controle de gastos à inflação passada, mas não apresentar uma válvula de escape para casos de necessidade de descumprimento da regra, limitando-se às despesas colocadas fora do teto, mais conhecidas como extrateto e que foram necessárias nos últimos anos. “Agora é diferente, porque eles colocaram, sim, uma regra de gasto. Então, você tem aí a essência do controle da despesa, mas fizeram algo fundamental, que é conferir a flexibilidade necessária à regra”, afirma o economista-chefe da Warren Rena. Ele destaca ainda que “essa flexibilidade vem justamente da ligação com a receita. Então, quando a receita cresce mais, você pode ter um gasto crescendo mais, até um certo limite. Esse aprimoramento que foi feito, na lógica do controle de gastos, é muito importante”.

Para o economista da Warren, a divida pública brasileira continuará crescendo e o governo não conseguirá zerar o déificit público no ano que vem. “A trajetória da dívida pública bruta projetada pela Warren no cenário base mostra que, até 2032, a dívida pública bruta continuará crescendo, chegando a 95,3% do PIB”, revela o economista ao apontar que com a nova regra fiscal a perspectiva e de que a dívida pública esteja cerca de 10 a 12 pontos abaixo da projeção original, ou seja, entre 83,3% e 85,5%. do PIB em 9 anos. Quando ao déficit público, Salto não acredita que ele será zerado no ano que vem. “O deficit primário não será zero no ano que vem, a não ser que venha um volume expressivo de receitas. O deficit tende a ficar em torno de R$ 100 bilhões a R$ 110 bilhões, já projetado como resultado dessa nova regra fiscal, pelas contas que eu fiz na quinta-feira”, diz o economista referindo-se ao dia da divulgação do novo arcabouço fiscal.

Riscos

Como o ajuste proposto prevê não apenas o controle das despesas, mas também o lado da receita, o governo ainda terá que detalhar de onde virão os recursos. “Existe um risco de haver a dificuldade de comportar as despesas que já estão contratadas na regra de gasto que foi proposta, de 70% do crescimento passado da receita líquida. Logo, se a receita líquida não estiver crescendo muito, o gasto também não poderá crescer muito”, diz Felipe Salto. Para ele, a proposta é muito pró-cíclica, o que obrigou o governo a criar a banda entre 0,6% e 2,5% de crescimento real da receita. “Não tem mágica, não vai ter uma lei complementar que, ao ser aprovada, vai levar o Brasil à austeridade fiscal ou à responsabilidade fiscal como um passe de mágica. O que precisa haver é o compromisso político em torno da regra. Mas o primeiro passo foi dado”, acrescenta Salto.

Mercado

O economista-chefe da Warren Rena avalia que o ajuste apresentado pelos ministros do Planejamento e da Fazenda teve boa aceitação no mercado financeiro sobretudo por apresentar uma regra para controlar os gastos. “Acho que, na média, agradou (ao mercado). Houve algumas opiniões mais céticas, sobretudo em relação ao peso que a arrecadação terá na trajetória de resultado primário que o governo está se comprometendo a realizar. No entanto, há uma regra de gasto. Ela tem uma essência importante, que é o controle baseado na trajetória da receita, mas tem também uma banda”, afirma Salto. “A nova regra já produz uma melhora expressiva na trajetória da dívida”, aponta o economista como outro motivo para a reação positiva do mercado.