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Estado de Minas AGRONEGÓCIO

Com propriedades terapêuticas, busca por própolis verde aumenta na pandemia

Produção em Minas Gerais é de 120 toneladas por ano, sendo 85% do própolis verde e 15% do própolis de cor escura. Atividade gera 45 mil empregos em 580 cidades


26/06/2021 04:00 - atualizado 14/07/2021 13:56

O apicultor Dalisson Sena aumentou a produtividade nas colmeias... (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
O apicultor Dalisson Sena aumentou a produtividade nas colmeias... (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
A própolis verde de Minas Gerais tornou-se produto disputado no mercado internacional. Devido a características de solo, clima, planta e abelhas, a resina contém uma substância chamada artepelin C, que vem despertando a atenção da comunidade científica mundial em função de sua ação no organismo humano. Ela potencializa o sistema imunológico contra várias doenças infecciosas, como câncer, gripe, e agora estudos apontam também a COVID-19.

Uma publicação da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), da Universidade de São Paulo (USP), em janeiro, mostrou ensaio clínico para avaliar a eficácia do extrato de própolis em 124 participantes internados no Hospital São Rafael, de Salvador (BA). O resultado indicou que a própolis pode reduzir o tempo de internação.

Todos os pacientes fizeram tratamento-padrão,  sendo que 40 pessoas receberam 400mg/dia de própolis; 42 receberam 800mg/dia; e 42 não receberam própolis. “A administração oral da substância foi segura, pois não houve eventos negativos associados ao uso. Além disso, a diminuição do tempo de internação após a intervenção foi significativa. O grupo de controle, que não ingeriu própolis, ficou 12 dias hospitalizado após o início do tratamento. Já os grupos que receberam doses mais baixas e mais altas ficaram, respectivamente, 7 e 6 dias internados”, explica David de Jong, professor da FMRP/USP e um dos autores do estudo.

A própolis é um antibiótico natural com ação antibacteriana, antifúngica, cicatrizante, antioxidante, anestésica e imunoestimulante. É exportada para 31 países. Estima-se que Minas Gerais produza por volta de 120 toneladas/ano, sendo 85% própolis verde e 15% própolis de cor escura. A produção da própolis verde abrange 102 municípios, distribuídos no Sul, Centro-Oeste e Leste do estado. As regiões produtoras apresentam solo ácido e altos teores de ferro, característicos de locais com exploração de minério.

Produção

A maior parte da produção vem de agricultores familiares. Dalysson Romualdo de Sena, de 49 anos, farmacêutico, é de um grupo de apicultores da região de Nova União, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Começou a estudar as abelhas aos 19 e atribui "todas as conquistas", ao trabalho com os insetos. "Construí minha casa, expandi meus negócios, me formei e constitui família."

Mesmo com foco no Mel Tio Zé, Dalysson também produz a própolis verde. Mas relata que existem apicultores que têm o mel como subproduto, e a própolis é a meta principal. “Mais comum no Norte de Minas, o manejo para produção de própolis é diferente, e não é simples. É preciso escolher a rainha geneticamente.” Em seu apiário, em torno de 30% do plantel é produtor da própolis verde. Ele produz 18 quilos/ano e seis toneladas de mel.

O produto é uma resina natural que a abelha usa para proteger as colmeias. Sua composição varia de acordo com a área geográfica. Os diferentes tipos de plantas das quais é recolhida. A verde é obtida nos locais onde a presença do alecrim-do-campo (Baccharis dracunculifolia), mais conhecida como vassourinha, é abundante. A planta era considerada até então erva daninha.
 
Sena também ampliou a oferta de seus produtos durante a pandemia e já tem pelo menos metade de sua produção feita por encomenda (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Sena também ampliou a oferta de seus produtos durante a pandemia e já tem pelo menos metade de sua produção feita por encomenda (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Uma colmeia pode abrigar até 80 mil abelhas que coletam néctar e pólen. Algumas operárias são responsáveis pela extração de resinas medicinais produzidas pela planta. Fabricam o própolis em massa, matando fungos e bactérias da colméia. Quando capturam inseto invasor, cobrem o cadáver com própolis para mumificá-lo e evitar apodrecimento e contaminação ambiental.

Atividade gera emprego e renda em todo o estado

De acordo com a Federação Mineira de Apicultura (Femap), a atividade apícola está presente em 580 municípios mineiros. Gera em torno de 45 mil empregos diretos e indiretos no estado. A própolis verde é exclusiva do Brasil, e é produzida pelas abelhas africanizadas brasileiras (não nativas).

Até o ano de 1985, a própolis não tinha valor comercial e era considerada problema para a apicultura.  Os apicultores faziam a limpeza das colmeias e descartavam a resina, por dificultar o manejo.  Através das descobertas científicas, a partir de 1986 o valor da própolis verde de Minas Gerais passou a ser percebido pelo mercado, que se abriu para compras e vendas.

Em 1989, ocorreu a Apimondia, no Rio de Janeiro, maior evento internacional de apicultura. Nesse evento, empresas de várias partes do mundo conheceram a própolis verde de Minas Gerais e suas propriedades farmacológicas. Em especial, compradores do Japão e da China.

Na década de 90, produzia-se em média 200 gramas de própolis ao ano por colmeia. Hoje, produz-em 1kg/ano em média, podendo chegar a até 1,5kg. Com uma qualidade muito superior, explica Frederico Ozanan de Souza, assessor especial de apicultura da Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas (Seapa).

De acordo com Cézar Ramos Júnior, presidente da Federação Mineira de Apicultura (Femap), “graças ao empenho de vários pesquisadores do Brasil e de vários especialistas, a própolis verde de Minas Gerais e a própolis vermelha, dos mangues do litoral do Nordeste do Brasil, estão recebendo notoriedade internacional em função de intenso trabalho em nível mundial, em que estamos estudando, pesquisando e discutindo seus padrões qualitativos junto ao Sistema ISO internacional”.
 
A partir de 2007, o Sebrae Minas desenvolveu projetos com produtores e prefeituras do centro-oeste mineiro e norte de Minas. Danielle Fantini, analista de agronegócio do Sebrae, explica que o Sebrae apoiou o processo de reconhecimento da Indicação Geográfica. As Indicações Geográficas se referem a produtos ou serviços que tenham uma origem geográfica específica. Seu registro reconhece reputação, qualidades e características que estão vinculadas ao local.
 
No ambiente da própolis verde, o trabalho do Sebrae envolve parte técnica e gestão do negócio. Com pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveram fórmulas para alimentação das abelhas quando faltar néctar e técnicas de manejo de apiários, como troca de rainhas.  
 
A apicultura é um setor onde as cadeias produtivas primária, secundária e terciária ainda não estão bem definidas, explica Ramos. “O volume de comercialização sem notas fiscais ainda é grande. A própolis não tem Nomenclatura Comum Mercosul (NCM) definida – nome dado para um código utiliza do na designação de mercadorias que circulam nos países que fazem parte do Mercosul. Devido a essa condição, não temos dados estatísticos precisos sobre o volume produzido e comercializado.”

Demanda

O apicultor Luiz Amorim, do Apiários Amorim, no Distrito Federal, que atende ao mercado interno, principalmente de Minas, Bahia, DF e Goiás, conta que houve um aumento de 200% na procura dos produtos da apicultura durante a pandemia. “Com esse despertar da população, o foco, que era o mel, passou para a produção de própolis. São 55 quilos/ano por colmeia." Ele procurou produtores de Minas para atender ao aumento da demanda relativa à própolis. Amorim diz que a substância deve ser ingerida uma vez por dia, conforme o peso da pessoa – uma gota por quilo. “Para quem acha o sabor muito forte, pode dividir em duas vezes por dia, ou mesmo tomar com sucos”, recomenda.

Cezar Júnior conta que alguns países, como Estados Unidos, até os anos de 1980, focavam as abelhas em polinização e produção de mel. "As constantes interferências genéticas fizeram com que as abelhas se esquecessem como produzir a própolis, causando grandes doenças e obrigando ao uso de medicamentos, como antibióticos, contaminando a cadeia produtiva. Ao contrário do Brasil, onde as abelhas europeias cruzaram com as africanas e se tornaram mais produtivas e extremamente resistentes a doenças, a tal ponto que os apicultores não utilizam medicamentos para tratamento do inseto."
 

Mercado procura classificação

O interesse mercadológico do setor de apicultura em se inserir nas discussões da ISO sobre normas para avaliar a qualidade da própolis impulsionou a Associação Nacional de Normas Técnicas (ABNT) a reativar a Comissão de Estudo Especial da Cadeia Apícola em 2020. Hoje, a comissão representa os interesses brasileiros nas discussões de normas internacionais ISO e, pela primeira vez, o país tem papel de destaque em âmbito internacional, atuando como mediador das discussões de grupo técnico coordenado pela China. O papel ficou a cargo da presidente da Associação Brasileira de Exportadores de Mel (Abemel), Andresa Berretta.
 
Discussões podem levar a nova normatização para criação de abelhas e fabricação de produtos apícolas(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Discussões podem levar a nova normatização para criação de abelhas e fabricação de produtos apícolas (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Para o coordenador da Comissão de Estudo Especial da Cadeia Apícola, Ricardo Camargo, o interesse do Brasil é de ser um ator mais atuante neste processo. A comissão entende que as discussões globais também servirão como arcabouço teórico para que o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) atualize os Regulamentos Técnicos de Qualidade (RTQs) de própolis, que datam de 2001.

Segundo especialistas, os projetos de normas técnicas em andamento podem ajudar o órgão oficial de regulamentação e fiscalização de produtos das abelhas a reduzir a defasagem em termos de indicação de métodos analíticos e parâmetros. “Com este trabalho paralelo e autônomo na ABNT, é possível caminhar de forma mais ágil e disponibilizar esta norma técnica, após publicada, como uma base referencial para os RTQ da própolis. Promovendo, dessa maneira, uma atualização que será bastante benéfica internamente”, complementa Ricardo.


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