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Estado de Minas REAL, SÍMBOLO DA IDENTIDADE DO BRASIL

Governo está errado em culpar a economia externa, diz economista


postado em 02/07/2014 06:00 / atualizado em 02/07/2014 07:51

(foto: Instituto Millemiun/Divulgação )
(foto: Instituto Millemiun/Divulgação )
Mais do que um plano de estabilização, o Real foi resgate de um símbolo da identidade nacional, na avaliação de um dos principais atores do processo, o economista Gustavo Franco. "A moeda tem uma importância comparável à bandeira e ao hino. Ela vinha sendo enxovalhada de um jeito inadmissível", afirma.

Com doutorado na universidade de Harvard, nos Estados Unidos, Franco era secretário-adjunto de Política Econômica quando o plano foi criado. A partir de 1995, tornou-se diretor da Área externa do Banco Central (BC) e, entre 1997 e 1999, presidente da instituição.

Um dos idealizadores da Unidade Real de Valor (URV), mecanismo essencial para a conversão dos valores ao novo padrão monetário, Franco afirma que a atual escala de preços, "ainda que em nível moderado", está muito acima do que deveria ser tolerado.

Os problemas que o Brasil atravessa, diz, devem-se sobretudo ao abandono do tripé econômico - meta de inflação, câmbio flutuante e superávit primário.  


Qual é sua avaliação dos 20 anos do Plano Real e que legado foi deixado nesse período?
Minha avaliação é positiva, claro. São 20 anos em que há um legado do resgate de um dos mais importantes símbolos nacionais. A moeda tem uma importância comparável à bandeira e ao hino. Ela vinha sendo enxovalhada de um jeito inadmissível, havia muitos anos. A recuperação da moeda é um projeto maravilhoso de recomposição da nossa própria identidade. O principal legado é a cultura da estabilidade de valores que passou a fazer parte do imaginário global da população. Estávamos em um caminho perigoso, em que a inflação alta e o tumulto econômico eram como que parte da normalidade. O Real restaurou uma nova normalidade, uma nova maneira de ver a vida muito melhor, e acho que isso é para sempre.

Quais foram as principais batalhas travadas nestes 20 anos?
Tivemos duas batalhas muito definidas contra a inflação. Uma, durante a URV, que trouxe a inflação de 2.000% ao ano, nos últimos meses que precederam o plano, para 33%, que foi a inflação anual dos primeiros 12 meses de vida da moeda. Essa foi a primeira batalha, uma guerra que entregamos alta tecnologia, que foi a URV, um instrumento pouco convencional e que funcionou muito bem. Mas trazer 33% para 1,5% foi uma guerra de infantaria, de corpo a corpo e do convencimento. Foi importante desindexar as mentes para termos uma inflação de Primeiro Mundo. Essas duas batalhas são parte de uma guerra maior na qual o que está em jogo é o desenvolvimento brasileiro. Aí fizemos reformas que, no começo, eram parte da batalha contra a inflação. É uma pena que as reformas foram perdendo seu impulso e, se hoje, a gente enfrenta deficiências, elas têm muito a ver com o fato de termos fraquejado no esforço das reformas. Economia é um organismo dinâmico. Se não houver reformas, ela tende a estagnar. Tem que manter o ritmo de mudanças.

A estabilidade econômica conquistada com o Plano Real está ameaçada?

Claro que está ameaçada e não existe maneira de resolver os problemas atuais de uma vez e para sempre. A doença atual passa pelo desleixo com a política fiscal. A inflação é pequena comparativamente à do passado, mas mexe muito com as pessoas. Não há dúvida de que existe uma memória séria e nítida que, talvez, se pareça com o alcoolismo, que não tem cura.

Qual o pecado que não pode ser cometido para não enfraquecer ainda mais a moeda?

Acho que hoje em dia temos vários pequenos pecados que, em outra época, foram maiores e nos levaram a uma inflação grande. O principal deles é o desequilíbrio nas contas públicas. O descontrole nessa região coloca em perigo a Constituição inteira. Coloca o Banco Central em uma posição delicada de compensar os problemas fiscais com a política de juros, o que não é uma combinação correta. Só que o BC está cumprindo o seu dever dentro de um quadro adverso. Ele não é o culpado do problema. Ainda bem que temos uma instituição comprometida com a correção desses desvios de rota.

Como o senhor vê o fato de a inflação média dos últimos três anos está próxima de 6,5%?

A inflação, ainda que moderada, é mais dolorida em uma economia desindexada. O Brasil melhorou muito, fez muitas conquistas, mas não é uma obra pronta. É preciso, permanentemente, usar a criatividade e ultrapassar fronteiras. Estamos um pouco devagar no aspecto de superar desafios. Mas o legado do Real permanece, e pode ser melhor ou pior conduzido. Isso é da natureza da democracia: diferentes governos vão tratá-lo melhor ou pior.

Por que há tanta desconfiança do empresário e do consumidor hoje em relação à economia?

O que aconteceu foi a formação de um consenso forte de que as políticas econômicas do governo Dilma Rousseff buscaram desafiar os consensos internacionais de política econômica que o Brasil tinha adotado até meados do governo Lula. Ninguém mexia no tripé formado pela meta de inflação, pelo câmbio flutuante e pelo ajuste fiscal. Em algum momento, a presidente resolveu desafiar esse conjunto e essa desconfiança se generalizou. Foi um consenso que se estabeleceu de que o conceito está sendo abandonado. O pessimismo se deve a essa mudança. O governo está errado em culpar a economia externa. É um equívoco. O cenário internacional não variou tanto assim e, ademais, o Brasil é uma economia muito fechada. Por causa disso, é difícil culpar o que está acontecendo lá fora pelo que estamos passando aqui. Quem está irritado é o investidor brasileiro.

Como avalia o cenário econômico para os próximos anos?
Este ano está muito prejudicado com relação ao futuro. Isso teve um efeito paralisante de decisão de investimento e tende a se prolongar para mais algum tempo até que as eleições definam o novo governo. A maior parte trabalha com cenários polares da manutenção da atual política e da renda, associando à vitória ou não da oposição. Evito fazer previsões. Mas minha impressão (da economia) não é boa.


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