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Estado de Minas

Inflação já reflete no bolso e muda hábitos de brasileiros

Para pôr comida na mesa, as famílias têm sido obrigadas a mudar hábitos e a se sacrificarem mais do que antes


postado em 21/03/2014 06:00 / atualizado em 21/03/2014 09:15

Empresário Bernardo Haddad e a esposa costumavam sair para jantar duas vezes por semana. Passeio agora passou a ser quinzenal(foto: Beto Magalhães/EM DA Press)
Empresário Bernardo Haddad e a esposa costumavam sair para jantar duas vezes por semana. Passeio agora passou a ser quinzenal (foto: Beto Magalhães/EM DA Press)
Sem dar ouvidos aos discursos oficiais e pouco interessados se o índice de inflação está ou não dentro da meta do governo, os brasileiros andam mesmo apreensivos com o incontestável aumento de preços nas prateleiras. Para pôr comida na mesa, as famílias têm sido obrigadas a mudarem hábitos e a se sacrificarem mais do que antes. Este mês, a seca castigou as lavouras e o bolso do consumidor: hortaliças, legumes e frutas, principalmente, não param de encarecer.

Pesquisa do instituto Data Popular divulgada com exclusividade para o Estado de Minas comprova a inquietação do consumidor na hora de ir às compras. Os alimentos lideram a lista de grupos de despesas que mais subiram de preço, na percepção dos entrevistados. Para 61% deles, os reajustes nessa cesta de produtos foram os que mais incomodaram no último ano. Em seguida, a maior parte dos brasileiros diz ter sentido a inflação em itens de limpeza (59%), de educação (56%) e em roupas (52%).

Não há como fugir da avaliação de que o dinheiro das famílias está mais contado neste início de 2014. “O que estamos vivendo é resultado de um processo em que os salários não conseguem acompanhar os preços dos produtos, que seguem encarecendo em uma velocidade significativa”, comenta o diretor do instituto, Renato Meirelles. A pesquisa escutou 2.017 pessoas em 53 municípios espalhados por todas as regiões do país.

Anestesiadas com a inflação, 56% das famílias das classes D e E começaram o ano fazendo mais pesquisa de preço do que em 2013, aponta o mesmo levantamento. Entre entrevistados da classe C, esse índice recua para 50% e, na faixa de maior renda, para 49%. “O problema é que não adianta muito. Os preços subiram em todos os lugares, é algo disseminado”, observa a aposentada Irani Couto, 64 anos, que na tarde de ontem, dia de promoção no sacolão, fazia contas para encher o carrinho. “Inflação sob controle? Isso não existe. Ninguém está conseguindo segurar nada”, afirma a aposentada. A visita a supermercados diferentes, completa ela, só tem valido a pena para garantir os alimentos de melhor qualidade.

Troca de marca Com os constantes saltos de preços, sublinha a pesquisa do Data Popular, a maioria dos consumidores (59%) não escapa mais da alternativa de trocar a marca do produto para tentar manter a conta no orçamento. Quase um terço dos entrevistados confessa ter diminuído a quantidade de itens no carrinho. E 10% simplesmente deixaram de comprar. “Não tem outro jeito a não ser levar somente o necessário”, diz o segurança Jacinto Lopes, de 55.

O empresário Bernardo Haddad, de 34, reduziu as idas ao restaurante em razão do aumento do custo de vida no país. Pelo mesmo motivo, dona Maria Alice Ramalho, de 51, deixou de passear com a família, este mês, em Caldas Novas (GO). Como eles, muitos brasileiros mudaram hábitos e adiaram sonhos em razão da disparada dos preços de produtos e serviços. Nos últimos 12 meses, o Índice de Preços Amplo ao Consumidor (IPCA), que é a inflação oficial do Brasil, acumula alta de 5,68%. O indicador está distante da meta estipulada pelo governo, de 4,5% ao ano.

 “Está tudo ficando mais caro. Apenas para dar um exemplo: o quilo da batata que eu comprava por R$ 2, há poucas semanas, agora está R$ 4”, reclama dona Maria Alice, que mora com o marido e a filha. Na última segunda-feira, uma pesquisa do site Mercado Mineiro mostrou que o quilo da batata disparou 45,15% entre janeiro e março, de R$ 2,68 para R$ 3,89. Percentual maior (51,89%) ocorreu com a beterraba, cujo quilo foi de R$ 2,64 para R$ 4,01. Resultado: dona Maria Alice reduziu as compras no sacolão. Muitas frutas tiveram os preços reajustados em dois dígitos.

Frutas caras

Na Ceasa Minas, por exemplo, o grupo das frutas ficou 28% mais caro na comparação entre os 75 primeiros dias de 2014 e o mesmo período de 2013. O preço de algumas frutas foi reajustado bem acima da média, como a maçã (74%) e a melancia (38%). “Diminuímos a quantidade de produto que comprávamos, principalmente de frutas, verduras e legumes, que ficaram bem mais caros”, lamentou a mulher. A renda mensal na casa dela é de R$ 3 mil. Em março, eles planejaram conhecer as térmicas de Caldas Novas, mas tiveram de adiar o plano em razão do aumento do custo de produtos e serviços indispensáveis ao lar.

Bernardo Haddad, o empresário que reduziu as idas a restaurantes, também adiou o sonho de comprar um carro novo: “Iria dar um terço de entrada e financiar o restante, mas os juros ficaram mais altos”. No Brasil, a taxa de juros é ditada pela Selic, que está em 10,75% ano ano. Há um ano, a Selic estava em 7,25%. Os sucessivos aumentos da taxa refletiu no avanço dos juros das linhas de crédito. A disparada dos juros levou Bernardo a adiar a compra do carro. Mas o aumento do custo de vida o levou a mudar um hábito: “Eu e minha esposa íamos duas vezes por semana a restaurantes. Agora vamos uma vez a cada quinzena. Demos uma segurada. A cerveja ficou mais cara, as porções…”, disse o empresário.

Fora do lar O custo da alimentação fora do lar acumula alta acima da inflação. No bimestre, enquanto o IPCA ficou em 1,24%, o gasto com idas a restaurantes encareceu 1,95%. Quem faz as refeições em casa também está gastando mais. Balanço da Prefeitura de Belo Horizonte mostra que a cesta básica aumentou 4,8% entre 17 de fevereiro e o mesmo dia de março, de R$ 553,72 para R$ 580, 62.

 

Armas contra o dragão

 

O festival de aumento dos preços dos alimentos levará o governo a tomar medidas para atenuar a dispersão da carestia pela economia. Em reunião prevista para terça-feira, a câmara técnica do Conselho Interministerial de Estoques Públicos de Alimentos (Ciep) determinará a venda de estoques de passagem de milho para abastecer algumas regiões, sobretudo Nordeste, e discutirá ações em alimentos básicos, como o feijão, afetado pelo clima nas principais áreas do país.

O movimento do conselho, criado há um ano pela presidente Dilma Rousseff para reunir quatro ministérios da área, corrobora o alerta do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, externado nesta semana aos senadores, sobre o impacto do choque de preços nos alimentos na inflação. Em plena safra dos grãos, esperava-se um recuo nos preços, inclusive das carnes, diretamente influenciadas pela oferta de milho e soja. Mas, ancoradas em quebras de safra por motivos climáticos e pela demanda em alta, as cotações seguem a trajetória ascendente pela terceira vez nos últimos anos.

No governo, avalia-se que a escalada dos principais itens de alimentação continuará nos próximos dois meses. “Temos essa preocupação, sim. Por isso, vamos tomar medidas”, disse o novo ministro da Agricultura, Neri Geller. “Mas a agricultura tem ajudado, e muito, a controlar a inflação.”

 Os elementos que sustentam a previsão reservada do governo vão desde a seca prolongada até as chuvas que afetaram hortigranjeiros, gerando a “inflação da salada”. Nesta conta, também está a demora na recomposição dos estoques globais, a redução da oferta mundial de produtos básicos, inclusive milho nos Estados Unidos e o trigo na Ucrânia. A origem da escalada, avalia-se, está na quebra histórica da safra americana de 2012 e na mudança estrutural do padrão de consumo na Ásia, especialmente na China. Antes, as quebras na Argentina e no Rio Grande do Sul também haviam alterado o panorama mundial.

Crédito 

O governo avalia lançar uma linha de financiamento para estufas que cobrem hortigranjeiros, o que ajudaria a reduzir estragos das chuvas, além de incentivar o setor de sementes. “A qualidade é baixa e os preços estão altos”, diz o vice-presidente de Agronegócios do Banco do Brasil, Osmar Dias. “Sem semente, não tem recuperação da safra.” Os preços internos mantêm-se elevados. A cotação da soja, avalia o governo, deveria estar 20% mais barata, o que ajudaria a conter preços das carnes, em franca disparada nos últimos dias – a arroba do boi passou de R$ 95 para R$ 120 e os preços do leite subiram 7,3% sobre janeiro de 2013. 


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