É o smartphone do momento, sonho de consumo tecnológico de muitos, mas não funciona. O iPhone usado que a estudante Camila (nome fictício) comprou nas mãos de um vendedor custou R$ 700 e, segundo ele, já “vinha desbloqueado”. Embutidos no preço do aparelho usado estavam os R$ 100 da “personalização” do conteúdo, um serviço irregular oferecido no mercado informal e até em estabelecimentos legalizados que derruba as barreiras das lojas virtuais de aplicativos e permite baixar tudo de graça. A esmola foi demais, o santo não desconfiou e quando Camila fez a atualização do sistema, procedimento periódico para quem tem aparelhos do tipo, o iPhone travou para sempre.

O serviço ilegal custa entre R$ 50 e R$ 100 e consiste em quebrar o código do sistema operacional dos aparelhos, para burlar a loja oficial de aplicativos da Apple e permitir a instalação de programas. A popularidade do serviço tem crescido a ponto de um comerciante de shopping popular do centro da cidade brincar: “Não esquenta não, ninguém fiscaliza. Desses aí eu faço 200 por dia”. Em seguida, ele volta atrás e diz que a média é de 12 clientes por dia interessados no procedimento. Em menos de 30 minutos, o aparelho está pronto para baixar, gratuitamente, os aplicativos que são vendidos na App Store, por preços entre US$ 0,99 e US$ 49,99 (cerca de R$ 1,58 e R$ 80, respectivamente). O técnico de uma loja, que concordou em falar ao Estado de Minas sob anonimato, detalha o processo. “Eu compro aplicativos e redistribuo. Compro um GPS de US$ 39, abro o aplicativo inteiro, tiro o arquivo de licença, fecho o programa de novo e ele não vai te pedir atualização com meu nome nem nada”, conta ele, que ainda oferece uma espécie de atualização periódica ao custo de R$ 50 – na verdade, trata-se de instalar os aplicativos pirateados outra vez.
Crescimento
A investida da pirataria sobre aplicativos de smartphones e tablets ocorre num momento de forte avanço das vendas no Brasil. Segundo a consultoria Gartner, 5 milhões de smartphones foram vendidos no país em 2010. Na comparação com 2009, o crescimento foi de 279%. No primeiro trimestre deste ano, 1,2 milhão de aparelhos do tipo foram comercializados no país, segundo a Gartner. No mercado de tablets, a consultoria IDC indicou que 100 mil pranchetas digitais foram compradas no Brasil em 2010.
Instituições que reúnem empresas de software ainda não sabem o que fazer com a pirataria de aplicativos. Procuradas pela reportagem, nem a Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes) nem a Business Software Aliance (BSA) comentaram o assunto. A BSA indica, em recente relatório, que “a forma mais comum de pirataria é comprar uma cópia de software e instalá-la em vários computadores”. O que os vendedores informais de aplicativos fazem é replicar esse tradicional modelo. O relatório da BSA aponta alta de 14% no prejuízo decorrente da pirataria. A Apple informou que porta-vozes da empresa não comentariam o assunto.
Como funciona o esquema
>> A receita da loja App Store, estimada em US$ 200 milhões mensais, vem da venda de aplicativos, que custam entre US$ 0,99 e US$ 49,99. A venda é virtual, com dados do cartão de crédito armazenados no sistema.
>> Os vendedores ilegais de apps baixam uma cópia, violam o código do arquivo e redistribuem pacotes, cobrando entre R$ 50 e R$ 100.
>> Entre esses apps, existem ferramentas que permitem ainda que a pessoa baixe novos aplicativos, em teoria pagos, de maneira gratuita.
>> Feito o desbloqueio (jailbreak), o dono do telefone não pode mais atualizar o sistema – deixando o aparelho lento e vulnerável a ataques . Se atualizar, o equipamento pode travar ou apresentar instabilidade.
Para entender os termos
>> O desbloqueio de aplicativos é diferente do de chip, que é legal e tem por objetivo permitir que o aparelho funcione com o número de qualquer operadora. No caso do chamado jailbreak, o procedimento é irregular e burla as lojas oficiais de apps.
Personalização de conteúdo
>> Geralmente diz respeito a pacotes de aplicativos instalados ilegalmente no telefone.
Conversa com vendedor
– Vocês fazem desbloqueio de iPhone aqui?
– Que iPhone?
– 3G. Original, comprado na loja.
– Faz. R$ 60.
– E como funciona?
– Seu telefone vai ficar pirata. E aí você vai poder baixar os aplicativos que quiser sem pagar. Só não pode depois é ligar no computador e atualizar o sistema, senão ele vai parar de funcionar.
