Cantor e percussionista Rafael Soares sorri para a câmera, vestindo camisa estampada de mangas compridas e segurando o boné azul-marinho

Cantor e percussionista Rafael Soares diz que "Afrobrasileiro" valoriza o povo negro: "A temática é falar da história do povo preto através de um viés que não seja a visão do colonizador"

Paulo Colen/Divulgação

Com faixas que valorizam e contam histórias do povo negro, o cantor, compositor e percussionista Rafael Soares lança nas plataformas digitais o álbum “Afrobrasileiro”.  As canções se relacionam com a trajetória do músico dentro de grupos de capoeira, rodas de samba e junto de rituais sagrados de matriz africana. 

Com oito canções, sendo uma autoral (“Força do tempo”)  feita em parceria com Márcio Nagô, o trabalho parte de referências do samba e da capoeira, transitando por tempos e musicalidades negras diversas, visitando passado, presente e futuro.

Rafael conta que o disco é a finalização de um trabalho de pesquisa que está fazendo desde o início de sua carreira solo, que começou em 2017.

“Venho da capoeira antes de me tornar músico e a ideia desse álbum é trazer para o 'Afrobrasileiro' os elementos constituintes da nossa cultura popular, entre eles o tambor. Os elementos da cultura afrodiaspórica estão muito presentes no meu universo, desde criança, por conta da capoeira. Também trago isso na minha forma de fazer e pensar o samba. Os arranjos são construídos com a percussão e algumas músicas são pensadas especialmente para o momento do tambor, junto com outros elementos”, afirma.

Potência negra

A escolha do repertório vem também valoriza essa identidade, explica Rafael. “A temática é  falar do povo preto, falar da história do povo preto, contar histórias através de um viés que não seja a visão do colonizado. Trazemos nas letras das músicas as nossas potências, a nossa forma de viver no dia a dia. Dentro desse trabalho, trago uma composição minha e de parceiros, com músicas inéditas, falando da nossa cultura afro-brasileira de alguma forma.”

 

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O disco foi gravado em BH, no estúdio Ultra, do músico e produtor Barral Lima. “Foi uma experiência interessante trabalhar com ele. Gravamos uma espécie de samba que o Barral denominou de afrossamba, porque há uma pegada mais afrodiaspórica. Penso que falar afrossamba soa até redundante, porque acaba se africanizando uma coisa que já é a África. Então, é importante trazermos essa afirmação, essa valorização da nossa identidade e da nossa cultura, essa cultura afrobrasileira que conta com todos esses elementos afrodiaspóricos.”

Segundo o artista, a música popular brasileira surgiu de ritmos praticados nos terreiros de candomblé.

 “O samba é como se fosse neto do semba. Ele vem da fusão de várias matrizes rítmicas até chegar nesse samba que a gente conhece hoje e que foi padronizado. De alguma forma, a gente entende que foi padronizado também, porque precisava de ser vendido, consumido. Afinal, a indústria está aí.”

Documentário

Rafael diz que o álbum “Afrobrasileiro” vem quebrando alguns paradigmas do samba tradicional. “A ideia é trazer esse inusitado, essa sonoridade que a pessoa fala que é samba, mas não é somente o samba que a gente conhece. Como Barral disse, é um afrossamba.”

O músico revela que cada música tem o seu videoclipe e todo o processo de gravação se transformará em minidocumentário, com alguns depoimentos, além de falar também sobre o processo de construção do álbum durante a pandemia. 

“Teve todo um processo introspectivo de quem participou e contribuiu lindamente para o resultado. Como não paro, já penso em fazer algo mais intimista. Penso em trazer esse universo meu da capoeira e dos tambores, mas para algo mais próximo de mim, mais intimista”, revela.

Rafael canta e toca berimbau em algumas faixas. Ele revela que gosta de compor ao violão, no cavaco, pandeiro ou no tambor. “É incrível como a melodia vem, a gente entra em uma frequência, uma espécie de mantra... Aí começam a chegar mensagens, umas melodias. Pode-se dizer que é como se fosse psicografado. Acho que é uma frequência na qual a gente se conecta a partir do momento que estamos ali entregues àquele ofício.”

Cultura popular

Rafael ressalta que gosta de sempre dar relevância para o tambor. “E também de sua importância na nossa música e na nossa cultura, assim como os costumes do povo que veio de África e ajudou a construir tudo isso aqui. Na verdade, a forma de pensar esse disco foi diferente. Dois dos três arranjadores das músicas são percussionistas, Bosco de Oliveira e Rafael Leite. E todos são pesquisadores da cultura popular, inclusive Gabriel Goulart. As pessoas que vão aos nossos shows sempre dizem que é incrível como a música pensada a partir da percussão toma um outro corpo, outro molde, é uma outra coisa.”

O músico conta que a capa do disco foi criada  pelo ilustrador Ricardo Cordeiro, que fez uma ilustração para cada faixa. “No final do álbum, ele transformou as ilustrações em uma espécie de mosaico que traz o meu rosto no centro, dentro de uma ideia da cultura banto. Todas as ilustrações são baseadas na cosmologia bakongo, tem todo um fundamento”. 

Ilustração mostra o cantor Rafael Soares na capa do disco Afrobrasileiro

Ilustração mostra o cantor Rafael Soares na capa do disco Afrobrasileiro

Ricardo Cordeiro/divulgação
“AFROBRASILEIRO”

• Álbum de Rafael Soares
• Disponível nas plataformas digitais