Pessoas passeiam à noite pela região da Savassi, em BH

O movimento noturno na região da Savassi inspira um dos 63 poemas que compõem o livro de estreia de Pedro Castilho

Túlio Santos/EM/D.A.Press

 

Trabalho de uma vida. É assim que o psicanalista e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Pedro Castilho se refere ao livro “Objetos à revelia”, editado pela Caravana Grupo Editorial. A coletânea de 63 poemas escritos desde a juventude do autor, hoje com 46 anos, marca sua primeira incursão na literatura. 

 

Seguindo a linha psicanalítica de Lacan, que defende a ideia de que o inconsciente é estruturado como linguagem, Castilho dá a seus textos a estética surrealista, ao tratar temas como amor, solidão, erotismo, relações familiares e mazelas sociais. 

 

O livro será lançado neste sábado (11/2), na cafeteria do MM Gerdau – Museu das Minas e do Metal. Na ocasião, o autor participará de bate-papo com os convidados, no qual pretende falar sobre o processo criativo de seus poemas.

 

Situações do cotidiano foram inspirações para cada texto. Em “poemar”, por exemplo, o autor lembra que “o gosto amargo/ da melancia/ traz memórias/ de tempos ruins/ que só o gosto/ doce do limão/ pode fazer esquecer”. 

 

Já em “savassi”, ao escrever “desço viçosa/ fumo um baseado/ vejo beijos gays/ lindas pernas/ botas e vestidos/ passeio, ando/ não sou daqui”, descreve a realidade de muitos frequentadores da tradicional região boêmia da capital mineira.

 

'A poesia é uma espécie de engano da comunicação, porque ela, com palavras que têm determinado significado, passa um recado dizendo algo totalmente diferente. Ela usa o significante para te enganar'

Pedro Castilho, psicanalista e poeta

 

Baudelaire e solidão

A solidão também é recorrente na poesia de Castilho. Em “quadrilha moebiana”, ele entende que “nas danças das cadeiras/ tem sempre uma que falta”, e em “eu a vi”, perde-se no olhar de uma mulher que cruza seu caminho tal qual Charles Baudelaire no poema “A uma passante”.

 

Pedro também se inspirou no pai do simbolismo ao escrever “Intoxico-me”. Para quem é mais familiarizado com a poesia de Baudelaire, é impossível não se lembrar de “Embriaga-te”. Os versos “Intoxico-me de pensamentos/ Intoxico-me de álcool/ Intoxico-me de jogos/ Intoxico-me de internet/ Intoxico-me de remédios…/ Intoxico-me de amor” dialogam com “Embriaga-te sem cessar/ De vinho, de poesia ou de virtude, a teu gosto”, de Baudelaire.

 

“Tentei trazer a sonoridade das palavras em cada poema. E também fiz um esforço para fazer com que cada palavra produzisse no leitor sensações de cheiro, aroma e sabor”, conta Castilho.

 

Para fazer isso, inspirou-se em cânones da poesia. Além de Baudelaire (1821-1867), estão entre as influências de Castilho poetas como Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), Paulo Leminski (1944-1989), Fernando Pessoa (1888-1935) e os concretistas Haroldo de Campos (1929-2003) e Augusto de Campos. 

 

Castilho, inclusive, homenageou Drummond com o poema “eu pedro”, ao trocar os versos “Tinha uma pedra no meio do caminho”, do itabirano, por “tem um pedro no meio do caminho”. 

 

Fernando Pessoa, por sua vez, é lembrado quando no início do poema “tenho em mim” pelos versos “tenho em mim/ todas as vontades do mundo” (em “A tabacaria”, Pessoa escreveu: “Tenho em mim todos os sonhos do mundo”).

 

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Diálogos com Leminski

“vivo fora de mim” (assim mesmo, grafado com letras minúsculas) conversa com “Contranarciso”, de Leminski. Os versos “viro fora de mim/ o que há em mim é você”, de Castilho remetem a “o outro que há em mim é você/ assim como/ eu estou em você”, do paranaense. 

 

Os textos de Castilho escritos em forma de haikai, presentes em “estive lá”, “é ela” e “as idades” são mais uma referência a Leminski.

 

“A poesia é uma espécie de engano da comunicação, porque ela, com palavras que têm determinado significado, passa um recado dizendo algo totalmente diferente. Ela usa o significante para te enganar”, observa Castilho.

 

Isso pode ser percebido no poema “encaixes”, no qual a disposição das palavras (escritas como se estivessem num movimento de queda) lembra muito a estética dos concretistas Haroldo e Augusto de Campos.

 

Além da preocupação com essa estética, Castilho faz uma brincadeira com o sentido das palavras e a mensagem que o poema quer passar (em horizontal, ocupando uma página inteira do livro, escreveu: “um poema que caiba inteiro em uma página”).

Capa do livro Objetos à revelia traz a ilustração de homem jovem sentado à mesa olhando para criatura imaginária

Capa do livro Objetos à revelia traz a ilustração de homem jovem sentado à mesa olhando para criatura imaginária

Reprodução
"OBJETOS À REVELIA"

• De Pedro Castilho

• Caravana Grupo Editorial

• 75 págs.

• R$ 60

• Lançamento neste sábado (11/3), das 10h às 13h, na cafeteria do MM Gerdau - Museu das Minas e do Metal (Praça da Liberdade, 680, Funcionários). Entrada franca. Informações: (31) 3516-7200. Exemplares à venda no lançamento e no site caravanagrupoeditorial.com.br