Dois atores de Auto da Compadecida, montagem da Maria Cutia, olham para a câmera

"Auto da Compadecida" terá sessões nesta quarta e quinta-feira (1 e 2/2), no Grande Teatro do Sesc Palladium

Tati Motta/divulgação

Desde que criaram a Cia. Maria Cutia, em 2006, os atores Mariana Arruda, Leonardo Rocha e Hugo da Silva tinham o desejo de trabalhar com o diretor mineiro Gabriel Villela. Foi a peça “Romeu e Julieta”, montagem do Galpão dirigida por Villela, que despertou essa vontade na trupe da recém-inaugurada companhia mineira.

“A gente cultivava o namoro com o Gabriel há muitos anos, mas nunca dava certo”, relembra Mariana Arruda. Em 2018, ela recebeu um telefonema inesperado de Villela. “Olha, estou prestes a fazer 60 anos. Quero fazer uma obra de arte. Mas quero que ela seja feita com vocês. Você topa?”, afirmou ele.

Mariana aceitou de pronto, sem nem sequer consultar os colegas ou perguntar qual seria a montagem. Era um clássico: “Auto da Compadecida”, de Ariano Suassuna, musical que será reapresentado nesta quarta e quinta-feira (1º e 2/2), no Sesc Palladium, na programação da 48ª Campanha de Popularização do Teatro e da Dança.

“‘Auto da Compadecida’ é um texto maravilhoso do Suassuna. Talvez o mais famoso do teatro brasileiro”, destaca Mariana Arruda. “Embora as pessoas conheçam mais a adaptação cinematográfica (de Guel Arraes), todos sabem quem são Chicó e João Grilo, e conhecem suas histórias.”
 
 

Versão mineira em clima tropicalista

A montagem da Maria Cutia, que estreou em 2019, é bem diferente do filme de Arraes. A começar pelo figurino e pelos objetos cênicos, que trazem referências como o Movimento Tropicalista.

A própria Compadecida, interpretada por Mariana, é cria da Tropicália. “Eu me inspirei muito em Gal Costa”, revela a atriz. “É uma Compadecida tropicalista, que tem flores na cabeça e usa manto azul da cor das águas do Rio São Francisco, trazendo a ideia de uma grande mistura”, diz, lembrando que essa também é a característica do movimento sessentista que projetou Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil e Tom Zé.

Mariana também dá vida à mulher do padeiro. Essa personagem, inspirada em Maria Bonita, traz elementos do cangaço. “Ela demonstra a força da mulher, que deixa o marido na condição de submissão”, afirma.

Além de Mariana, integram o elenco Leonardo Rocha (João Grilo), Hugo da Silva (Chicó e Severino de Aracaju), Dê Jota (Jesus, padeiro e palhaço), Thiago Queiroz (sacristão), Polyana Horta (bispo e Major Antônio Moraes) e Marcelo Veronez (padre e diabo). Além de atuar, todos cantam e tocam instrumentos ao vivo.

Na trilha sonora assinada por Babaya, Fernando Muzzi e Hugo da Silva não poderiam faltar, claro, canções da Tropicália.

“Numa cena, a Compadecida entra cantando ‘Com minha mãe estarei’, música de igreja, e fala: ‘Ah, que música chata!’. E volta para cantar ‘Tropicália’”, diverte-se Mariana.

Outra referência é o carnaval. Logo no início, foliões entram em cena ao som de “Eu quero é botar meu bloco na rua”, de Sérgio Sampaio, carregando o estandarte onde se lê Bloco da Cutia.

“É a trupe de atores carnavalescos bem brasileiros que chega no teatro para contar aquela história”, explica Mariana, destacando que o carnaval é outra característica da essência brasileira.

Elogiado pela autenticidade e singularidade de suas montagens, Gabriel Villela desenvolveu estética a própria, na qual os personagens são como seres encantados. “Você olha e não sabe muito bem de onde eles são”, observa Mariana.

Essa característica está bem presente no “Auto da Compadecida”. João Grilo, Chicó, padre, bispo, padeiro e até mesmo Jesus são personagens de uma trama marcada pelo realismo fantástico.

A trama continua centrada no julgamento divino dos personagens, sobretudo de João Grilo, malandro pobre do sertão nordestino executado pelo cangaceiro Severino de Aracaju.

Anti-herói é a cara do Brasil

Caricatura do brasileiro com seu famoso jeitinho, João Grilo é um trapaceiro carismático. Uma espécie de anti-herói, que engana os patrões exploradores, o padre, o bispo, o coronel, o temido cangaceiro e até o diabo, invocando a Compadecida para livrá-lo do inferno.

“Independentemente de como a pessoa conheceu o ‘Auto da Compadecida’, ela vai ver algo totalmente diferente. Nossa montagem tem outras referências, outra poética e outro tom justamente para permitir que o espectador faça uma viagem visual e sonora”, conclui a atriz.

“AUTO DA COMPADECIDA”

De Ariano Suassuna. Direção: Gabriel Villela. Com Cia. Maria Cutia. Quarta e quinta-feira (1º e 2/2), às 20h, no Sesc Palladium. Rua Rio de Janeiro, 1.046, Centro, (31) 3270-8100. Ingressos a R$ 20, à venda nos postos da Campanha de Popularização no Shopping Cidade e Pátio Savassi ou pelo site www.vaaoteatromg.com.br