Close no rosto da atriz Naomi Ackie, que interpreta Whitney Houston

O domínio do pai e da indústria sobre as ambições artísticas de Whitney Houston e seu romance em segredo com Robyn Crawford são parte do roteiro do longa, em cartaz nos cinemas

Sony Pictures/Divulgação

Em determinado ponto de "I wanna dance with somebody – A história de Whitney Houston", a protagonista está cercada de uma multidão de gente que mal vemos, cantando a plenos pulmões um de seus hinos e, por maior que seja o estádio onde se apresenta, ela parece uma gigante.

A cena remete ao concerto “Live aid”, de 1985, que foi recriado na biografia de Freddie Mercury, "Bohemian rhapsody", e ao show de Elton John no estádio dos Dodgers, em 1975, ponto alto em "Rocketman". Na cartilha recente das cinebiografias musicais, quanto maior, melhor.

Já começa pelo título verborrágico do filme, que está em cartaz nos cinemas desde a última quinta-feira (12/1), mas não para por aí. "I wanna dance with somebody" conta a história da diva da música americana com muito glamour, brilho, figurinos, mansões e performances memoráveis, recriadas para transformar o longa num grande espetáculo.

Mas não só. Também são levados à voltagem máxima os dramas pessoais de Whitney Houston, como a relação conturbada com o pai e o ex-marido, os problemas com as drogas e o controle sufocante que a indústria tentava exercer sobre ela, podando suas vontades artísticas.

"Acompanhei sua ascensão de um ponto de vista interessante, porque eu estava fazendo carreira no cinema e tinha um roteiro que eu queria que ela lesse. Num encontro com ela e o pai, ele me pediu para escrever uma história exclusivamente para ela e, apesar de o filme nunca ter acontecido, eu pude vê-la de muito perto", diz a diretora Kasi Lemmons, que também comandou "Harriet", sobre a ativista abolicionista americana Harriet Tubman.
 
 

Marca da Barbie

Lemmons conta que ficou surpresa naqueles encontros em 1994, quando percebeu que o pai se referia a Whitney como uma marca e que ela, em meio a toda a fama, estava visivelmente exausta. "Ele dizia que queria que ela fosse como a Barbie", afirma.

Essa imagem de bonequinha da América atraiu polêmicas e crises pessoais para a voz de "I will always love you" e "How will I know". O filme retrata, por exemplo, como o movimento negro a repreendia por cantar um tipo de pop superficial, despolitizado. E não foge do fato que talvez tenha sido o mais bem escondido de sua trajetória – o relacionamento com sua diretora criativa Robyn Crawford.

Whitney foi proibida de viver publicamente o romance, numa época em que a homossexualidade estava ainda mais longe de ser amplamente aceita, e mesmo depois de sua morte, várias figuras ligadas a ela tentaram encobrir o caso. Documentários recentes que tiveram o envolvimento de sua família pouco se importaram com a sexualidade da diva, fato que domina boas horas de "I wanna dance with somebody".

Repressão e sofrimento

Lemmons diz que não teria dirigido o filme se esse aspecto da vida de Whitney não fosse incluído. "Eu era atriz em Nova York na época em que ela chegou à fama e todo mundo sabia desse relacionamento. Quando eu a conheci, a Robyn estava junto. Então era importante contar essa história, porque ela sofreu muito por causa disso."

Logo nos primeiros minutos de "I wanna dance with somebody", muito antes da fama avassaladora, a protagonista dá um belo beijo na boca de Robyn, numa cena que deve surpreender fãs desavisados.

A partir do período anterior à entrada na indústria fonográfica, quando ela ainda subia ao palco à sombra da mãe, a também cantora Cissy Houston, a trama percorre toda a vida da biografada, até a morte prematura, em 2012, quando foi encontrada na banheira de um hotel de Beverly Hills, aos 48 anos.

Turbilhão

Quem personifica esse turbilhão de emoções em cena é a britânica Naomi Ackie, vencedora do Bafta pela série "The end of the f***ing world". Como conseguiu o papel pouco antes da pandemia, ela passou o período da crise sanitária mergulhada em todo tipo de livro, documentário e vídeo sobre Whitney, num processo intenso de preparação que durou oito meses.

Imitar uma voz tão icônica e potente quanto a dela, no entanto, seria impossível, ela reconhece. Por isso, assim como em "Bohemian rhapsody", a protagonista só mexe a boca, enquanto os vocais de Whitney crescem no ouvido do espectador.

"Nosso plano era que eu cantaria todas as músicas nas gravações, para acertar a respiração e os movimentos que ela fazia, mas, no fim, a gente punha as canções originais para tocar bem alto e ninguém me ouvia. Era só Whitney." 

“I WANNA DANCE WITH SOMEBODY – A HISTÓRIA DE WHITNEY HOUSTON”

(EUA, 2022, 157min) Direção: Kasi Lemmons. Com Naomi Ackie, Stanley Tucci e Nafessa Williams. Classificação: 16 anos. Em cartaz em salas dos complexos Cineart, Cinemark, Cinépolis e Cinsercla